Jornal Estado de Minas

PANDEMIA

CPI dos Fura-filas: gastos do governo de Minas em saúde são questionados


A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Fura-filas da vacinação contra a COVID-19, instalada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), iniciou nesta quarta-feira (9) sua segunda fase.

Os deputados estaduais apuram os gastos do governo de Minas na saúde no ano de 2020, que teria sido menor que o empenhado em 2019 e aquém do estabelecido pela Constituição Federal.





Relator da CPI dos Fura-filas, o deputado estadual Cássio Soares (PSD) começou dizendo que somente dois estados gastaram menos em 2019 do que em 2020, ano do início da pandemia do coronavírus.

Um deles é Minas Gerais, que teria gasto R$ 6,71 bilhões contra R$ 6,08 bi, o que caracteriza 1,63% a menos no ano em que o coronavírus ganhou status de pandemia.

Ainda, segundo o relator, a quantia seria referente a 10,75% das receitas de impostos e transferências, quando o mínimo é de 12,29%.

Questionada sobre o motivo para o suposto não cumprimento, a secretária de Planejamento e Gestão de Minas Gerais, Luisa Barreto, afirmou que o índice foi cumprido.

“A gente tem o cálculo conforme os critérios da Secretaria Nacional, que demonstram que Minas Gerais cumpriu o índice constitucional da saúde aplicando em despesas empenhadas 12,29% no ano de 2020. Na redução de R$ 100 milhões que se colocam em relação a 2019, diz respeito aos gastos que se colocam no índice, mas, como já demonstrei, a gente teve crescimento na despesa total do estado com ações de saúde da ordem de mais de R$ 600 milhões, ou 6,65%”, afirmou.





Cássio Soares não se sentiu satisfeito e seguiu questionando. Ele perguntou: “Você afirma, categoricamente, que no ano de 2020 o governo do estado de Minas Gerais cumpriu o mínimo constitucional de acordo com a Lei Federal, complementar Federal, número 141?”.

“Cumprimos o índice constitucional com 12,29% das despesas empenhadas”, respondeu Barreto.

Além de Barreto, outros dois secretários participaram da reunião desta quarta: Fábio Baccheretti, secretário de Saúde, e Gustavo Barbosa, secretário de Fazenda. Os três falaram na condição de convidados e abordaram demais temas relacionados à pandemia no estado.

Ao encerrar a participação na reunião, que durou cerca de cinco horas, Cássio Soares fez um pedido aos secretários e, em especial, à Luisa Barreto.

“Quero pedir à secretária Luisa que utilize toda essa eficiência também para ajudar no pagamento às entidades de saúde do estado. Na semana passada, a Santa Casa de Piumhi, no Centro-Oeste de Minas, fechou seu pronto-atendimento porque não recebe recursos de estado. Nós acionamos a secretaria, a secretaria está em atraso com os pagamentos. E é apenas um exemplo de diversas, centenas, dezenas, centenas de instituições do estado. E saúde se faz com investimentos, com recursos públicos, públicos. Peço e faço esse apelo aqui”.





A primeira parte da CPI investigou o descumprimento na ordem de vacinação contra o coronavírus no estado, envolvendo servidores do Executivo estadual. Na reunião desta quarta, outros requerimentos foram aprovados, inclusive com convites, e a data de uma próxima sessão ainda será divulgada.
 

O que é uma CPI?

As comissões parlamentares de inquérito (CPIs) são instrumentos usados por integrantes do Poder Legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) para investigar fato determinado de grande relevância ligado à vida econômica, social ou legal do país, de um estado ou de um município. Embora tenham poderes de Justiça e uma série de prerrogativas, comitês do tipo não podem estabelecer condenações a pessoas.

Para ser instalado no Senado Federal, uma CPI precisa do aval de, ao menos, 27 senadores; um terço dos 81 parlamentares. Na Câmara dos Deputados, também é preciso aval de ao menos uma terceira parte dos componentes (171 deputados).





Há a possibilidade de criar comissões parlamentares mistas de inquérito (CPMIs), compostas por senadores e deputados. Nesses casos, é preciso obter assinaturas de um terço dos integrantes das duas casas legislativas que compõem o Congresso Nacional.

O que a CPI dos fura-fila investiga?

Criada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) em 11 de março de 2021, a CPI dos fura-fila apura possíveis irregularidades na aplicação de vacinas contra a COVID-19 em servidores da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) que não atuam na linha de frente do setor. A comissão se debruça, ainda, sobre o montante de recursos aplicados pelo governo nas ações de combate à pandemia.

Lista de servidores públicos mineiros que furaram a fila de vacinação 

Na Assembleia de Minas, as CPIs podem funcionar por 120 dias. Posteriormente, é possível prorrogar os trabalhos por mais 60 dias. O presidente é João Vítor Xavier (Cidadania); a relatoria está a cargo de Cássio Soares (PSD).





Saiba como funciona uma CPI

Após a coleta de assinaturas, o pedido de CPI é apresentado ao presidente da respectiva casa Legislativa. O grupo é oficialmente criado após a leitura em sessão plenária do requerimento que justifica a abertura de inquérito. Os integrantes da comissão são definidos levando em consideração a proporcionalidade partidária — as legendas ou blocos parlamentares com mais representantes arrebatam mais assentos. As lideranças de cada agremiação são responsáveis por indicar os componentes.

Na primeira reunião do colegiado, os componentes elegem presidente e vice. Cabe ao presidente a tarefa de escolher o relator da CPI. O ocupante do posto é responsável por conduzir as investigações e apresentar o cronograma de trabalho. Ele precisa escrever o relatório final do inquérito, contendo as conclusões obtidas ao longo dos trabalhos. 

Em determinados casos, o texto pode ter recomendações para evitar que as ilicitudes apuradas não voltem a ocorrer, como projetos de lei. O documento deve ser encaminhado a órgãos como o Ministério Público e a Advocacia-Geral da União (AGE), na esfera federal.





Conforme as investigações avançam, o relator começa a aprimorar a linha de investigação a ser seguida. No Congresso, sub-relatores podem ser designados para agilizar o processo.

As CPIs precisam terminar em prazo pré-fixado, embora possam ser prorrogadas por mais um período, se houver aval de parte dos parlamentares.

O que uma CPI pode fazer?

  • chamar testemunhas para oitivas, com o compromisso de dizer a verdade
  • convocar suspeitos para prestar depoimentos (há direito ao silêncio)
  • executar prisões em caso de flagrante
  • solicitar documentos e informações a órgãos ligados à administração pública
  • convocar autoridades, como ministros de Estado — ou secretários, no caso de CPIs estaduais — para depor
  • Ir a qualquer ponto do país — ou do estado, no caso de CPIs criadas por assembleias legislativas — para audiências e diligências
  • quebrar sigilos fiscais, bancários e de dados se houver fundamentação
  • solicitar a colaboração de servidores de outros poderes
  • elaborar relatório final contendo conclusões obtidas pela investigação e recomendações para evitar novas ocorrências como a apurada
  • pedir buscas e apreensões (exceto a domicílios)
  • solicitar o indiciamento de envolvidos nos casos apurados

O que uma CPI não pode fazer?

Embora tenham poderes de Justiça, as CPIs não podem:

  • julgar ou punir investigados
  • autorizar grampos telefônicos
  • solicitar prisões preventivas ou outras medidas cautelares
  • declarar a indisponibilidade de bens
  • autorizar buscas e apreensões em domicílios
  • impedir que advogados de depoentes compareçam às oitivas e acessem
  • documentos relativos à CPI
  • determinar a apreensão de passaportes

A história das CPIs no Brasil

A primeira Constituição Federal a prever a possibilidade de CPI foi editada em 1934, mas dava tal prerrogativa apenas à Câmara dos Deputados. Treze anos depois, o Senado também passou a poder instaurar investigações. Em 1967, as CPMIs passaram a ser previstas.

Segundo a Câmara dos Deputados, a primeira CPI instalada pelo Legislativo federal brasileiro começou a funcionar em 1935, para investigar as condições de vida dos trabalhadores do campo e das cidades. No Senado, comitê similar foi criado em 1952, quando a preocupação era a situação da indústria de comércio e cimento.





As CPIs ganharam estofo e passaram a ser recorrentes a partir de 1988, quando nova Constituição foi redigida. O texto máximo da nação passou a atribuir poderes de Justiça a grupos investigativos formados por parlamentares.

CPIs famosas no Brasil

1975: CPI do Mobral (Senado) - investigar a atuação do sistema de alfabetização adotado pelo governo militar

1992: CPMI do Esquema PC Farias - culminou no impeachment de Fernando Collor

1993: CPI dos Anões do Orçamento (Câmara) - apurou desvios do Orçamento da União

2000: CPIs do Futebol - (Senado e Câmara, separadamente) - relações entre CBF, clubes e patrocinadores

2001: CPI do Preço do Leite (Assembleia de MG e outros Legislativos estaduais, separadamente) - apurar os valores cobrados pelo produto e as diretrizes para a formulação dos valores

2005: CPMI dos Correios - investigar denúncias de corrupção na empresa estatal

2005: CPMI do Mensalão - apurar possíveis vantagens recebidas por parlamentares para votar a favor de projetos do governo

2006: CPI dos Bingos (Câmara) - apurar o uso de casas de jogo do bicho para crimes como lavagem de dinheiro

2006: CPI dos Sanguessugas (Câmara) - apurou possível desvio de verbas destinadas à Saúde

2015: CPI da Petrobras (Senado) - apurar possível corrupção na estatal de petróleo

2015: Nova CPI do Futebol (Senado) - Investigar a CBF e o comitê organizador da Copa do Mundo de 2014

2019: CPMI das Fake News - disseminação de notícias falsas na disputa eleitoral de 2018

2019: CPI de Brumadinho (Assembleia de MG) - apurar as responsabilidades pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão
 

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