No último dia do ano, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, deixará o governo para tomar posse no Tribunal de Contas da União (TCU), na vaga aberta pela aposentadoria precoce do ministro José Múcio Monteiro. Filho do capitão do Exército Jorge Francisco, morto em 2018, que por 20 anos foi chefe de gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara de Deputados, Oliveira tem uma relação familiar com o presidente e seus filhos.
No governo, onde acumulou o cargo de Subchefe para Assuntos Jurídicos, tornou-se um dos assessores mais influentes.
Agora, diz que na Corte de Contas se pautará por uma atuação técnica, mas sem negar a proximidade com Bolsonaro. "Não vou fingir que não sou amigo do presidente", disse ao jornal O Estado de S. Paulo.
Na conversa, o ministro contou que a primeira providência ao tomar posse no novo posto é desativar a conta no Twitter, com 141 mil seguidores, em que foi alvo de críticas de apoiadores mais radicais do presidente. "Com todo o respeito, acho que essa militância atrapalha, sim", disse.
O sr. é um dos principais auxiliares do presidente e próximo da família. Como vai atuar com independência no TCU?
Com toda honestidade, da mesma maneira que atuei no governo. Como subchefe para Assuntos Jurídicos, tive que ser independente. Não foram poucas as vezes em que eu tive de dizer ao presidente que não era a melhor decisão. Nem sempre eu disse 'sim' ao presidente.
O sr. era cotado para o Supremo Tribunal Federal (STF), mas o indicado foi o ministro Kássio Nunes Marques. Como foi essa construção que o levou ao TCU?
Nunca teve essa cogitação. O nome considerado (ao STF) era o do ministro André Mendonça. Sempre o defendi e defendo o nome dele para a segunda vaga porque entendo que ele reúne as condições técnicas e pessoais (Bolsonaro poderá indicar novo integrante para o STF em julho, com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio Mello). A vaga do TCU me surpreendeu porque não era previsto que fosse agora, mas o ministro José Múcio optou por se aposentar. Vou com o compromisso de fazer um trabalho técnico.
O sr. está preparado para receber críticas por ser próximo ao presidente?
Não macula em nada ter proximidade com o presidente, porque no TCU não se decide sozinho. Eu serei um entre os nove ministros que vão avaliar os atos de gestão desse presidente e de todos os demais que vierem depois dele. Se tiver que adotar qualquer medida, vou adotar. Vou manter a amizade com ele. Pretendo frequentar a casa do presidente, seja ele presidente ou não. As críticas são naturais, mas não vou fingir que não sou amigo do presidente. É uma relação até de família.
O Brasil se aproxima dos 200 mil mortos por causa da covid-19. O governo federal errou?
Só erra quem faz. O governo precisa agir e eventualmente pode errar. O presidente nunca negou a existência do vírus, nem nunca desconsiderou a importância da crise de saúde, mas ele sempre colocou que se a economia colapsar também vai matar até mais que o próprio vírus. Entendo que há uma distorção (entre o que é publicado) daquilo que é a intenção do presidente.
O sr. muitas vezes foi apontado no governo como uma voz que ajudava a reduzir as tensões internas e com outros Poderes.
Sou uma pessoa que procura evitar os confrontos, sempre procuro fazer uma composição, conversar, entender um ponto de vista diferente do meu e chegar a um ponto de consenso. Não é fácil. Não tinha a pretensão de ocupar esse espaço que acabei ocupando, foi algo natural. Atribuo isso à relação pessoal que eu tenho com o presidente.
O sr. foi alvo de críticas de bolsonaristas que pediam o fechamento do STF. Como viu isso?
A militância mais radical, chamada base bolsonarista, me criticou muito. Em parte por incompreensão do meu papel. Como subchefe para Assuntos Jurídicos, não tinha a ver com enfrentamento com o Supremo. Isso cabe ao advogado-geral da União. Estou fazendo um balanço das minhas atividades no Twitter, mas vou desativar logo após a posse no TCU, dia 31. Criei a conta por estar no governo, mas de um tempo para cá até parei de fazer postagens por comentários muito agressivos e desproporcionais. Não era uma crítica ao meu trabalho, eram comentários ofensivos a mim e à minha família.
A militância mais estridente atrapalha o governo?
Com todo o respeito, acho que essa militância atrapalha sim. Tem a legitimidade de questionar, de cobrar e tudo, mas eu jamais vou defender intervenção militar. Há quem defenda rasgar a Constituição. Eu não defendo isso. Temos muitas imperfeições, mas temos que corrigir as imperfeições. Não defendo golpe militar. E fui criticado por gente que entende que deveria ter. Quando o ministro Alexandre de Moraes, por exemplo, deu a decisão de suspender a posse do diretor-geral da Polícia Federal porque havia uma controvérsia, eu fui o primeiro a dizer para o presidente revogar o ato. Não me arrependo.
O delegado Alexandre Ramagem pode voltar a ser indicado ao comando da Polícia Federal?
Acho que sim. Não vejo impedimento nenhum. Não estou falando da pessoa, mas ele é delegado da PF, classe especial, preenche todos os requisitos legais para ser diretor da PF. Essa escolha cabe ao presidente.
A PGR deve apurar suposta ajuda da Abin, comandada por Ramagem, à defesa de Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ).
Não participei de nenhuma reunião, não tenho conhecimento, se teve ou não teve documento. Desconheço completamente.
Quanto a relação familiar atrapalha o governo?
Não acho que atrapalha. Os filhos construíram esse projeto político com o pai. Seria justo no momento em que ele está no ápice afastar os filhos, que estiveram com ele todo esse tempo? São pessoas que reverberam os valores do presidente, que, até pelo vínculo sanguíneo, personalizam de maneira mais enfática aquilo que o presidente tem como pensamento, ainda que cada um tenha sua individualidade.
O deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato do Planalto à presidência da Câmara, é denunciado na Lava Jato, enquanto o presidente foi eleito com o discurso de combate à corrupção. Não é um contrassenso?
Entendo que é legítima a crítica, é razoável. Por outro lado, vivemos num sistema que temos a presunção de inocência. Não foram raras as vezes em que a pessoa é citada, acusada numa delação, mas (a acusação) não se comprovou verdadeira.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.