O ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, crê que o Brasil enfrenta uma “megaepidemia” em curva crescente por conta do avanço do novo coronavírus. As variantes surgidas no Amazonas e no Reino Unido já foram detectadas em ao menos 17 estados. O Nordeste enfrenta a explosão de casos e óbitos em virtude da doença, enquanto Rio Grande do Sul e Santa Catarina tentam evitar o colapso do sistema de saúde. Ao Estado de Minas, Mandetta afirmou, ainda, que o número de infecções nos estados do Sudeste tende a subir nos próximos meses.
“Já estamos vivendo uma megaepidemia, com viés de alta. Estamos, praticamente, com todas as capitais do Nordeste — e conversei com Rio Grande do Norte, Fortaleza e João Pessoa — lá em cima (nos números da pandemia). Todos tentando fazer um tipo de lockdown ou algo similar. O Rio Grande do Sul, nesta semana, vai passar por um problema de estrangulamento, que é quando não há mais leitos disponíveis em todo o estado. No Sudeste — em São Paulo, Minas e Rio de Janeiro — sempre o aumento de casos é entre março e abril. A tendência é que o Sudeste aumente os casos progressivamente. A velocidade com que o vírus está se propagando é muito mais rápida que a velocidade da vacinação”, sentenciou, à reportagem, nessa quarta-feira (24/02)..
Em janeiro, o ex-chefe da saúde federal disse, à TV Cultura, que o país poderia enfrentar a “megapandemia” em 60 dias se as mutações não fossem monitoradas adequadamente. Em algumas localidades, contudo, os efeitos já são sentidos. Em solo amazonense, o número de mortes por COVID-19 contabilizadas neste ano — 5.314 — já superou o de 2020, quando foram 5.285 baixas. Os dados de 2021, vale lembrar, contemplam óbitos do ano passado, mas oficializados após investigação.
Ao todo, o Brasil soma 10.324.463 casos e 249.957óbitos. Em 45 dias, foram registradas 50 mil mortes e, antes mesmo do fim deste mês, as 200 mil vítimas contabilizadas em janeiro transformaram-se em quase 250 mil.
“O governador do Distrito Federal (Ibaneis Rocha, do MDB) quer fechar Brasília, para que não entre gente de Goiás ou do Tocantins. Já começa a haver esse tipo de situação, em que irmão desconhece irmão, por conta da absoluta falta de prevenção, absoluta falta de clareza sobre tratamentos e vagas e hospitais. Médicos, enfermeiros e fisioterapeutas estão esgotados. Muitos morreram dessa doença, assim como muitas esposas, pais e filhos. Eles estão para lá de esgotados, o que gera uma somatória muito complexa para calcular o tamanho do que vem pela frente”, vislumbrou.
Reflexos se aproximam
A pandemia fez com que o país direcionasse o sistema de saúde ao enfrentamento do vírus. Assim, procedimentos tidos como menos graves acabaram cancelados. Consultas médicas e exames de rotina também ficaram em segundo plano. Para Mandetta, os efeitos podem ser sentidos agora. Apressar a vacinação pode diminuir o problema que se avizinha.
“Casos de câncer e cirurgias que deveriam ter sido feitas em 2020, agora chegam tardias. Muita gente chegando por não ter feito check-up ou prevenção cardíaca. Esse somatório de coisas antevê total falta de preparo do país para lidar com o semestre. Espero que Fiocruz e Butantan comecem a produzir em escala maior, para a gente chegar em julho pelo menos com a população de maior risco vacinada”.
Na projeção otimista traçada pelo ex-ministro, o país precisa encerrar o ano com a estratégia de imunização atingindo, ao menos, 160 milhões de pessoas.
Histórico
Ministro da Saúde entre janeiro de 2019 e abril do ano passado, Mandetta foi demitido por Jair Bolsonaro (sem partido). Enquanto o então chefe da saúde federal defendia a adoção de medidas restritivas, o presidente se mostrava cético em relação a ações do tipo.
Ele foi substituído pelo oncologista Nelson Teich, que durou menos de um mês no posto. O cargo foi ocupado pelo general Eduardo Pazuello, tido como especialista em logística. O militar assumiu interinamente e, tempos depois, acabou efetivado.
A entrevista
O Estado de Minas publica, nesta quinta (25), trechos de entrevista exclusiva com Luiz Henrique Mandetta. A conversa ocorreu às vésperas do primeiro caso de COVID-19 no país, registrado em 26 de fevereiro do ano passado, completar um ano. À ocasião, ele era o ministro da Saúde. A íntegra vai ao ar nesta sexta (26), nas páginas impressas do jornal e na internet.