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Estado de Minas Turbulência política

Indicação de Bolsonaro ao STF abre crise com apoiadores evangélicos

Perfil do desembargador Kassio Nunes Marques é contrário ao modelo 'terrivelmente evangélico' que o presidente da República prometeu encaminhar ao STF, no entendimento de apoiadores fieis desde as eleições de 2018


12/10/2020 04:00 - atualizado 12/10/2020 07:14

Desembargador Kassio Nunes já defendeu pautas estranhas aos interesses do evangélicos como o salário-maternidade para as índias Maxakali de Minas Gerais (foto: Samuel Figueira /TRF1)
Desembargador Kassio Nunes já defendeu pautas estranhas aos interesses do evangélicos como o salário-maternidade para as índias Maxakali de Minas Gerais (foto: Samuel Figueira /TRF1)
De um dia para o outro, o presidente Jair Bolsonaro viu mudar o seu prestígio junto aos evangélicos. Tão ben-quisto por esse grupo religioso, que o apoia desde as eleições de 2018, o presidente se tornou alvo de críticas e passou a ser chamado de “traidor” depois de ter indicado para o Supremo Tribunal Federal (STF) o desembargador Kassio Nunes Marques, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1).

O ataque foi uma reação ao fato de Bolsonaro não ter cumprido com a promessa de escolher um nome “terrivelmente evangélico” para ocupar uma cadeira na Suprema Corte, mas também expõe o receio do segmento de que o presidente esteja deixando de lado temas fundamentais para os cristãos, entre eles a defesa do conservadorismo e a criminalização do aborto.

Na visão de algumas lideranças evangélicas, a nomeação de Kassio Nunes significa retrocesso em relação às questões que envolvem os interesses desse importante grupo de apoiadores do presidente da República.

Desde que Bolsonaro anunciou a opção pelo desembargador, o passado do eleito foi minimamente analisado e, entre as descobertas, foi revelado que em sua tese de mestrado, cujo tema foi “Concretização judicial do direito à saúde”, Kassio citou a legalização do aborto nos Estados Unidos e não fez ressalvas à prática.

No mesmo documento acadêmico, o candidato ao STF defendeu que o Judiciário pode ser acionado para fazer frente à maioria conservadora.

Em outra publicação, desta vez em uma edição de 2014 da revista do TRF-1, o desembargador trata sobre o salário-maternidade às índias maxakalis de Minas Gerais. Além de ser a favor de que elas tenham direito ao benefício previdenciário antes dos 16 anos, Kassio Nunes não mostra objeções quanto à cultura do grupo indígena, que defende uma precoce iniciação sexual das adolescentes maxakalis a partir dos 13 anos, e que elas tenham relações com vários índios para facilitar a gestação.

Por mais que Bolsonaro tenha dito em alguns eventos públicos e em transmissões nas suas redes sociais que o escolhido para a Suprema Corte discorda do aborto e que ele defende a família, o posicionamento do presidente não tem sido o suficiente para acalmar a classe evangélica, que espera explicações e a defesa do próprio desembargador sobre esses assuntos. Kassio Nunes terá a oportunidade de se posicionar no próximo dia 21, quando será sabatinado pelo Senado.

Um dos principais líderes evangélicos do país, o pastor Silas Malafaia, presidente da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, tem sido o maior crítico da indicação do magistrado ao STF. Nas últimas semanas, o pastor usou as suas páginas na internet quase que diariamente para reclamar de Bolsonaro e de Kassio Nunes.

Amigo do presidente, o religioso disse ser “aliado, mas não alienado do presidente”. Ele tem pedido que Bolsonaro reconsidere a indicação. O fato de Kassio Nunes ter sido indicado ao TRF-1 pela ex-presidente Dilma Rousseff e o “aval” de rivais de Bolsonaro à nomeação dele para o Supremo, como o presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Felipe Santa Cruz, alimentaram ainda mais a insatisfação de Malafaia e de outros evangélicos, que tacharam o presidente da República de “petista”.

Além disso, as incongruências no currículo do desembargador, como a de que ele teria cometido plágio em sua tese de mestrado e que não teria concluído pós-graduação na Espanha — o que fez Kassio Nunes corrigir o título no currículo de “postgrado” para “curso” —, também revoltaram os apoiadores de Bolsonaro.

Insatisfação antiga Os aliados do presidente já vinham inconformados com Bolsonaro desde que ele passou a se aproximar dos partidos do Centrão no Congresso em busca de uma maior sobrevivência política. Junto a isso, a indicação de Kassio Nunes ao STF reforçou a avaliação de que o presidente quer livrar a própria pele e a da sua família, visto que ele é investigado por suposta interferência política na Polícia Federal e vê o nome do filho e senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) atrelado a um suposto esquema de corrupção quando era deputado estadual no Rio de Janeiro.

“É indefensável essa indicação, que tem as digitais, sim, do Centrão, que representa realmente essa política da troca de favores, de barganha, que está sempre ao lado do poder. Então, parece que outros interesses estão motivando isso tudo, não sei se para proteger familiares. Há alguma coisa nesse sentido. A esperança de todo um povo está sendo colocada de lado”, reclamou o senador Eduardo Girão (Podemos-CE).

Para o parlamentar, a escolha de Bolsonaro é uma afronta ao combate à corrupção e à prisão após condenação em segunda instância, visto que Kassio é tido como um magistrado “garantista”, que prioriza as garantias dos réus. “É uma frustração para os conservadores do Brasil e das pessoas que querem uma política com mais ética”, acrescenta Girão.

As suas decisões (do Kassio), a sua vida não nos apontam com esperança de que vamos ter o início de um novo momento no STF. É um grande equívoco do presidente e vamos ter que passar 27 anos com essa decisão, que não poderia ser, jamais, negociada. Princípios e valores não se negociam”, acrescentou Girão.

Soltura de traficante abre conflito no STF


O habeas corpus concedido ao traficante André de Oliveira Macedo, o André do Rap, pelo ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), na última sexta-feira, abriu conflitos. Desta vez, foi o próprio Mello quem veio a público protestar contra ação do presidente do Supremo, Luiz Fux, que revogou a decisão horas depois de ter sido publicada. Em declaração dada ao jornal Folha de S.Paulo, Mello classificou a situação como “um horror”.

“Sob minha ótica, ele adentrou o campo da hipocrisia, jogando para turma, dando circo ao público, que quer vísceras. Pelo público, nós nem julgaríamos. Condenaríamos e estabeleceríamos pena de morte”, disse ao jornal. Para Mello, a disputa interna no Supremo prejudica tanto a corte quanto o próprio sistema de Justiça brasileiro. “Essa autofagia já ocorreu no passado, e é péssima, péssima, péssima, não é ruim, é péssima”, desabafou.

Agora, Marco Aurélio Mello, que é relator do caso, pretende levar o processo para análise em plenário. “Penso em levantar questão de ordem para saber se o presidente do tribunal é censor de seus pares. Isso tem de ser elucidado”, destacou em entrevista concedida no sábado à revista Veja.

Críticas à lei O desentendimento gira em torno de uma interpretação da Lei 13.964, conhecida como Pacote Anticrime, que incluiu mudanças no artigo 316 do Código de Processo Penal (CPP). Autor do projeto inicial da lei, o ex-ministro da Justiça Sérgio Moro comentou a crise. Moro alegou que esse parágrafo não estava na proposta original. Pelo texto, o instituto da prisão dura 90 dias, podendo ser renovada, sob pena de se tornar ilegal, o que teria ocorrido no caso do traficante, segundo Mello. Ele estava preso e a detenção não foi renovada.

A deputada estadual Janaina Paschoal (PSL-SP) também criticou o trecho da lei. Ex-aliada do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), Paschoal afirmou que o mandatário poderia ter vetado esse trecho da lei, o que evitaria casos como o do traficante André do Rap.




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