Jornal Estado de Minas

PROJETO COMPROVA

Vídeo que mostra governador da Bahia dançando forró é de antes da pandemia

Postagem tira de contexto imagens de um evento realizado em maio de 2018, com participação de Rui Costa (PT), governador da Bahia, e dos senadores Otto Alencar (PSD) e Jaques Wagner (PT), para atacar os políticos e as medidas de prevenção contra a COVID-19.




 
 

Conteúdo verificado

Um vídeo do governador da Bahia, Rui Costa (PT), dançando forró no interior do estado, voltou a circular nos últimos dias em páginas bolsonaristas como se fosse de um evento em um final de semana recente, durante a pandemia. Os autores das publicações afirmam que “a turma do fique em casa e da CPI da cloroquina” estava sem máscara em um forró em um final de semana na Bahia, citando também os senadores Otto Alencar (PSD) e Jaques Wagner (PT).

As imagens, no entanto, são antigas. O vídeo foi gravado na cidade de Lapão, no centro-norte do estado, no dia 11 de maio de 2018. O episódio ocorreu durante uma série de entregas de obras feitas pelo governo no município, que fica a cerca de 500 quilômetros de Salvador. As informações foram prestadas pela assessoria do governador e confirmadas pelo Comprova.

Não é correto, portanto, associar o vídeo antigo a um suposto descumprimento de medidas como distanciamento social e uso de máscaras, eficazes em reduzir o risco de contágio pelo novo coronavírus. O Comprova entrou em contato com a página de Instagram @bolsonaroparana2022 nesta quinta-feira, 17 de junho, mas não teve retorno até a publicação desta checagem.





Como verificamos?

O Comprova fez essa verificação por meio de buscas a notícias, fontes oficiais e outras informações. Ao pesquisar os principais termos no Google, a reportagem chegou até uma nota do Governo da Bahia, que classifica o conteúdo como “fake news”.

Por meio de mensagens de texto, a assessoria do governador Rui Costa esclareceu que o vídeo foi gravado em um evento na cidade de Lapão, na região de Irecê, em 11 de maio de 2018.

Apesar de não ter obtido o conteúdo original com a assessoria, o Comprova checou a informação em um banco de fotos que mostra Rui Costa, Otto Alencar e Jaques Wagner com as mesmas roupas em atos públicos na cidade. Os registros estão disponíveis na conta oficial do governador no Facebook e confirmam que o vídeo é antigo e foi tirado de contexto.

Além disso, as buscas também retornaram um vídeo postado cinco dias depois do evento pelo perfil “Irecê BA minha cidade” no YouTube, além de uma nota publicada pelo Jornal Grande Bahia mostrando que o mesmo vídeo já tinha sido tirado de contexto para atacar o governador naquele ano.





Verificação

Em 15 de junho, o governo do Estado da Bahia publicou uma nota sobre o vídeo no site Bahia Contra o Fake. “É completamente falsa a informação que o governador Rui Costa dançou forró e aglomerou em plena pandemia em Irecê, no interior da Bahia”, diz o texto. “Um vídeo gravado em maio de 2018, portanto antes da covid-19, mostra Rui Costa dançando ao lado do senador Otto Alencar e de outras lideranças políticas e moradores da região.”

O Comprova entrou em contato com a assessoria de comunicação do governo do estado, que prestou novas informações. Segundo a equipe, o vídeo foi feito no dia 11 de maio de 2018, durante uma série de entregas na cidade de Lapão, na região do Irecê e centro-norte da Bahia. O vídeo não foi postado pela assessoria, que não tinha o conteúdo original para envio.

A reportagem então checou a informação em um álbum na conta oficial do governador no Facebook, que mostra imagens daquele mesmo dia, registradas pelo fotógrafo Mateus Pereira. Embora o vídeo não tenha sido postado, as fotos mostram Rui Costa e os senadores Otto Alencar e Jaques Wagner com as mesmas roupas que aparecem nas imagens do forró.





O governador usa a mesma camisa azul clara e listrada, calça cinza escuro e o boné com a palavra “Sertão”. Os senadores Otto Alencar e Jaques Wagner também aparecem nas imagens com camisas azul e branca, respectivamente.


Além disso, o mesmo vídeo já tinha circulado em grupos de WhatsApp no final de maio de 2018, como mostra uma nota do Jornal Grande Bahia. Naquela época, o vídeo era compartilhado junto a uma mensagem que dizia que Costa, Alencar e Wagner estariam gastando dinheiro “em um forró na chácara de um lobista” enquanto os caminhoneiros estavam em greve, paralisando as rodovias pelo país.

Em ambas as situações, o vídeo foi tirado de contexto. Em 11 de maio de 2018, quando foi gravado, a greve dos caminhoneiros ainda não tinha sido deflagrada, o que só aconteceu no dia 18 daquele mês. Da mesma forma, não havia razão para que as pessoas usassem máscara no vídeo em 2018, já que ainda não havia uma pandemia.





O Comprova ainda constatou que o vídeo circula, pelo menos, desde o dia 16 de maio de 2018 na internet. Ele foi postado pelo canal “Irecê BA minha cidade” no YouTube, com o título “Rui Costa governador da Bahia cantando forró em Irecê”. O primeiro caso de covid-19 no Brasil foi registrado apenas em 26 de fevereiro de 2020, mais de um ano e meio depois.

Nesta quarta-feira (16), Rui Costa comentou o assunto no programa “Papo Correria”, no YouTube, em que responde a perguntas de internautas. “Tem gente infelizmente espalhando fake news que continua até hoje”, comenta o governador, a partir dos 42 minutos de gravação. “Eu vi imagem de uma visita que eu fiz há dois ou três anos numa cidade do interior, nessa época de festas juninas, que alguém colocou música e a gente brincou de dançar. É de 2018. Tá ali o Otto Alencar, o nosso senador, cantando. E essas pessoas espalham esse vídeo. Infelizmente, eles não cansam.”

Na nota publicada no dia 15, o governo da Bahia acrescenta que “os responsáveis pela fake news serão denunciados e responsabilizados judicialmente pela disseminação das informações falsas na internet”.





Por que investigamos?

Em sua quarta fase, o Comprova verifica conteúdos suspeitos sobre pandemia e políticas públicas que tenham obtido grande alcance nas redes sociais. O conteúdo verificado teve mais de 2,7 mil visualizações no Instagram até a manhã desta sexta-feira (18).

A checagem se justifica pelo fato de que esse tipo de postagem confunde a população a respeito da necessidade de medidas de prevenção contra a covid-19, como o distanciamento social e o uso de máscaras, ao duvidar do seu cumprimento por figuras públicas que deveriam dar o exemplo.

Além disso, a peça de desinformação ganhou tração nas redes em virtude de uma disputa política do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) contra governadores e prefeitos e, mais recentemente, contra membros da CPI da Covid no Senado, que apura ações e omissões do governo federal durante a pandemia.





Bolsonaro é contrário ao fechamento de estabelecimentos comerciais e restrição de circulação de pessoas, o que o coloca em rota de colisão desde o ano passado com gestores regionais que adotam temporariamente esse tipo de medida para frear a disseminação do vírus.

Em março deste ano, por exemplo, Bolsonaro acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) para derrubar decretos na Bahia, no Rio Grande do Sul e no Distrito Federal que determinaram a restrição de circulação de pessoas. Na época, Rui Costa chamou o presidente de “principal aliado do vírus no Brasil”.

Já Otto Alencar se tornou alvo do presidente e de seus apoiadores por sua postura na CPI da Covid, da qual é membro efetivo. O senador já criticou o governo federal diversas vezes na comissão parlamentar de inquérito e considera que Bolsonaro teve conduta criminosa na pandemia ao “apostar na tese de imunidade de rebanho” para superar a crise. Ele também ficou marcado por um episódio em que critica a médica Nise Yamaguchi, defensora da cloroquina e conselheira informal do presidente.





A postagem ainda chama a atenção por conter uma tática comum de desinformação nas redes, que é utilizar um conteúdo antigo como se fosse atual, de modo a estabelecer uma crítica incoerente. O Comprova já verificou casos semelhantes antes, como uma foto do governador paulista,João Doria, sem máscara, recebendo uma vacina contra a gripe. O registro é de março de 2020, quando o equipamento ainda não era obrigatório em São Paulo.

O post também foi checado pela Agência Lupa e o Fato ou Fake, do G1. Ambos concluíram que se trata de uma informação falsa.

Enganoso, para o Comprova, é o conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações.

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