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Estado de Minas ENTREVISTA/WANDERSON ROCHA

''É hora de trabalhadores administrarem BH'', diz candidato do PSTU

Wanderson Rocha diz que, se eleito, vai criar conselhos populares para gerir recursos públicos


11/11/2020 04:00 - atualizado 11/11/2020 07:29

"Vendo as propagandas eleitorais, parece que vivemos em outra cidade. É uma cidade dos ricos" (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)


Um debate de temas e a conscientização da classe trabalhadora. É o que pretende o pedagogo e mestre em sociologia Wanderson Rocha (PSTU), candidato à Prefeitura de Belo Horizonte, sabatinado pelos jornalistas dos Diários Associados (Estado de Minas, TV Alterosa e Portal Uai).

Rocha reconhece que, diante da baixa pontuação nas pesquisas eleitorais (menos de 1% das intenções de voto a cinco dias do pleito), a probabilidade de chegar ao posto de chefe do Executivo é remota. Por isso, aposta na disseminação de ideias, ainda que não saia vencedor.

“Temos um crescimento que não aparece nas pesquisas, mas em locais fundamentais para nós, como Barreiro, Venda Nova e Região Leste. Mesmo que termine o processo eleitoral agora no domingo, o PSTU vai estar no campo das lutas justamente defendendo os direitos dos trabalhadores, a população que para a gente faz diferença”, declara.

Porém, caso alcance o objetivo maior de se eleger prefeito, Wanderson já tem em mente seu projeto prioritário – a formação de conselhos populares para decidir onde os recursos públicos serão aplicados. “Nossa aposta é que nas vilas, favelas, escolas e fábricas a população possa se organizar e dizer quais são suas prioridades.”

Qual o principal objetivo das candidaturas do PSTU para a PBH e para a Câmara? É fazer um grande debate de temas? Quais  temas?
Mantemos a mesma linha de Vanessa Portugal (candidata a vereadora pelo PSTU) e os outros candidatos pelo país. O PSTU é um partido socialista, revolucionário, que vem sempre dizendo que no sistema capitalista tudo seria ruim, principalmente para o trabalhador e para o povo pobre. Este ano, o desafio da Vanessa se mantém. É enorme. Entrar numa Câmara Municipal em que todos vêm de uma linha assistencialista, alguns têm ambulância, donos de farmácia, alguns do setor religioso. Vanessa na Câmara vai ser um contraponto para desmascarar as casas legislativas. Sempre tem o toma lá dá cá. Ela é uma militante da luta pela moradia e movimentos pela educação. BH tende a ganhar muito com Vanessa na Câmara.

No melhor dos cenários para o PSTU, sendo o senhor e Vanessa Portugal eleitos, ainda assim ela seria apenas uma vereadora entre 41. Como governar com baixa representatividade na Câmara?
Nós tivemos uma experiência, embora pequena, em Timóteo, em 1988. Uma demonstração de que é possível ter outra forma de governar. Sabemos que nesse sistema capitalista o controle do poder econômico dita quais recursos vão para terceirização, privatização. Nossa aposta é em conselhos populares. É diferente do que o PT trouxe aqui com o Orçamento Participativo. Nossa aposta é que nos bairros, vilas, favelas, escolas e fábricas a população possa se organizar e dizer à prefeitura qual realmente é sua prioridade. Isso nos ajuda na relação com a Câmara. Se conseguirmos que o povo determine onde a política pública vai ser aplicada, facilita para a gente absorver essas demandas, porque vindo propostas dos trabalhadores de um bairro, dificilmente vereadores vão votar contra. A gente descentraliza decisões. Os trabalhadores precisam, de fato, governar a cidade. Se ficar centralizado no prefeito, ele vai ditar para onde os recursos irão.

Como é a aceitação do seu discurso no Brasil governado por Jair Bolsonaro?
Não tivemos rejeição ou manifestações de defesa do governo Bolsonaro. Imaginávamos que teríamos. Mas as pessoas vêm percebendo que a realidade mudou para pior. Alimentos com preço absurdo, o salário já não é mais suficiente. Quando temos esse tempo de conversa, as pessoas manifestam interesse na proposta do PSTU. Conversamos com donos de pequenos negócios. Quando a gente fala que o PSTU não vai ajudar grandes empresários, mas sim os pequenos e os trabalhadores, eles já ficam mais animados. Fomos surpreendidos positivamente com a ida às ruas, com distanciamento e garantias sanitárias.

O senhor faz oposição aos governos Bolsonaro e Zema. Caso seja eleito, não seria necessário manter relações republicanas com os governos federal e estadual?
Não dá para manter relação republicana com quem ataca os direitos dos trabalhadores. BH tem perspectiva de arrecadação para 2021 de R$ 14 bilhões. Desse valor, R$ 1,6 bilhão serão para abertura de crédito que a Câmara Municipal autorizou.  Esse orçamento tem que estar a serviço dos serviços públicos, não para terceirização ou privatização. Temos verbas constitucionais, com previsão de quase R$ 6 bilhões para saúde e educação. Se manter relação com esse governo resolvesse, teria resolvido quando tínhamos prefeituras do PT ou do PSDB. Se fôssemos olhar boa relação, o metrô já tinha vindo. Hoje, temos o Marcelo Álvaro Antônio no governo Bolsonaro, inclusive, ele é suspeito de candidaturas laranja. Ao nosso ver, não precisa nem esperar 2022. A população tinha que ser organizar e já está compreendendo que a continuidade desse governo vai aumentar a morte de nós, negros, dos LGBT, das mulheres. Tem política genocida e não atende de forma nenhuma o trabalhador.

Qual o diagnóstico do PSTU para a situação social de BH? Sobre o empobrecimento da população, as pessoas em áreas vulneráveis da cidade, em situação de rua.
Vendo as propagandas eleitorais, parece que vivemos em outra cidade. E realmente é. É uma cidade dos ricos. Tivemos reunião com lideranças dos moradores em situação de rua e assinamos um compromisso que faz parte do nosso programa, sobre a necessidade de atendimento dessas pessoas. É preciso ter uma política de renda para os desempregados. É preciso ampliar as casas-abrigo em BH. Vamos ter uma política habitacional, moradias populares. Há cerca de 70 imóveis vazios na cidade servindo à especulação imobiliária. De imediato, vamos utilizá-los. Nas ocupações urbanas, a nossa política será de despejo zero. Tem algumas, como a Professor Fábio Alves, com cerca de 700 famílias, no Barreiro, correndo risco de ser despejadas. Teremos políticas como o aluguel social, habitacional, obras públicas na cidade para gerar emprego. Conversei com um grupo da Feira da Moda Mineira, feirantes da feira hippie. Nossa ideia é descentralizar, para gerar emprego também nos bairros.

Qual será a sua prioridade para BH se o senhor for eleito?
Primeiro, o investimento nos conselhos populares, para que o orçamento esteja a serviço dos bairros. Mesmo sabendo que este ano já está sendo aprovado o orçamento para 2021, podemos fazer uma readequação para atender às demandas dos conselhos. Iria para a Saúde, criar leitos de hospitais. Nossa proposta é municipalizar hospitais que recebem verba do SUS. O transporte público é um direito social. Assim que entrarmos, vamos criar uma empresa municipal de transporte, como já existe em algumas cidades. Temos quatro consórcios e três são controlados pela família Carvalho. Esses empresários não cumprem o contrato. Já receberam multas por superlotação nos ônibus e nas estações. O povo está cansado de sofrer. Vamos fazer uma auditoria para cancelamentos. Já tem a previsão para 2021 de renovação da frota pela prefeitura em torno de 60%, 200 ônibus. De imediato, vamos garantir tarifa zero para desempregados e estudantes, depois chegar a toda a população. Porque no governo do PSTU, transporte é um direito social.

Quem financiaria o transporte? E quem vai gerir o sistema? A própria PBH?
Nós não vamos subsidiar os empresários que controlam transporte, como outros candidatos estão dizendo. Não tem mais que passar dinheiro público para os grandes empresários. Os mais ricos da cidade, os milionários, vão desta vez contribuir para a gente acabar com a desigualdade. Teremos um IPTU fortemente progressivo para os milionários da cidade. Faremos levantamento das áreas nobres para refazer o cálculo, para que eles possam pagar valor maior. (Imóveis com) valor até R$ 200.000 terão isenção do IPTU. Vamos trabalhar também com a renda familiar. Vamos criar empresa municipal de transporte coletivo. E teremos conselhos geridos por usuários e trabalhadores do transporte.

Como o PSTU, que tem posição tão firme e não aceita negociar, irá se relacionar na prática, considerando o presidencialismo de coalizão? E considerando a baixa pontuação nas pesquisas, a estratégia de não se coligar foi acertada? 
Quando a gente pensa nacionalmente, independentemente do processo eleitoral, somos um partido que está na luta do dia a dia, pela moradia, por educação de qualidade, saúde de qualidade, contra privatizações. Se não nos organizarmos, vamos manter um ciclo que desde a redemocratização estamos perdendo direitos, com reformas da Previdência, trabalhista. Colocaram discursos no Congresso dizendo que as reformas eram necessárias e que temos que pagar a conta para aumentar empregos. E hoje, o que estamos vendo? Desemprego, fome. Defendemos outra sociedade, que não cabe aqui na Prefeitura de BH, mas entendemos que para superar o sistema capitalista é necessário ter uma sociedade socialista, que não tivemos. Alguns confundem dizendo que todo mundo é socialista, comunista, PT, PCdoB. Não são. São aqueles que se conciliam com grandes empresários. Queremos uma sociedade em que nós, trabalhadores, que produzimos a riqueza, possamos governar aqui em BH. Quando se trata da nossa pontuação nas pesquisas, estamos ganhando ideias. No projeto dos conselhos, não necessariamente depende de o PSTU estar na PBH. Temos um crescimento que não aparece nas pesquisas, mas em locais fundamentais para nós, como Barreiro, Venda Nova, na Leste. Mesmo que termine o processo eleitoral, o PSTU vai estar no campo das lutas defendendo direitos junto com os trabalhadores, a população que para a gente faz diferença. Vamos ter estouros sociais, não tenhamos dúvida. Nessa política nacional e internacional que aplica a conta da crise para os trabalhadores, é certeza que no final do ano ou no próximo vamos ter estouro. E o PSTU vai estar lá para dizer  ‘gente, essa sociedade capitalista não nos serve, temos que nos organizar em outra sociedade’.

Qual a sua proposta para a educação? E sua opinião sobre o ‘escola sem partido’ aprovado em primeiro turno em BH, embora o Supremo Tribunal Federal já tenho se manifestado pela sua inconstitucionalidade?
Para a educação, propomos o básico. Deixar o professor trabalhar, aplicando os 30% do orçamento que a Lei Orgânica diz que tem que ser. Qualificação pública. Valorizar os profissionais da educação, pagamento do piso nacional aos trabalhadores em educação, unificação e equiparação das carreiras. Ampliar o número de escolas. A atual gestão acabou com o tempo integral na educação infantil. Quando se fala em ‘escola sem partido’, realmente as escolas não devem ter partido. Mas as pessoas precisam entender que é uma lei da mordaça. Um projeto que coloca comunidade contra professor, como se fossem inimigos. É um projeto que é gasto de dinheiro público, é inconstitucional e eles ainda insistem. Se ele for para o segundo turno, assim que nós assumirmos vamos vetar tais projetos, que servem mais aos interesses de uma bancada religiosa radical que se alimenta desse tipo de projeto para se manter no poder. Quem fala que defende família, bons costumes, isso se provou com Bolsonaro, não garante alimentação, não garante renda, não garante emprego. Precisamos é de governos em que os trabalhadores possam governar. Não desse tipo de discurso que não atinge direto os trabalhadores no que eles mais precisam, que é ter vida digna, educação pública de qualidade.

O contexto moderno individualiza muito o trabalhador. Há uma parcela considerável de pessoas trabalhando, por exemplo, com aplicativos de transporte. Essa lógica individualista é diferente da ação coletiva e cresceu no período da formação dos grandes sindicatos. Como adequar o discurso do PSTU à nova realidade social?
Temos terminologias mais liberais, como empreendedor, que coloca que a pessoa pode sozinha avançar na vida. Até setores da esquerda colocam que se um negro, uma negra sobem puxam outros. Quando se fala isso, fica nítido que esse ‘puxar’ significa que existe uma base que está fora e uma outra que escala às custas de quem está ficando embaixo. São discursos que tentamos desconstruir. Essa linha do empreendedor, do individualismo e sem direitos fez com que eles começassem a se organizar, ir a Brasília buscar direitos. Se um entregador numa motocicleta tem um acidente e fica afastado do trabalho, não vai ter os direitos. Aos poucos, estão percebendo que essa linha do individualismo é a pior para o trabalhador, porque favorece o próprio sistema e você vira descartável. Se hoje eu estou entregando pelo aplicativo e adoeço, amanhã vai ter alguém no meu lugar. A individualidade leva ao que estamos vendo hoje: poucos foram uma bolha, mas a pirâmide lá em cima permanece com os grandes poderosos. Alguns ficam no meio e nós trabalhadores ficamos na base sofrendo as consequências de sistema opressor que nos explora.

PERFIL
WANDERSON PAIVA ROCHA
  • Naturalidade: BH
  • Idade: 46 anos
  • Estado Civil: casado
  • Filhos: uma
  • Formação: pedagogo com gestão escolar e mestre em sociologia
  • Carreira: movimentos estudantis e sindicais
 
 


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