A influência exercida pelo "guru" do bolsonarismo, Olavo de Carvalho, não é mais a mesma. O astrólogo da Virginia (EUA) comprou briga com governistas, perdeu espaço no Ministério da Educação, fez críticas ao presidente e, nos últimos meses, também passou a viver um ocaso financeiro. Ele é o principal alvo da nova etapa de campanha do Sleeping Giants, movimento que pressiona empresas a retirarem patrocínios de páginas com conteúdos que classifica como de ódio e desinformação. O grupo já conseguiu levar mais de 250 companhias a desassociarem suas marcas de conteúdos produzidos por Olavo.
O escritor, referência da extrema-direita brasileira, chegou a perder cerca de 30% dos alunos que pagavam para receber aulas de seu "seminário de filosofia" via PayPal, uma das companhias que o baniu. Agora, o Sleeping Giants direciona seus esforços para secar uma das principais fontes remanescentes de receita do escritor.
O movimento orienta seus quase 400 mil seguidores os caminhos para que bombardeiem com reclamações as caixas de mensagem de executivos da CPP Investments. A firma canadense é acionista da PagSeguro, empresa brasileira que não cedeu à pressão e mantém a conta pela qual Olavo arrecada com a venda de cursos. Até o início da semana passada, 10 mil pessoas haviam enviado mensagens, de acordo com o movimento.
A versão brasileira do Sleeping Giants se apresenta como um coletivo e não revela a identidade das pessoas que o conduzem. Ao Estadão, o grupo ressaltou que Olavo de Carvalho é, para eles, a figura que mais contribui para a radicalização da sociedade por conta do "conteúdo odioso" que propaga.
Olavo de Carvalho já usou seus canais e cursos para negar a existência do novo coronavírus, recomendar que as pessoas não vacinem seus filhos porque elas "matam ou endoidam", atacar religiões, minimizar caso de estupro, defender prisão "sem direito de falar" para ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e até recomendar que jornalistas sejam tratados "a ponta pé, como um cachorro".
Diante da ofensiva do Sleeping Giants, o escritor sentiu a pressão e pediu ajuda aos súditos. No fim de outubro, fez uma série de publicações com queixas contra as ações do site. Pediu para que seus alunos, leitores e amigos escrevam ao PayPal em protesto contra o bloqueio que lhe foi imposto e ao PagSeguro, com pedido para que a empresa não tome a mesma decisão.
Sobrou até para o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência. "General Heleno, a sua querida Abin (Agência Brasileira de Inteligência) vai investigar as operações de boicote financeiro e intimidação realizadas por organizações comunoglobalistas contra aliados do governo? Vai nada".
Processo
A intensificação da campanha contra as receitas de Olavo coincide com a cobrança de uma dívida robusta. O "guru" foi processado pelo cantor Caetano Veloso, em 2017, por publicações que acusavam o artista de pedofilia. No mesmo ano, a Justiça do Rio determinou a remoção dos posts, sob pena de multa diária de R$ 10 mil. Olavo descumpriu a determinação e o valor alcançou, neste mês, R$ 2,9 milhões.
A decisão que o intimou a pagar a dívida é de 10 de outubro. O prazo vence nos próximos dias. Enquanto isso, ele aguarda o julgamento de recurso ao Tribunal de Justiça do Rio para rediscutir o valor. Caso perca a apelação e não faça o pagamento, poderá ter bens penhorados.
Paralelamente, empresários liderados por Luciano Hang, aliado do bolsonarismo, preparam uma "vaquinha" para socorrer o escritor. A oferta de amparo surgiu no contexto de um vídeo, de junho, no qual Olavo esbravejou contra o suposto desinteresse do presidente Jair Bolsonaro em defendê-lo. "Bolsonaro, o que ele fez para me defender? Bosta nenhuma! Chega lá, me dá uma condecoraçãozinha… enfia essa condecoração no seu c...", disse. "Essas multas que esses caras estão cobrando de mim vão me arruinar totalmente."
Desde a gestão de Ricardo Vélez na Educação, Olavo exercia forte influência na pasta. Após Milton Ribeiro assumir a função no lugar do também olavista Abraham Weintraub, duas pessoas que gozavam da plena simpatia do escritor foram demitidas: a secretária da educação básica, Ilona Becskeházy, e o assessor especial Sérgio Sant'Ana. A última demonstração de insatisfação de Olavo com o presidente foi no fim de setembro, quando ele usou as redes sociais para referir-se a Bolsonaro como "ingrato". O distanciamento entre ambos coincide com a consolidação da aliança do presidente com o bloco dos partidos do Centrão e setores que antes criticava.
A reportagem procurou Olavo de Carvalho mas não teve resposta. A canadense CPP Investments também não se manifestou, assim como a PagSeguro. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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