Uma reportagem publicada pelo jornal “O Estado de S. Paulo”, neste domingo (09/05), mostra um esquema que teria sido montado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), no final de 2020, para aumentar sua base de apoio no Congresso Nacional. De acordo com a publicação, o orçamento paralelo seria de R$ 3 bilhões em emendas, “boa parte delas destinada à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259% acima dos valores de referência fixados pelo governo”.
O texto aponta ainda que é possível observar o descontrole de dinheiro público em um conjunto de 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados para indicar como eles preferiam usar os recursos.
Porém, oficialmente, o próprio presidente Bolsonaro vetou a tentativa do Congresso de impor o destino de um novo tipo de emenda (conhecida como RP9), criada durante o seu governo, por “contrariar o interesse público” e ainda estimular o “personalismo”.
O “Estadão” obteve ofícios, ao longo dos últimos três meses, que mostram que o esquema também atropela leis orçamentárias, pois são os ministros que deveriam definir onde aplicar os recursos. Segundo a reportagem, a ação dificulta o controle do Tribunal de Contas da União (TCU) e da sociedade. “Os acordos para direcionar o dinheiro não são públicos, e a distribuição dos valores não é equânime entre os congressistas, atendendo a critérios eleitorais. Só ganha quem apoia o governo”.
REPORTAGEM MOSTRA EXEMPLOS
A matéria cita o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), que teria determinado a aplicação de R$ 277 milhões de verbas públicas só do Ministério do Desenvolvimento Regional, assumindo a função do ministro Rogério Marinho. Deste modo, ele precisaria de 34 anos no Senado Federal para conseguir indicar o montante por meio da emenda parlamentar individual, que garante a cada congressista direcionar livremente R$ 8 milhões ao ano.
O ex-presidente do Senado destinou R$ 81 milhões apenas à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), a estatal que controla, ao lado de outros políticos. Outro exemplo mostrado pelo “Estadão” é o do deputado Lúcio Mosquini (MDB-RO). O governo aceitou pagar R$ 359 mil em um trator que, pelas regras normais, somente liberaria R$ 100 mil dos cofres públicos. No total, o deputado direcionou R$ 8 milhões.
Planilha secreta do governo obtida pela reportagem do “Estadão” revela que Alcolumbre também destinou R$ 10 milhões para obras e compras fora do seu Estado. Dois tratores vão para cidades no Paraná, a 2,6 mil quilômetros do Amapá. Sem questionar, o governo Bolsonaro concordou em comprar as máquinas por R$ 500 mil, quando pelo preço de referência sairiam por R$ 200 mil.
Ao serem entrevistados, deputados e senadores negavam o direcionamento dos recursos ou se recusavam a prestar informações. Confrontados pela reportagem com ofícios assinados por eles e a planilha do governo, acabaram por admitir seus atos. A matéria afirma que a moeda de troca do governo se deu por meio da transferência do controle de bilhões de reais do orçamento ao Congresso.