Alvo de processo disciplinar aberto pelo Comando do Exército, o general Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, apresentou nesta quinta-feira, 27, sua defesa e disse não ter participado de um ato político ao lado do presidente Jair Bolsonaro, no domingo, 23, no Rio. Pazuello afirmou, na justificativa, ter sido convidado pelo presidente para um passeio de moto, quando foi surpreendido com o pedido para subir em um carro de som, ao lado do presidente.
Com esse argumento, o general da ativa negou ter cometido uma transgressão às normas do Exército. O general da ativa destacou, ainda, que não é filiado a nenhum partido e disse que o País não vive um período eleitoral. A informação foi antecipada pela CNN e confirmada pelo Estadão. Em transmissão ao vivo pelas redes sociais, na noite de ontem, Bolsonaro adotou a mesma linha de defesa de Pazuello, na tentativa de livrar o general de uma punição mais severa.
"É um encontro que não teve nenhum viés político, até porque eu não estou filiado a partido político nenhum ainda", afirmou Bolsonaro na live. "Foi um movimento pela liberdade, pela democracia, em apoio ao presidente. Não tinha nenhuma bandeira vermelha, nenhuma foice ou martelo", emendou o presidente, em sintonia com a justificativa apresentada por Pazuello.
O presidente fez vários elogios ao ex-ministro da Saúde, que deixou a pasta em março com o País batendo recorde de mortes por covid-19. Bolsonaro disse na live que Pazuello é "um tremendo gestor", tendo se destacado no Exército desde a preparação para a Olimpíada do Rio, em 2016.
A participação de militares da ativa em atos político-partidários é proibida pelo Regulamento Disciplinar do Exército. A pena para quem desobedecer a essas ordens varia de advertência a prisão por até 30 dias. Pazuello foi aconselhado a antecipar sua ida para a reserva - que deve ocorrer apenas em agosto de 2022 -, na tentativa de receber punição mais branda, como uma advertência verbal, por exemplo, mas não aceitou.
O general avalia que, se sair da ativa agora, passará à CPI da Covid a imagem de que se acovardou. Pazuello já prestou depoimento à CPI, mas foi reconvocado pelos senadores depois de subir a um carro de som com Bolsonaro e discursar sem máscara de proteção contra coronavírus.
Generais ouvidos pelo Estadão avaliaram que a transgressão disciplinar cometida por Pazuello tem potencial para um novo embate entre o Palácio do Planalto e o Comando do Exército. O receio é que a tentativa de blindagem de Pazuello, por parte de Bolsonaro, leve à renúncia do comandante, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, que ontem acompanhou o presidente em viagem a São Gabriel da Cachoeira (AM).
Para contornar o confronto, porém, o Exército pode aplicar apenas uma repreensão, em vez de optar pela pena mais grave. O ministro da Defesa, Braga Netto, tenta encontrar uma solução de meio-termo para evitar uma crise entre o presidente e o comandante.
Repreensão
A solução "média" prevista no regulamento é a repreensão, descrita como uma forma de censura "enérgica", feita por escrito pelo comandante. É publicada em boletim interno da caserna e, por vir a público nas Forças Armadas, vira uma mácula no currículo de um general, principalmente no topo da carreira.
A repreensão é mais grave do que uma advertência verbal - a mais branda das punições. A prisão de Pazuello vem sendo considerada hipótese remota por generais que acompanham o caso, justamente porque pode amplificar a crise.
Apesar das negativas do ex-ministro da Saúde, a transgressão disciplinar foi fartamente documentada. A inexistência de antecedentes, porém, pode ser considerada como atenuante.
Bolsonaro fez ontem um aceno às Forças Armadas e pregou respeito aos "seus" militares. O presidente viajou para o extremo norte da Amazônia, com o objetivo de inaugurar uma ponte de madeira em São Gabriel da Cachoeira e visitar uma área indígena Ianomâmi.
Em pronunciamento político, diante de ministros militares - Braga Netto (Defesa) e Luiz Eduardo Ramos (Casa Civil) -, além do general Paulo Sérgio, e de oficiais do Comando Militar da Amazônia, Bolsonaro chamou todos de "amigos". Ao falar de sua eleição, em 2018, disse que divide a responsabilidade com os militares.
'Respeito'
Um trecho do encontro foi divulgado nas redes sociais do presidente. "O governo respeita os seus militares", afirmou Bolsonaro, usando uma expressão que não é do agrado dos oficiais, já que as Forças Armadas são instituições de Estado, e não de um governo. Bolsonaro já provocou insatisfação na caserna ao se referir várias vezes à corporação como "meu Exército".
O general Paulo Sérgio acompanhou atenciosamente as palavras de Bolsonaro, olhando para ele, de braços cruzados. No fim, aplaudiu o discurso do presidente, assim como os demais à mesa.
O comandante do Exército está prestes a decidir qual punição aplicar à transgressão disciplinar cometida por Pazuello. A possibilidade de uma escalada de tensão na crise entre o Palácio do Planalto e o Exército existe e generais consideram que o comandante pode renunciar, caso seja desautorizado.
Bolsonaro afirmou que o Brasil ainda não vive um período de normalidade e que a liberdade depende das Forças Armadas, embora não tenha citado os clamores por intervenção militar de sua base de apoiadores.
"Tenho certeza de que vocês agirão dentro das quatro linhas da Constituição, se necessário for. Espero que não seja necessário, que a gente parta para a normalidade", disse o presidente.
Norma serve para 'evitar a anarquia', afirma Mourão
O vice-presidente Hamilton Mourão disse ontem que a possível punição a ser aplicada ao general Eduardo Pazuello por participar de ato político com o presidente Jair Bolsonaro se baseia em normas "para evitar a anarquia". "A regra tem que ser aplicada para evitar que a anarquia se instaure dentro das Forças (Armadas)", afirmou o vice, que é general da reserva.
"Assim como tem gente que é simpática ao governo, tem gente que não é. Então, cada um tem que permanecer dentro da linha que as Forças Armadas têm que adotar. As Forças Armadas são apartidárias, não têm partido, o partido das Forças Armadas é o Brasil", observou Mourão.
Pazuello é alvo de um procedimento disciplinar por ter participado de um ato com apoiadores do governo, no Rio, no domingo. O fato de o ex-ministro da Saúde estar ao lado de Bolsonaro - comandante supremo das Forças Armadas - foi apontado como possível atenuante à conduta do general, uma vez que ele estaria cumprindo ordens do presidente. Mourão discordou: "Isso aí é um entendimento meio canhestro".
O vice-presidente defendeu punição ao ex-ministro da Saúde. "Eu sei que Pazuello já entrou em contato com o comandante informando ali, colocando a cabeça dele no cutelo, entendendo que cometeu um erro", disse Mourão no início da semana.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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