Os integrantes da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Fura-Filas da Vacinação, conduzida pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), aprovaram o relatório da investigação nesta quinta-feira (8/7). O texto sugere o indiciamento do ex-secretário de Estado de Saúde Carlos Eduardo Amaral pelos crimes de peculato e improbidade administrativa. A recomendação será encaminhada ao Ministério Público.
O documento aprovado pelos deputados estaduais mineiros pede, pelas mesmas ilicitudes, o indiciamento de Luiz Marcelo Cabral Tavares, ex-secretário-adjunto de Saúde, e de João Pinho, que chefiou o gabinete da pasta. Na lista, ainda, a subsecretária de Vigilância em Saúde, Janaína Passos de Paula.
As considerações do relator da CPI, Cássio Soares (PSD), foram aprovadas por todos os parlamentares que participaram da apuração.
Leia Mais
CPI dos 'fura-filas': relatório pede indiciamento de ex-secretário de SaúdeALMG: CPI dos 'fura-filas' da vacina apresenta relatório nesta quinta-feiraCPI dos Fura-filas: gastos do governo de Minas em saúde são questionadosImprobidade: MP move ação contra ex-secretário e servidores da Saúde de MG'Fura-filas': após CPI pedir indiciamentos, MPMG pode fazer denúnciaO comitê foi instaurado pela Assembleia em março, para apurar irregularidades na aplicação de injeções antiCOVID-19 em servidores administrativos da pasta de Saúde. O Parlamento chegou a receber listas com nomes de funcionários públicos cuja imunização estava sob suspeita.
Em uma espécie de segunda etapa, os deputados estaduais examinaram os gastos do governo de Romeu Zema (Novo) para conter a pandemia de COVID-19. O relatório aponta que o poder Executivo não cumpriu os 12% de investimentos em saúde exigidos pela Constituição Federal – aplicando, na verdade, 10,75% das receitas. (Leia mais sobre isso ainda neste texto)
'Estrutura paralela'
Segundo Cássio Soares, foi montada uma “estrutura paralela” para viabilizar a vacinação de pessoas não constavam nas prioridades do Plano Nacional de Operacionalização da Imunização (PNO), Carlos Amaral teve o “auxílio material e intelectual” de Cabral Tavares, João Pinho e Janaína Passos.
“Eles foram responsáveis pela redação dos atos administrativos que organizaram a vacinação contra a COVID-19, pela sua divulgação e pela implementação material da vacinação. Eles também foram responsáveis pela indicação de servidores que deveriam ser vacinados e que não estavam no regime prioritário estabelecido pelo PNO”, sustenta o relator no parecer.
Carlos Amaral foi vacinado contra a COVID-19 em fevereiro. Ao depor, disse aos deputados que se imunizou para dar "bom exemplo" a subordinados.
A CPI revelou, no entanto, que o médico foi agraciado com a dose inicial antes de trabalhadores que corriam maior risco sanitário.
"Se alguém imaginava que a CPI na Assembleia terminaria em pizza, como é costume no Brasil, não acabou. Jamais permitiriamos isso, porque estamos falando de um dos casos mais vergonhosos da história recente de Minas Gerais", afirmou o presidente da CPI, João Vítor Xavier (Cidadania).
Gastos em saúde
Ao tratar dos investimentos do governo mineiro em saúde, o relatório da CPI aponta que a SES-MG "deixou de administrar adequadamente os recursos orçamentários e financeiros destinados à saúde".
As recomendações são para que o poder Executivo mineiro torne mais transparente o processo de divulgação do cumprimento do índice. A ideia é que o Palácio Tiradentes divulgue com clareza os valores que compõem o indicador, principalmente por causa dos restos a pagar, que não configuram investimentos empenhados.
Durante a coleta de depoimentos, a Associação Mineira de Municípios (AMM) informou que a dívida do estado com as prefeituras por causa de ações em saúde pode chegar a R$ 6,8 bilhões.
As conclusões sobre os gastos em saúde também serão encaminhadas ao deputado que ficar responsável por emitir parecer sobre as contas do governo em 2020. O Legislativo analisa, anualmente, os extratos do Executivo – sempre após o Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG) publicar análise prévia.
Governistas tentam mudar relatório, mas não conseguem
Os deputados Roberto Andrade (Avante) e Zé Guilherme (PP), que compõem a base aliada a Zema, propuseram que Janaína Passos não tivesse o indiciamento recomendado. A emenda não foi acatada.
A subsecretária é a única dos quatro cujo indiciamento foi pedido que não está afastada. Os deputados alegaram que Janaína não teve má-fe e agiu para cumprir ordens de superiores ao participar da construção dos ofícios para basear a vacinação na SES.
Em nota enviada à imprensa, o governo mineiro afirmou que colabora com as investigações em torno do caso dos fura-filas e que "permanece à disposição dos deputados e autoridades" para novos esclarecimentos.
Carlos Amaral e Cabral Tavares, em posicionamento conjunto, garantiram que o processo de imunização interna na pasta de Saúde foi baseado em normativas legais. "O relatório é atribuição e responsabilidade dos membros da CPI. Ele contém a visão política do processo. De nossa parte, reiteramos o que já dissemos: seguiu-se toda a legislação e o Programa Nacional de Imunizações", lê-se em trecho do texto.
Histórico
Para a obtenção das conclusões sobre a primeira parte da apuração, que tratou do caso dos “fura-filas”, a CPI promoveu 16 reuniões, uma visita à Central de Rede de Frios, onde imunizantes são armazenados quando chegam a Minas Gerais, e uma diligência ao gabinete de Fábio Baccheretti, que assumiu o posto na vaga de Carlos Amaral.
A ida à Cidade Administrativa foi motivada pela busca por um documento que, supostamente, autorizava a aplicação, nos servidores administrativos da Saúde, de doses da reserva técnica — contingente utilizado para substituir ampolas perdidas por extravio ou acondicionamento ruim. À época, os deputados verificaram a inexistência de normativa sobre o tema.