Jornal Estado de Minas

ELEIÇÕES 2020

Eles não votam, mas elegem: Defesa de animais garante eleição de vereadores


Eles não votam, mas, por causa da fidelidade aos donos, do carinho, da sensibilidade e do amor que recebem, ganharam representantes na política.

A defesa dos animais alcançou maior espaço na campanha eleitoral deste ano e candidatos a vereador com essa bandeira franciscana se deram bem em quatro cidades-polo de Minas: Uberlândia (Triângulo), Juiz de Fora (Zona da Mata), Montes Claros (Norte) e Governador  Valadares (Leste).



Entre os quatro eleitos, três adotaram no nome a palavra “protetora”. É o caso de Adriana Alves Ribeiro, a Drika Protetora (Patriota), de 52 anos, eleita em Uberlândia, que se candidatou pela terceira vez e acredita que hoje existe maior conscientização sobre a proteção aos animais.

Ela encaminha denúncias de maus-tratos ao Ministério Público e cães para doações. “Fui candidata pela causa animal pela primeira vez em 2012 e tive apenas 59 votos. Não usei o título (nome) de protetora, mas tinha um slogan com (o desenho das) patinhas de cachorro, com a frase “Vamos dar voz a quem não pode falar”. As pessoas são tão desconectadas à causa animal que perguntavam se eu era candidata surda e muda, por causa do slogan”, conta ela, que tem 38 anos dedicados aos cuidados dos bichos.

“Em 2012, achava-se que nunca na vida a causa animal iria dar voto, porque cachorro não vota, gato não vota”, salienta Drika. Já em 2016 ela obteve 1.133 votos, mas não conseguiu o mandato. Com a mesma temática, foi candidata a deputada federal em 2018 e recebeu 5.886 votos, sem ser eleita. Mas, no último dia 15, finalmente se elegeu vereadora, com 2.653 votos. “Me sinto realizada porque consegui provar que animal dá voto, sim. Os animais não votam, mas os tutores, sim. A gente conseguiu dar visibilidade à causa animal”, comemora.



"A minha eleição mostra que as pessoas estão se sensibilizando com a situação dos animais" Cecília Meireles Ferreira (PP), vereadora eleita em Montes Claros (foto: LUIZ RIBEIRO/EM/D.A.PRESS)


Como vereadora, Drika pretende propor criação de um consultório veterinário móvel gratuito para os animais de população de baixa renda e de um projeto de castração de cães de rua. “Quando se castra um cachorro de rua, a gente tira outros 100 da rua”. Ela diz também que trabalhará para acabar com maus-tratos aos cavalos dos carroceiros. É o projeto “cavalo de lata”, que substitui as carroças por carrinhos puxados por bicicletas ou por  motocicletas. “O objetivo é ajudar as pessoas que hoje trabalham com carroça a fazer algum curso ou outra coisa, para mudar de profissão”, afirma.
  
Outra ideia é desenvolver projetos nas escolas com orientação para que os alunos cuidem bem dos animais. “Se a gente ensinar as crianças a defenderem os animais, no futuro vamos ter menos abandono e menos maus-tratos aos animais”, afirma Drika, que também defende leis mais rígidas e multas para quem agredir cães, gatos e outros bichos no município de Uberlândia.

Montes Claros

Ela tem nome de poeta, gosta de poesia, mas confessa que sua paixão é outra: proteção dos animais. E foi com essa bandeira que Cecília Meireles Ferreira, a Ceci Protetora (PP), de 35 anos, se elegeu vereadora em Montes Claros, no Norte de Minas, com 1.786 votos. “A minha eleição mostra que, cada vez mais, as pessoas estão se sensibilizando com a situação dos animais”, avalia. A vereadora eleita cuida de animais há 17 anos e há 10 ajudou a organização não governamental Apelo Canino coordenando um programa de controle populacional de animais na região, cerca de 3 mil animais, gratuitamente. Também realiza o resgate de cães em más condições e ações voltadas para a adoção e “guarda responsável”.





“É uma grande responsabilidade saber que tantas pessoas confiam no meu trabalho e acreditam em mim”, diz Cecília, que pretende propor a criação do Conselho Municipal e do Fundo Municipal de Proteção e Bem-estar Animal, para captura, esterilização vacinação e devolução, e do “Cão Comunitário”, para animais de rua. “Pretendo trabalhar  por meio de políticas públicas permanentes e específicas que envolvam programas multidisciplinares, sustentáveis e humanitários de manejo de animais domésticos”, explica.

Segundo ela, Montes Claros, “como grande parte dos municípios brasileiros”, enfrenta excesso populacional de animais, que gera maus-tratos, abandono, mordeduras, problemas sanitários, acidentes de trânsito, comércio indiscriminado, transmissão de zoonoses, entre outras consequências ruins.

Afeto animal contra depressão


A proteção dos animais garantiu também a eleição da dona de casa Kátia Aparecida Franco (PSC), a Kátia Franco Protetora, para a Câmara Municipal de Juiz de Fora, na Zona da Mata, com 2.696 votos. “Tenho orgulho de representar uma causa tão nobre”, diz. A nova vereadora conta que seu apreço pelos bichos começou há 10 anos, quando enfrentou depressão profunda e conseguiu se recuperar depois que recebeu de presente de uma amiga gato Eros. “Ele (o gato) era muito dependente de mim, e com isso foi me ajudando demais, essa dependência me fez um dia perceber e inclusive prometer a ele que protegeria a todos os animais, por causa do bem que ele me fazia, inclusive hoje sou vegana, muito disso vem dessa época”, reconhece Kátia.





Ela diz que vai propor na Câmara o SAMUVet, serviço móvel de atendimento de urgência para socorrer animais gratuitamente. E ainda criar um serviço contínuo de castração. Mas vai atuar além da questão animal.  “Na área social, quero ampliar, criar e fortalecer iniciativas que tirem as crianças das ruas, evitando que se envolvam com drogas, entre outras coisas ruins. Meu mandato será participativo e transparente, a população estará junta comigo nas minhas ações”, promete.

Resgates 


O vereador Alê Ferraz (DEM) foi reeleito para o segundo mandato em Governador Valadares, no Leste de Minas, com 1.969 votos, também com a bandeira da proteção dos animais. “Eu sempre gostei de animais. Tenho uma cachorrinha chamada Mini, que é o xodó da casa. Maus-tratos é uma questão que sempre me incomodou. Mas o que eu fazia antes era a minha parte de cidadão comum: arrumar água ou comida para animal abandonado, mas a proteção animal é mais complexa”, comenta.
Katia Franco Protetora, eleita vereadora em Juiz de Fora (foto: ARQUIVO PESSOAL)


“Hoje, o meu trabalho é de porta-voz da causa animal no Legislativo. Confesso que o carinho é tanto que também já participo de resgates, como nas enchentes na cidade”, conta. Ele explica no que no atual mandato conseguiu a instalação do “castromóvel” na cidade para “controlar a superpopulação des animais de rua e atender cães e gatos de famílias em situação vulnerável, que, por não conseguirem arcar com as despesas da cirurgia, abandonam os animais ou acumulam os que vão nascendo.



Foi de sua autoria o projeto aprovado na Câmara que proíbe a soltura de fogos de artifício para não assustar animais. Alê é um dos autores também da Lei 6.798, que trata da proteção de animais de grande porte, como cavalos. “Com a lei, colocamos um veículo de remoção dos que estavam abandonados nas ruas, sofrendo maus-tratos e causando acidentes. Eles são microchipados e levados para o curral municipal, onde recebem tratamento adequado, desde assistência veterinária a uma alimentação de qualidade”, explica. Para o segundo mandato, afirma que pretende ampliar a luta em defesa dos pet. “Nosso maior objetivo é construir um hospital público veterinário na cidade, para atender animais vítimas de maus-tratos”, além do “ParCão”, destinado aos tutores e animais.

Para o professor Carlos Ranulfo, do Departamento de Ciência Política, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a eleição de vereadores em defesa dos animais se justifica porque os pets hoje “são considerados filhos, alguém da família, então, a proteção dos animais cativa as pessoas”.

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