Com um clima de racha entre os ministros, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) analisa, hoje, a liminar deferida pelo ministro Marco Aurélio Mello que resultou na soltura do traficante André Oliveira Macedo, o André do Rap, um dos líderes da organização criminosa Primeiro Comando Capital (PCC). O caso foi levado à avaliação do colegiado pelo presidente da Corte, Luiz Fux. No sábado, horas após a decisão do colega, ele reverteu a determinação que tirou o criminoso de trás das grades. No entanto, ele não foi mais encontrado. A suspeita é de que tenha fugido para o Paraguai.
A decisão de Marco Aurélio gerou desconforto entre os magistrados, e a tendência é de que seja revista pela maioria dos ministros. André do Rap estava preso desde novembro de 2019 e já tinha duas condenações que somam mais de 25 anos de prisão. No entanto, ele recorre em liberdade de ambas e estava em prisão preventiva. Ao soltar o criminoso, o ministro usou trecho do pacote anticrime aprovado pelo Congresso e sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro que alterou o artigo 316 do Código Penal. De acordo com o texto da lei, as prisões preventivas devem ser renovadas a cada 90 dias. O magistrado entendeu, então, que estava configurado “constrangimento ilegal” e suspendeu a prisão. Horas depois, Fux revogou a liminar concedida pelo colega e determinou que André do Rap voltasse para a cadeia.
Marco Aurélio irritou-se e fez críticas públicas ao presidente do Supremo. Em entrevista ao Correio, no sábado, chamou de “circo” a decisão do colega. “Ele (Fux) adentrou o campo da hipocrisia, jogando para a turba e dando circo a quem quer circo. A decisão é péssima e um horror. É lamentável e gera uma insegurança enorme, além de acabar por confirmar a máxima ‘cada cabeça, uma sentença’. Ele não é superior a quem quer que seja. Superior é o colegiado. Essa autofagia leva ao descrédito”, disse.
Pelas redes sociais, o ministro Alexandre de Moraes, sem citar nomes, afirmou que o tráfico de drogas deve ser combatido pelo Poder Judiciário. “A criminalidade organizada que comanda o tráfico de drogas é um câncer que precisa ser extirpado. É responsável pela maioria dos homicídios no país. Jamais permitiremos que continuem a escravizar as comunidades e os brasileiros de bem. A Justiça tem o dever de combater esse mal”, escreveu.
Fux tende a ser mais rigoroso na aplicação de lei do que a chamada ala garantista do STF. Até agora, dois ministros — Edson Fachin e Gilmar Mendes — divergiram em decisões de Marco Aurélio, o relator da Operação Lava-Jato, defendida por Fux. Com a aposentadoria do ministro Celso de Mello, ontem, Marco Aurélio passou a ser o decano da Corte, ou seja, o ministro mais antigo no plenário, que passa a ser integrado por 10 magistrados até que um indicado pelo presidente Jair Bolsonaro seja aprovado pelo Senado. Atualmente, o desembargador Kassio Marques aguarda manifestação do parlamento.
Reações
Além da divisão no plenário do Supremo, o caso gerou reações no Ministério Público, pois se ventilou a ideia de que o órgão é que deve pedir a continuidade da prisão preventiva após seis meses da entrada do interno no local de detenção. Em nota conjunta, divulgada na segunda-feira, a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e a Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) negaram eventual omissão do MP e reforçaram que a obrigação de revisar a manutenção da prisão, a cada 90 dias, é imposta apenas ao juízo de primeiro grau ou ao tribunal que impôs a medida cautelar.
No posicionamento, as entidades também lançaram críticas a Marco Aurélio. “Em posição até agora isolada, o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, vem compreendendo que, configurado o excesso de prazo da prisão, deve ser determinada a soltura do preso. Quando do julgamento do mérito desses casos, a 1ª Turma do STF tem refutado o argumento e vem cassando as liminares deferidas. No caso do réu André do Rap, a soltura foi determinada, inclusive, antes de qualquer ouvida do MP”, diz um trecho da nota.
Foragido
A Polícia Federal solicitou que o nome do traficante e a foto dele fossem listados pela Interpol, polícia Internacional que atua em escala global. Integrantes da Polícia Civil de São Paulo avaliam ser muito difícil recapturar o criminoso. Eles acreditam que o plano de fuga estava sendo arquitetado havia vários dias.