Depois de três horas e 20 minutos de depoimento, o ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel – que sofreu impeachment em abril deste ano –, deixou a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da COVID, instalada pelo Senado, respaldado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).
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Witzel começou seu depoimento afirmando que a situação grave da COVID no Brasil poderia ter sido evitada se houvesse maior diálogo entre governos estaduais e federal. "Nós, governadores, desde o início da pandemia, buscamos seguir as orientações da OMS", falou.
"Pedimos ao presidente da República diversas vezes... É preciso que todas as cartas que os governadores fizeram sejam encaminhadas à CPI. Fizemos várias reuniões suplicando ao presidente para que encontrássemos soluções em conjunto. Como outros países encontraram", disse Witzel
De acordo com o governador, autoridades estaduais e municipais "ficaram totalmente desamparadas".
Witzel disse ainda que o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), foi "frontalmente atacado" nas reuniões com o presidente Bolsonaro. "Está tudo documentado."
Para o ex-governador do Rio, para se livrar das consequências da pandemia, o governo federal criou uma “narrativa" para "fragilizar governadores que tomaram medidas de isolamento social".
"Como é que você tem um país onde o presidente da República não dialoga com governadores? O responsável pelas mortes que estão aí tem nome e precisa ser responsabilizado. Aqui e em tribunal penal internacional", afirmou.
Comparação com Lula
O ex-governador comparou sua condenação à do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "A delação hoje é o pau de arara moderno", comentou Witzel.
"Quem paga o tempo que o governador Witzel foi cassado? O tempo que o presidente Lula esteve preso?", completou.
Durante todo o depoimento, Witzel afirmou ser vítima de perseguição política e que não foi encontrado “nem um centavo em minhas contas”.
“Compraram o impeachment"
Para o ex-governador do Rio, que foi impedido em abril, a ação foi financiada por terceiros.
"Por trás do meu impeachment, estão aqueles que se aliaram a esse discurso de perseguição aos governadores. Só fui o primeiro. Depois de mim, outros foram atingidos por essas investigações rasas e superficiais", disse Witzel.
Caso Marielle
De acordo com Witzel, o processo de impeachment que culminou na saída dele do cargo teve início devido ao andamento das investigações do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSol).
A vereadora e o motorista Anderson pedro Gomes foram assassinados a tiros por disparos de metralhadora 9mm. O sargento reformado da PM Ronie Lessa é acusado de ser o autor dos disparos, e o ex-PM Élcio Queiroz responde por dirigir o carro dos criminosos.
Passados 1.190 dias do caso, ainda não se sabe quem mandou matar Marielle.
Leia: Witzel diz que 'calvário' começou por investigação no caso Marielle
Passados 1.190 dias do caso, ainda não se sabe quem mandou matar Marielle.
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A vereadora estava combatendo a atuação de milicianos de Rio das Pedras. Segundo o ex-governador do Rio, o fim de seu governo teve início com a prisão dos ex-policiais, em março de 2019.
"Tudo isso começou porque mandei investigar, sem parcialidade, o caso Marielle", disse Witzel. "Quantos crimes de responsabilidade este homem (Bolsonaro) vai ter que cometer até que alguém o pare?", continuou Witzel, que chamou o governo Bolsonaro de "chavismo ao contrário".
Segundo o ex-governador, “todo mundo sabe” o “mandante” da morte de Marielle.
As milícias
Witzel também falou sobre as milícias que “comandam” o Rio de Janeiro e sugeriu que está correndo o risco de ser assassinado. "Corro risco. Tenho certeza", afirmou Witzel. "Tenho certeza de que tem milicianos por trás disso".
O ex-governador afirmou também ter vontade de deixar o Brasil.
Discussão com Flávio Bolsonaro
Antigos aliados, o ex-governador do Rio de Janeiro e o senador Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ) bateram boca. A discussão começou após o relator Renan Calheiros (MDL-AL) perguntar a Witzel se ele se sentia incomodado com a presença do filho ‘01’ do presidente, que interrompeu a fala do ex-gestor estadual em vários momentos.
"Não tenho problema com a presença do senador Flávio Bolsonaro. Conheço desde garoto, conheço sua família, sua mãe, a Rogéria Bolsonaro, conheço seu pai de longa data. A minha questão aqui não é pessoal , minha questão é constitucional em defesa da democracia”, respondeu.
O senador carioca então ironizou o comentário do ex-governador: “Que lindo discurso”.
Witzel se irritou com a interrupção de Flávio Bolsonaro e declarou que não é "porteiro'' para ser intimidado. “Se o senhor fosse um pouquinho mais educado e menos mimado, o senhor teria respeito pelo que estou falando. O senhor me respeite”, disse para o filho do chefe do Executivo federal.
Flávio se defendeu dizendo que só interrompeu Wilson Witzel porque ele e sua família foram citados, e o senador petista Rogério Carvalho ressaltou: "Aqui o senhor é senador, não filho do presidente".
Bate-boca com Jorginho Mello
O ex-governador também discutiu com o senador Jorginho Mello (PL-SC), que criticou o posicionamento do político fluminense e afirmou que ele é uma "vergonha" para o Brasil.
Durante os questionamentos, Jorginho afirmou que Witzel foi uma “negação” como juiz.
“Envergonhou a Justiça brasileira. Imagino só a amargura dos que você meteu a ‘caneta’. Saiu do cargo de juiz para virar governador e, na primeira oportunidade, fez uma lambança”, disse.
Segundo Jorginho, o ex-governador finge ser um “santo”: "O senhor diz que é um santo, mas é uma vergonha para a magistratura".
“Essa é uma afirmação leviana”, respondeu Witzel. “Leviano é o senhor que foi cassado”, rebateu o parlamentar.
“A sua afirmação foi leviana”, disse mais uma vez o ex-governador. “O senhor vem aqui bancar de moço. Foi cassado por unanimidade”, pontuou o senador. “Por um tribunal parcial”, respondeu Witzel.
Em seguida, Witzel disse que “lamentavelmente”, para "decepção" de Jorginho, ele não foi uma vergonha para o Judiciário.
Abandono do depoimento
Respaldado por uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), Wilson Witzel encerrou sua participação na CPI da COVID.
A decisão foi tomada em meio a um questionamento do senador Eduardo Girão (Podemos-CE) sobre gastos públicos com respiradores.
Leia: CPI da COVID: apoiado por decisão do STF, Wilson Witzel abandona depoimento
A decisão foi tomada em meio a um questionamento do senador Eduardo Girão (Podemos-CE) sobre gastos públicos com respiradores.
Leia: CPI da COVID: apoiado por decisão do STF, Wilson Witzel abandona depoimento
“Senador Girão, o depoente vai se retirar. Ele está embasado, determino. A comissão foi notificada da decisão do ministro Nunes Marques do habeas corpus número 203/227, impetrado em favor do depoente Wilson Witzel, com o seguinte dispositivo: defira o pedido de habeas corpus para dispensar o paciente caso queira de comparecer perante à CPI da Pandemia e, em caso de opção pelo comparecimento, garantir o direito ao silêncio ao não assumir o compromisso de falar a verdade em razão de condição de investigado e não de testemunha. E ele acabou de me comunicar que quer se retirar da sessão, e a gente não pode fazer absolutamente nada”, afirmou o senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI.
Na sequência, ao deixar a comissão, Witzel disse: “Agradeço a oportunidade, senhor presidente, agradeço as perguntas e tenho certeza que muito temos a contribuir futuramente. Muito obrigado”.
Com o habeas corpus, Witzel poderia não comparecer ou até permanecer em silêncio quando considerasse oportuno na CPI.
A decisão frustrou os senadores, que tinham até as 16h desta quarta-feira para tomar o depoimento do investigado.
Conforme informado durante o depoimento, uma nova oitiva, mas de forma reservada, será articulada para que Witzel aborde temas que correm em segredo de Justiça.
Conforme informado durante o depoimento, uma nova oitiva, mas de forma reservada, será articulada para que Witzel aborde temas que correm em segredo de Justiça.
Entenda
A presença de Witzel atendeu a requerimentos dos senadores Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da CPI, e Alessandro Vieira (Cidadania-SE), membro titular.
O ex-governador foi retirado do cargo após suspeitas de desvios nas verbas públicas destinada à saúde – antes de sofrer impeachment, em abril deste ano, ele foi afastado do cargo em agosto de 2020.
Witzel foi a 18ª pessoa ouvida pela CPI. A comissão apura possíveis ações e omissões do governo federal no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus e repasses de verbas a estados e municípios.
Ela foi instalada em 27 de abril deste ano. Nesta quinta-feira (17), a expectativa é de que o empresário Carlos Wizard preste depoimento.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Kelen Cristina
Ela foi instalada em 27 de abril deste ano. Nesta quinta-feira (17), a expectativa é de que o empresário Carlos Wizard preste depoimento.
*Estagiária sob supervisão da subeditora Kelen Cristina