Jornal Estado de Minas

CPI DA COVID

"A CPI abriu a caixa de pandora", diz Randolfe após vídeo de Pazuello

Quando estava à frente do Ministério da Saúde, o general Eduardo Pazuello se comprometeu a assinar contrato para a compra de 30 milhões de doses da vacina chinesa CoronaVac, do laboratório Sinovac, oferecidas por intermediadores por quase o triplo do valor negociado com o Instituto Butantan. O imunizante já foi menosprezado seguidas vezes pelo presidente Jair Bolsonaro, na briga política com o governador de São Paulo, João Doria (PSDB). O chefe do Planalto chegou a afirmar, no ano passado, que a “vacina chinesa de João Doria” não seria adquirida pelo governo federal.



A negociação de Pazuello com os intermediadores foi revelada pela Folha de S. Paulo, que divulgou um vídeo da reunião, ocorrida em 11 de março. A comitiva, liderada por um empresário apresentado como John, ofertava o imunizante a US$ 28 por dose, quase três vezes o valor da CoronaVac do Butantan (US$ 10). Segundo a publicação, o intermediador representaria uma empresa chamada World Brands, de Santa Catarina.

“Estamos aqui reunidos no Ministério da Saúde recebendo uma comitiva enviada pelo John. Uma comitiva que veio tratar da possibilidade de nós comprarmos 30 milhões de doses, numa compra direta com o governo chinês, e já abre também uma nova possibilidade de termos mais doses”, diz Pazuello no vídeo. “Já saímos daqui, hoje, com o memorando de entendimento assinado e com o compromisso do ministério de celebrar, no mais curto prazo, um contrato para podermos receber essas (sic) 30 milhões de doses no mais curto prazo possível.”



O vídeo desmente o próprio depoimento de Pazuello à CPI da Covid em 19 de maio. Na comissão, ao ser questionado pelo relator Renan Calheiros (MDB-AL) sobre o motivo de não ter liderado a negociação com a Pfizer para a compra de vacina, alegou que um ministro “jamais deve receber uma empresa” e ainda alfinetou o senador. “Eu sou o dirigente máximo, sou o decisor, não posso negociar com empresa. Quem negocia com empresa é o nível administrativo. O ministro jamais deve receber uma empresa, o senhor deveria saber disso”, reprovou.



A reunião com os empresários, fora da agenda do ministro, ocorreu no gabinete do então secretário-executivo da pasta, coronel Elcio Franco. No vídeo, o empresário que se apresenta como porta-voz do grupo agradeceu. “Muito obrigado, ministro, pela oportunidade de nos receber também. Como empresário, eu acho que sempre nós pensamos no trabalho, mas na contribuição social que podemos oferecer hoje”, afirmou. “E junto, em parceria com tanta porta aberta que o ministro nos propôs, eu acredito que podemos fazer essa parceria por um longo e duradouro tempo, para vários outros produtos, inclusive, se necessário.”

O negócio só não teria ido para a frente porque, com a segunda onda de mortes pela covid-19 e a crise de oxigênio em hospitais de Manaus, a presença de Pazuello à frente da pasta se tornou insustentável e ele acabou exonerado.

Apesar da grave crise sanitária, o governo atrasou a negociação de vacinas com diversos fornecedores, entre os quais, o Butantan. Em outubro do ano passado, Pazuello chegou a anunciar a compra de 46 milhões de doses do instituto paulista, mas o ministério recuou após Bolsonaro afirmar que o imunizante não seria adquirido. O Executivo também ignorou diversas ofertas da Pfizer e só assinou contrato com a empresa em 8 de março, em meio a muita pressão, inclusive do Congresso.



Pazuello se defende

Em nota, ontem à noite, Pazuello afirmou que, enquanto esteve na função, “em momento algum” negociou aquisição de vacina com empresários. Ele disse que encontrou os representantes da World Brands após um pedido formal de reunião feito pela empresa ao ministério. Segundo o general, “diante da importância da temática”, ordenou que a Secretaria-Executiva fizesse uma sondagem prévia acerca da proposta de vacinas.

Pazuello sustentou não ter participado do encontro e que só conversou com os representantes comerciais depois da reunião de outros funcionários do Ministério da Saúde com os integrantes da World Brands.

A ideia do vídeo, segundo ele, partiu da Assessoria de Comunicação do Ministério da Saúde, que sugeriu a gravação “de um pequeno vídeo de memória para posterior publicização dos atos e fatos da administração pública”.

O general destacou, na nota, que desistiu de elaborar o memorando e de divulgar o vídeo porque foi alertado de inconsistências na oferta da World Brands. “Após a gravação, os empresários se despediram e, ato contínuo, fui informado de que a proposta era completamente inidônea e não fidedigna. Imediatamente, determinei que não fosse elaborado o citado memorando de entendimentos (MoU), assim como que não fosse divulgado o vídeo realizado”, escreveu.

“No caso em questão, não foram localizados no Ministério da Saúde qualquer MoU, carta de intenções ou processo de aquisição das vacinas ofertadas pela empresa World Brands”, ressaltou o ex-ministro. “Reitera-se que nunca houve resistência do Ministério da Saúde quanto à negociação de quaisquer vacinas, desde que houvesse o mínimo de plausibilidade fática e juridicidade da proposta”, acrescentou.



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