A
Câmara dos Deputados
realizou, nesta segunda-feira (5/4), um debate sobre o Projeto de Lei PL 3179/12, que regulamenta a
educação domiciliar
, uma das bandeiras do governo do presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião, os ministros da Educação, Milton Ribeiro, e da Mulher, Família e Direitos Humanos,
Damares Alves
, rebateram argumentos de que a escola ajuda na identificação de casos em que crianças e adolescentes sofrem
abusos sexuais
dentro de casa. Ao defender o projeto, Damares lembrou ter sido
"barbaramente abusada"
em casa e a escola não teria percebido.
A fala da ministra ocorreu após a presidente do Conselho Nacional de Educação (CNE), Maria Helena Guimarães de Castro, externar uma opinião pessoal
contra a educação domiciliar. Segundo a conselheira, diferentes pesquisas mostraram que a maioria dos casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes ocorre dentro de casa, e os agressores são pessoas do convívio das vítimas, geralmente
familiares
. A presidente do CNE disse também que muitos desses casos são identificados pelos professores nas escolas.
"Esse argumento não se sustenta. Todos que me acompanham, não é segredo, [sabem] da forma como eu fui exposta. Eu fui abusada, dos seis aos oito anos de idade, barbaramente abusada. E eu estava no âmbito da escola", disse a ministra. "E a escola, naquela época, claro, uma realidade totalmente diferente, não percebeu, não leu os sinais que eu estava mandando, sendo violentada, e todo o sofrimento que eu passava. Então não justifica dizer que essas famílias, que querem educar os seus filhos, venham adotar essa modalidade [de ensino] para abusar dos seus filhos. Eu acho que é apequenar o debate", disse Damares.
Milton Ribeiro, por sua vez, disse que, no país, cerca de
35 mil famílias
optaram pela educação domiciliar, e muitas delas são alvo de processos judiciais. O titular da Educação afirmou que o projeto de lei em questão é importante para regulamentar essa modalidade de ensino, já adotada, segundo ele, em 65 países. O ministro lembrou que, em 2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) alertou para a necessidade de regulamentação da educação familiar.
Ribeiro também chamou de
"descabida"
a alegação de que a educação domiciliar pode favorecer a ocorrência de abusos contra crianças e adolescentes. "A alegação de violência doméstica contra crianças cujos pais optem pelo homeschooling [educação domiciliar], para mim, é totalmente descabida. A violência doméstica contra a criança ela existe desde o tempo passado, quando não se fala em homeschooling", disse o titular da Educação. "Então, não é o fato de a criança ir à escola que a livra da violência doméstica", acrescentou Ribeiro.
O ministro também rebateu argumentos de que a escola é fundamental para a socialização dos estudantes. Segundo ele, crianças e adolescentes dispõem de outros espaços para interagir com outras pessoas, a exemplo das igrejas.
"Tem essa questão de socialização. É claro que a escola oferece à criança, ao adolescente, essa questão que faz parte da sua formação. Mas existem outras modalidades, com foi bem lembrado pelo deputado [Lincoln] Portela [PL-MG], existem modalidades como a própria família, clubes, bibliotecas e até mesmo as igrejas, por que não? São opções, são modalidades que a criança, o adolescente, vai poder se socializar", afirmou Milton Ribeiro.
Homeschooling
O PL 3179/12, de autoria do deputado Lincoln Portela, altera o Estatuto da Criança e do Adolescente para instituir a
educação domiciliar
como uma das modalidades de ensino. O projeto permite que a educação básica, para alunos de 4 a 17 anos, seja oferecida em casa, sob a responsabilidade dos pais ou tutores, e prevê supervisão e avaliação periódica da aprendizagem pelo poder público.
O texto tramita em conjunto com outras sete propostas sobre o mesmo assunto. Uma delas é o Projeto de Lei 2401/19, enviado ao Congresso pelo governo federal. Esse conjunto de proposições está sendo relatado, na Câmara, pela deputada Luisa Canziani (PTB-PR). Segundo afirmou a parlamentar durante o debate, o tema será analisado diretamente no plenário, sem passar pelas comissões. Ainda não há data prevista para votação da matéria.