Minutos antes de conceder entrevista exclusiva ao Estado de Minas ontem, o presidente do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), desembargador Gilson Soares Lemes, havia acabado de deixar uma reunião de conciliação que suspendeu por dois dias, inicialmente, o toque de recolher e a proibição de visitas domiciliares no estado.
Essa foi só uma das inúmeras ações que o poder Judiciário do território mineiro precisou tomar durante a pandemia da COVID-19, entre a análise de medidas restritivas até atuar para garantir um leito de terapia intensiva para um necessitado.
Essa foi só uma das inúmeras ações que o poder Judiciário do território mineiro precisou tomar durante a pandemia da COVID-19, entre a análise de medidas restritivas até atuar para garantir um leito de terapia intensiva para um necessitado.
Na entrevista, Gilson Lemes descreveu um pouco do que o Judiciário mineiro passa durante a pandemia. Até o fim de fevereiro deste ano, segundo o presidente do TJMG, mais de 3 mil pedidos chegaram até os magistrados, entre revisão de medidas preventivas até garantia de medicamentos e leitos de terapia intensiva. É aí que entra um dos desafios: como cumprir uma ordem judicial se não há UTIs disponíveis, por exemplo? A palavra de ordem entre os juízes é bom senso.
“Eu tenho orientado o desembargador Bruno Terra, que é o nosso superintendente de saúde, que os magistrados devem julgar tecnicamente – cada um tem a autonomia de julgar, de acordo com o caso que foi posto”, explica o desembargador.
O presidente do TJMG tem utilizado a conciliação para resolver os desafios diários. Foi assim que ele tentou solucionar a “guerra santa” entre o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), e o ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre autorização para celebrações presenciais de missas e cultos em pleno pico da pandemia. Veja, na íntegra, a entrevista com o presidente do TJMG.
O presidente do TJMG tem utilizado a conciliação para resolver os desafios diários. Foi assim que ele tentou solucionar a “guerra santa” entre o prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), e o ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre autorização para celebrações presenciais de missas e cultos em pleno pico da pandemia. Veja, na íntegra, a entrevista com o presidente do TJMG.
Qual análise o senhor faz do episódio entre o ministro Nunes Marques x Kalil?
Nós temos uma lei de organização que proíbe o magistrado de comentar outros casos judiciais. A gente não compete ao magistrado comentar qualquer decisão judicial de seus colegas. Mas eu entendo o seguinte: o direito à religião, à crença religiosa, à realização do culto, é um direito constitucional, é uma cláusula pétrea que só pode ser revogada com uma outra constituição. Em Minas Gerais, o governador Zema permite o culto em todas as cidades. Em Belo Horizonte acontece o contrário porque o prefeito restringiu mais do que o governador. Quando um prefeito é autoridade no município, tem essa restrição aqui. Nos outros municípios está permitido a realização de cultos e de missas. Com relação ao prefeito eu posso adiantar que nós tentamos a conciliação na sexta-feira e no sábado, para que a decisão possa ser da forma que foi agora, da restrição do toque de recolher e das reuniões. Mas ele persistiu com a restrição e acabou gerando esse episódio. Nesse momento, como eu disse em relação aos magistrados que temos aconselhado o bom senso, compete ao gestor – seja ele prefeito, governador ou presidente – agir com bom senso em cada um dos casos.
O que foi conversado na reunião que suspendeu o toque de recolher em Minas?
Nós conseguimos, aqui, uma importante decisão do governo. Ficou acertado que a partir de hoje já estão suspensas duas medidas: o toque de recolher e, também, a realização de visitas sociais em domicílio. Ficam suspensas desde hoje (ontem) esse toque de recolher.
Comércio, eventos e afins, então, continuam proibidos após as 20h?
Tivemos uma reunião, hoje, com o governador e com o secretário (de Estado de Saúde), Fábio Baccheretti, e com o Mateus Simões. Nós tentamos muito, numa reunião informal do TJMG, flexibilizar essas regras do comércio. O governador e o próprio secretário de Saúde estão ainda muito receosos de abrir todo o comércio, haja vista o grande número de casos de COVID-19 e a fila de espera para UTIs. Eles vão rever essas medidas e podem ser que algumas regiões do estado de Minas Gerais possam voltar a funcionar o comércio na próxima segunda-feira. Mas, por enquanto, continua na onda roxa, salvo o Triângulo-Norte.
O senhor disse: “Tentamos flexibilizar”. Podemos inferir, então, que o senhor é favorável à reabertura do comércio, bares e restaurantes?
São dois momentos distintos. Um foi a reunião de conciliação da ação popular que buscou a flexibilização de duas medidas: reuniões e toque de recolher. Nós atuamos como mediadores. Houve, aí, um avanço nesse ponto. A outra reunião foi na parte da manhã, que o governador requereu, e nós estivemos aqui mais como participantes. O governador buscou uma posição do TJMG em relação às medidas. O que nós passamos para o governador é que o poder Judiciário não pode entrar diretamente na definição das regras restritivas, porque qualquer questionamento relativamente a essas regras vão bater aqui na porta do Judiciário. Você não pode estar dos dois lados ao mesmo tempo.
O senhor citou várias vezes as filas de UTI. Várias pessoas têm acionado a Justiça para conseguir uma vaga. Como o TJMG tem cuidado disso?
A gente contabilizou, até o fim de fevereiro deste ano, mais de 3 mil pedidos para o Judiciário mineiro, seja para medicamentos, seja para medidas preventivas, seja para internação, seja para vaga de UTI. Eu tenho orientado o desembargador Bruno Terra, que é o nosso superintendente de saúde, que os magistrados devem julgar tecnicamente – cada um tem a autonomia de julgar, de acordo com o caso que foi posto –, ter o bom senso, porque para um diretor de hospital é muito difícil deixar de cumprir uma ordem judicial, mas é muito difícil, também, cumprir uma ordem judicial, sendo que o cumprimento representa escolher qual pessoa vai sair da UTI para ele colocar um que o juiz determinou.