Jornal Estado de Minas

POLÍTICA

'Cota para negros no Parlamento seria avanço'

O sociólogo Luiz Augusto Campos atribui a baixa representatividade dos negros na política a dificuldades de acesso aos partidos políticos e a recursos de campanha - dinheiro e tempo de TV. Para ele, a decisão que determinou que os recursos sejam divididos proporcionalmente entre candidaturas negras e brancas é um avanço, mas "tímido".

"Temos base jurídica para ter cota nas listas partidárias, destinando o mínimo de 30% (da composição de chapas) para pretos e pardos. Mas temos que avançar mais nesse debate e pensar em cotas no Parlamento", afirmou Campos, que é professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj e autor do recém-lançado Raça e Eleições no Brasil, em coautoria com o professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília Carlos Machado.

Por que negros têm menos chance de serem eleitos no País?

Essas candidaturas estão distribuídas de maneira muito desigual entre os partidos. Enquanto os partidos maiores, mais antigos e com mais força eleitoral tendem a ter mais candidatos brancos, os nanicos tendem a ter mais candidatos pretos e pardos. O acesso aos partidos e a recursos de campanha - dinheiro e tempo de TV - são os dois principais gargalos.

Por que os partidos maiores tendem a ter menos negros nas chapas?

Partidos, de modo geral, buscam eleger membros. Eles recrutam candidatos que sejam considerados potenciais vencedores, "bons de voto". Como fazem isso? Olham para o passado, para quem acham que tem um perfil bom de voto. Nos grandes partidos, esse perfil é mais numeroso, a competição para ocupar esses espaços é maior, ao mesmo tempo em que é um perfil mais branco, masculino, de meia idade. Os partidos menores têm uma competição menor para compor as listas partidárias e acabam mais abertos a setores mais desfavorecidos. Mas esses partidos pequenos vão conquistar menos vagas.

Quanto a recursos, a Justiça determinou que sejam divididos proporcionalmente entre candidaturas negras e brancas.

É um avanço tímido. Primeiro porque, rigorosamente, o que o Tribunal Superior Eleitoral definiu é que a quantidade de recursos deve obedecer à quantidade de pretos e pardos lançados pelos partidos. Mas o TSE não acatou a criação de cotas eleitorais. Se os partidos não quiserem lançar candidatos pretos e pardos, eles podem. Um segundo ponto é que a normativa não atinge o financiamento privado, sendo que, falando das eleições municipais, mais da metade dos candidatos faz campanha com recurso próprio ou de doação privada. Além disso, o TSE costuma aceitar investimentos em prefeitura nessa cota, o que pode deixar os candidatos a vereador a ver navios.

Dada a relação entre raça e classe, a baixa porcentagem de negros eleitos não se deve a uma desvantagem econômica?

Existe uma sobreposição entre essas duas coisas. Mas, quando a gente aplica alguns modelos estatísticos que buscam isolar o efeito da classe, tanto pela ocupação do candidato, pelo seu nível de renda ou de instrução, notamos que, ainda assim, existe uma desvantagem para candidaturas negras. E o que a gente nota é que a desigualdade racial se mostra sobretudo no grupo dos candidatos com mais chance de se eleger. É no topo da competição eleitoral que as desigualdades raciais se tornam mais agudas. E isso é importante, porque é do topo que saem os eleitos.

Que medidas podem garantir uma maior diversidade?

Temos base jurídica para ter cota nas listas partidárias, destinando o mínimo de 30% (da composição de chapas) para pretos e pardos. Mas temos que avançar nesse debate e pensar em cotas no Parlamento.

Qual seria o impacto de ter mais negros na política?

Uma política mais diversa é uma política que funciona melhor. Não necessariamente a presença de mais mulheres ou mais negros na política vai implicar mais pessoas comprometidas com pautas progressistas. Mas, no Estado brasileiro, políticas públicas são debatidas por homens brancos de meia-idade, ainda que em grande medida sejam formuladas para negros. Grande parte dos beneficiários de saúde pública são negros, da educação pública também. Ter esses grupos no Parlamento agrega um conhecimento social para a formulação de políticas públicas. A diversificação da política tem a ver com a maior eficácia da ação estatal. A expectativa é de que a inclusão leve a uma maior politização, formal, do debate antirracista brasileiro.

Estas eleições indicaram maior diversidade nas Câmaras Municipais. Em São Paulo, teremos uma vereadora negra e trans.

Estamos avançando, mas timidamente. O avanço de pretos e pardos nas Câmaras foi de três pontos porcentuais. No caso das mulheres negras, o avanço foi mais "ousado", em torno de 23%, mas a gente saiu de um patamar muito baixo. Estamos falando de 3 mil mulheres para cerca de 3.600. No caso de homens negros, o avanço foi de aproximadamente 1%. É um avanço, mas limitado.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.



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