Jornal Estado de Minas

Entrevista/TIAGO MITRAUD

''Temos que congelar salários", diz deputado federal de Minas

 
 
Brasília – A Frente Parlamentar Mista da Reforma Administrativa, no Congresso, foi lançada em 8 de setembro, com apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do ministro da Economia, Paulo Guedes.



Apesar disso, o presidente do colegiado, deputado Tiago Mitraud (Novo-MG), não poupa críticas ao Executivo. Para ele, o governo cometeu um grande erro estratégico ao não incluir no texto da reforma (PEC 32/2020) outros membros de poderes, como magistrados, procuradores, defensores, parlamentares e até os militares.

Mitraud diz que “não está contra os servidores”, mas, afirma que o funcionalismo federal, com salários muito superiores aos da iniciativa privada, não deve receber reajuste anual até que seus ganhos mensais “se aproximem da realidade brasileira”.

E, para evitar que o governo tenha dificuldade de atrair ao mercado dirigentes de estatais, o parlamentar mineiro sugere que essas empresas sejam privatizadas, incluindo Caixa, Banco do Brasil e Petrobras.

O Executivo, ao enviar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Reforma Administrativa, não incluiu várias carreiras, justamente as que têm os maiores salários. Transferiu a responsabilidade para o Legislativo?
Acho que o governo errou, sim. Tinha condições de incluir essas classes. É isso que a população quer. Creio que o Ministério da Economia gostaria que todos os servidores participassem das mudanças. Mas o presidente Jair Bolsonaro acabou não concordando. Lamento que o presidente tenha defendido privilégios. Isso, no entanto, poderá ser corrigido. Já existem vários projetos tramitando com esse objetivo, além da disposição de alguns parlamentares de não deixar ninguém de fora.





O senhor é defensor de um enxugamento radical dos gastos do Estado, mas acredita ser possível contrariar o governo e os interesses corporativos, a exemplo de pautas históricas que defendem reajuste anual de salários?
As alterações propostas na administração não são para agradar nem ao governo nem aos servidores. O foco são os cidadãos. Na verdade, a PEC 32/2020 não tem como objetivo principal os salários, por enquanto. O assunto, porém, não está descartado. O funcionalismo federal tem remunerações muito superiores às da iniciativa privada, conforme várias pesquisas de instituições nacionais e internacionais. E não deve receber reajuste anual, pelo menos até que seus ganhos mensais se aproximem da realidade brasileira.

Há muita reclamação, justamente, porque as correções não são automáticas.
A gente valoriza e reconhece os bons servidores, mas temos que nos adequar. Ninguém fala, por exemplo, de aumento anual para parlamentar. Por quê? Porque o salário é acima da média. O mesmo acontece com várias carreiras. Não é possível que um juiz ganhe R$ 300 mil por mês, mesmo que retroativo e eventual. Isso acontece, normalmente, porque ele vende parte das férias de 60 dias, acumula folgas e ainda tem o recesso. Também não achou justificativa para férias de 45 dias dos professores.

Apesar da pandemia, algumas categorias receberam aumento, e os parlamentares aprovaram alegando que já estava no orçamento.
Todos têm de estar alinhados. Não pode haver exceções, como no caso dos policiais civis e militares e bombeiros do Distrito Federal, que, recentemente, tiveram correção nos subsídios. Precisamos congelar salários, sem exceção. Se, no passado, foi dado um aumento maior, seja qual foi o motivo, não justifica, agora, corrigir. Não podemos admitir distorções. Tudo que é feito agora tem repercussões no futuro. A sociedade não quer mais aumento de despesas com pessoal e custeio. Quer mais investimentos.





O projeto de reforma administrativa tem várias restrições para os atuais e futuros servidores, mas o próprio ministro Paulo Guedes, que defende o ajuste fiscal, afirmou que os presidentes de estatais devem ganhar bem. Como se explica cortar de um lado e gastar do outro?
Para evitar essas distorções e possíveis dificuldades do governo em atrair no mercado dirigentes de estatais (como na substituição do presidente do Banco do Brasil), essas empresas devem ser privatizadas. Todas: Caixa, Banco do Brasil e Petrobras. O governo não tem de ser dono de empresa. Essas organizações operam na lógica do mercado. Mas temos que levar em consideração que uma coisa é um salário específico de executivos altamente qualificados, outra, o aumento em massa. O ministro da Economia, como outros executivos de fora do serviço público, sequer precisa do salário. Setor público não é para ficar rico, é para cumprir uma missão.

E quanto à estabilidade dos servidores, considerada inegociável pela maioria das carreiras? O senhor já disse que não é uma bala de prata, nem uma máxima que não deva ser discutida.
E não é. A administração pública está engessada. Vai ser difícil sair dessa situação de engessamento sem reestruturar. Temos de sair desse contexto. Discutir em que medida e para quem a estabilidade é importante. No caso da estabilidade, assim como nos reajustes salariais e privilégios, não há regra. Ganha mais quem grita mais. E isso não é possível. É preciso um estudo detalhado para avaliar cada detalhe.





Outro ponto defendido pelo funcionalismo é de que é “injusto e imoral” ter servidores públicos de primeira e de segunda categorias, ou seja, com salários diferentes na mesma atribuição?
Na verdade, isso não é um problema. Pelo contrário, vai incentivar o servidor a se esforçar mais para elevar o seu salário. Nada deve ser automático. Também dizem que uma futura lei que reduza as remunerações de entrada tornará o serviço público menos atrativo para os novos trabalhadores. Não acredito nisso. O Brasil tem de enriquecer, e o que impede esse avanço é a morosidade da máquina pública. Repito: não estou contra os servidores, eles é que precisam estar do nosso lado. São eles que, muitas vezes, ficam com a reputação arranhada pelas distorções. Espero que a sociedade pressione o Congresso para que a reforma administrativa avance.