O processo eleitoral brasileiro passou por mudanças significativas em 2020 e uma das novas regras vai forçar os partidos a se reinventarem daqui em diante. Com o fim das coligações partidárias nos pleitos para cargos proporcionais (vereadores e deputados federais, estaduais e distritais), que força os candidatos a participarem da eleição em chapa única dentro do próprio partido, a tendência é de que a diversidade das legendas no Poder Legislativo seja cada vez mais baixa. Não à toa, os primeiros reflexos foram sentidos já nos últimos pleitos municipais.
As siglas nanicas — com menos de 100 mil políticos filiados — foram as mais afetadas com a norma. Em 2016, eram nove partidos nessa situação (Pros, PEN, PMB, Rede, PPL, Novo, PCB, PCO e PSTU), que, juntos, lançaram 31.514 candidatos aos parlamentos municipais, conseguindo eleger 2.022. Já nas eleições de 2020, com a extinção de algumas siglas e a fusão de parte delas a outros partidos, apenas sete legendas de menor expressão concorreram nas urnas (Rede, PMB, Novo, PCB, PCO, PSTU e UP), com 8.188 nomes para vereador, sendo que apenas 221 tiveram sucesso.
Outro impacto causado pela nova legislação foi na quantidade de partidos que elegeram candidatos. Em 2020, quatro das 33 legendas (12%) que participaram do processo não conseguiram sequer um mandato: PCB, PCO, PSTU e UP. Na eleição municipal anterior, somente duas das 35 siglas (5%) que concorreram não tiveram eleitos: PCO e PSTU. Como consequência desse novo cenário, Câmaras Municipais do país serão formadas por quatro partidos ou menos na legislatura que começa neste ano. Levantamento feito pelo Correio, com base nas estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mostra que 2.752 casas legislativas estão nessa situação. O número é quase a metade do total de cidades brasileiras (5.571).
Segundo o TSE, serão 1.191 câmaras compostas por quatro partidos; 1.004, por três; e 543, por dois. Além disso, em 14 municípios do país, os vereadores serão todos de uma única sigla — a marca é inédita na história do Brasil. A maioria dessas cidades é do Nordeste, sendo cinco somente na Paraíba: Bom Sucesso, Ouro Velho e São José do Sabugi (as três só com políticos do DEM), além de Monte Horebe e Vista Serrana (ambas com nomes apenas do MDB).
Também fazem parte dessa lista as piauienses Belém do Piauí e Curral Novo do Piauí (com o MDB), as potiguares Frutuoso Gomes (MDB) e Viçosa (Republicanos), a alagoana Cacimbinhas (MDB), a maranhense São Pedro dos Crentes (PSL), a pernambucana Quixaba (Avante) e a sergipana São Miguel do Aleixo (PSC). A única cidade fora da região que terá um parlamento unipartidário é a gaúcha Barra do Rio Azul (PSD). No pleito de 2016, nenhuma dessas cidades elegeu vereadores de apenas uma legenda.
O Nordeste também é a região com o maior número de cidades que serão legisladas por dois partidos, com 373: 15, em Alagoas; 44, na Bahia; 33, no Ceará; 24, no Maranhão; 85, na Paraíba; 26, em Pernambuco; 82, no Piauí; 55, no Rio Grande do Norte; e nove, em Sergipe. Mais 170 câmaras de outros estados também só terão duas legendas: 16, em Goiás; 38, em Minas Gerais; quatro, em Mato Grosso do Sul; cinco, no Mato Grosso; 17, no Paraná; 45, no Rio Grande do Sul; 15, em Santa Catarina; nove, em São Paulo; e 21, em Tocantins.
As complicações para os partidos devem ser ainda maiores nas futuras eleições por conta, também, da regra da cláusula de barreira, que estabeleceu parâmetros para o acesso das legendas aos recursos do fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão.
A norma vale desde 2018 e, naquele pleito, apenas as siglas que tiveram 1,5% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados foram autorizadas a usufruir dos direitos. A partir de 2022, contudo, esse índice vai passar para 2%. O aumento será gradativo até 2030, quando atingirá 3%.
“Se considerar como hipótese esse cenário se manter no pleito de 2022, a representação atual dos partidos na Câmara federal reduziria de 24 para 18 siglas com representação parlamentar. Além disso, o dado reforça um indicador importante na redução de partidos projetada na reforma política/eleitoral pelo fato de as eleições de 2022 não terem coligações em nível federal e estadual”, observa o Diap.
O diagnóstico de 2020 mostra, portanto, que o Brasil está prestes a passar por um processo de enxugamento de legendas. “Deve existir um movimento de aproximação desses partidos pequenos. Muitos deles devem mapear pontos comuns nas suas agendas, se juntarem para lançar candidatos que atendam às expectativas das siglas e, assim, tentar fazer frente às legendas maiores. Caso contrário, os nanicos enfrentarão muitos problemas”, analisa o cientista político Ivan Ervolino, diretor de estratégia da startup de inteligência política Sigalei.
Para ele, a redução das legendas pode facilitar a vida do eleitor, que vai definir em quem votar com um pouco mais de facilidade, e também deve ser positiva porque vai barrar a existência de “partidos de aluguel”, criados apenas para atender aos interesses de políticos de maior relevância. Ervolino diz que esse processo não pode resultar na acomodação de siglas maiores. “O que não pode acontecer é que, entre esses partidos grandes, exista um alinhamento supranacional no sentido de trazer um debate muito morno e com poucos avanços. A sociedade tem muitos grupos, e a função da política é representar esses interesses”, ressalta.
Coordenador do Observatório do Legislativo Brasileiro, João Feres também defende que existam menos legendas, o que pode facilitar as relações entre Executivo e Legislativo, encurtando o tempo para a aprovação de projetos, mas ele diz que o sistema eleitoral não pode mudar drasticamente, a ponto de evitar a criação de partidos. “É natural da democracia que novas forças políticas advindas da sociedade surjam, se organizem e, eventualmente, se tornem um partido político. As mudanças, portanto, precisam ser muito bem dosadas”.
As siglas nanicas — com menos de 100 mil políticos filiados — foram as mais afetadas com a norma. Em 2016, eram nove partidos nessa situação (Pros, PEN, PMB, Rede, PPL, Novo, PCB, PCO e PSTU), que, juntos, lançaram 31.514 candidatos aos parlamentos municipais, conseguindo eleger 2.022. Já nas eleições de 2020, com a extinção de algumas siglas e a fusão de parte delas a outros partidos, apenas sete legendas de menor expressão concorreram nas urnas (Rede, PMB, Novo, PCB, PCO, PSTU e UP), com 8.188 nomes para vereador, sendo que apenas 221 tiveram sucesso.
Outro impacto causado pela nova legislação foi na quantidade de partidos que elegeram candidatos. Em 2020, quatro das 33 legendas (12%) que participaram do processo não conseguiram sequer um mandato: PCB, PCO, PSTU e UP. Na eleição municipal anterior, somente duas das 35 siglas (5%) que concorreram não tiveram eleitos: PCO e PSTU. Como consequência desse novo cenário, Câmaras Municipais do país serão formadas por quatro partidos ou menos na legislatura que começa neste ano. Levantamento feito pelo Correio, com base nas estatísticas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), mostra que 2.752 casas legislativas estão nessa situação. O número é quase a metade do total de cidades brasileiras (5.571).
Segundo o TSE, serão 1.191 câmaras compostas por quatro partidos; 1.004, por três; e 543, por dois. Além disso, em 14 municípios do país, os vereadores serão todos de uma única sigla — a marca é inédita na história do Brasil. A maioria dessas cidades é do Nordeste, sendo cinco somente na Paraíba: Bom Sucesso, Ouro Velho e São José do Sabugi (as três só com políticos do DEM), além de Monte Horebe e Vista Serrana (ambas com nomes apenas do MDB).
Também fazem parte dessa lista as piauienses Belém do Piauí e Curral Novo do Piauí (com o MDB), as potiguares Frutuoso Gomes (MDB) e Viçosa (Republicanos), a alagoana Cacimbinhas (MDB), a maranhense São Pedro dos Crentes (PSL), a pernambucana Quixaba (Avante) e a sergipana São Miguel do Aleixo (PSC). A única cidade fora da região que terá um parlamento unipartidário é a gaúcha Barra do Rio Azul (PSD). No pleito de 2016, nenhuma dessas cidades elegeu vereadores de apenas uma legenda.
O Nordeste também é a região com o maior número de cidades que serão legisladas por dois partidos, com 373: 15, em Alagoas; 44, na Bahia; 33, no Ceará; 24, no Maranhão; 85, na Paraíba; 26, em Pernambuco; 82, no Piauí; 55, no Rio Grande do Norte; e nove, em Sergipe. Mais 170 câmaras de outros estados também só terão duas legendas: 16, em Goiás; 38, em Minas Gerais; quatro, em Mato Grosso do Sul; cinco, no Mato Grosso; 17, no Paraná; 45, no Rio Grande do Sul; 15, em Santa Catarina; nove, em São Paulo; e 21, em Tocantins.
Futuro
As complicações para os partidos devem ser ainda maiores nas futuras eleições por conta, também, da regra da cláusula de barreira, que estabeleceu parâmetros para o acesso das legendas aos recursos do fundo partidário e ao tempo de propaganda gratuita no rádio e na televisão.
A norma vale desde 2018 e, naquele pleito, apenas as siglas que tiveram 1,5% dos votos válidos para a Câmara dos Deputados foram autorizadas a usufruir dos direitos. A partir de 2022, contudo, esse índice vai passar para 2%. O aumento será gradativo até 2030, quando atingirá 3%.
Se a regra tivesse sido aplicada nas eleições municipais — segundo um estudo feito pelo Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) —, apenas 18 dos 33 partidos chegariam à marca de 2% dos votos válidos, considerando os votos nominais e de legenda obtidos. Quinze deles, portanto, ficariam privados do fundo partidário e do tempo em rádio e tevê: PROS, PV, PSol, PCdoB, PRTB, PTC, PMN, DC, Rede, Novo, PMB, UP, PSTU, PCB e PCO.
“Se considerar como hipótese esse cenário se manter no pleito de 2022, a representação atual dos partidos na Câmara federal reduziria de 24 para 18 siglas com representação parlamentar. Além disso, o dado reforça um indicador importante na redução de partidos projetada na reforma política/eleitoral pelo fato de as eleições de 2022 não terem coligações em nível federal e estadual”, observa o Diap.
O diagnóstico de 2020 mostra, portanto, que o Brasil está prestes a passar por um processo de enxugamento de legendas. “Deve existir um movimento de aproximação desses partidos pequenos. Muitos deles devem mapear pontos comuns nas suas agendas, se juntarem para lançar candidatos que atendam às expectativas das siglas e, assim, tentar fazer frente às legendas maiores. Caso contrário, os nanicos enfrentarão muitos problemas”, analisa o cientista político Ivan Ervolino, diretor de estratégia da startup de inteligência política Sigalei.
Para ele, a redução das legendas pode facilitar a vida do eleitor, que vai definir em quem votar com um pouco mais de facilidade, e também deve ser positiva porque vai barrar a existência de “partidos de aluguel”, criados apenas para atender aos interesses de políticos de maior relevância. Ervolino diz que esse processo não pode resultar na acomodação de siglas maiores. “O que não pode acontecer é que, entre esses partidos grandes, exista um alinhamento supranacional no sentido de trazer um debate muito morno e com poucos avanços. A sociedade tem muitos grupos, e a função da política é representar esses interesses”, ressalta.
Coordenador do Observatório do Legislativo Brasileiro, João Feres também defende que existam menos legendas, o que pode facilitar as relações entre Executivo e Legislativo, encurtando o tempo para a aprovação de projetos, mas ele diz que o sistema eleitoral não pode mudar drasticamente, a ponto de evitar a criação de partidos. “É natural da democracia que novas forças políticas advindas da sociedade surjam, se organizem e, eventualmente, se tornem um partido político. As mudanças, portanto, precisam ser muito bem dosadas”.