Reportagens baseadas em um megavazamento de informações sobre empresas offshore começaram a ser publicadas neste domingo (3/10) por veículos que fazem parte do Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos (ICIJ). No Brasil, participam do grupo a revista Piauí, a Agência Pública e os portais Metrópoles e Poder 360.
As reportagens revelaram, até agora, que
empresários brasileiros e políticos como o ministro da Economia, Paulo Guedes
, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, são sócios de offshores localizadas em paraísos fiscais. Mas qual é a origem desse mega-vazamento?
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Pandora Papers: a caixa dos segredos escusos das empresas offshore
A origem do vazamento do Pandora Papers não foi revelada pelo ICIJ. A entidade é uma organização sem fins lucrativos baseada em Washington-DC, nos Estados Unidos, e reúne jornalistas de centenas de países. O que se sabe até agora é que os dados chegaram à entidade há mais de um ano e, desde então, profissionais ligados ao grupo trabalharam na estruturação dos dados para que eles pudessem ser analisados. Essa fase demorou, em parte, porque os documentos estavam em diversos idiomas e em formatos que dificultavam a análise.
Segundo o consórcio, o vazamento envolveu 11,9 milhões de arquivos entre documentos, e-mails, planilhas e outros tipos de dados. No Panamá Papers, de 2017, foram 11,5 milhões de arquivos.
A principal diferença entre o Pandora Papers e outros megavazamentos de dados de offshores é a quantidade de fontes responsáveis pelas informações. Para abrir uma offshore, normalmente, os interessados procuram empresas especializadas nesse serviço. No caso do Panamá Papers , por exemplo, os dados vazados tinham como origem apenas um escritório, o agora extinto Mossack Fonseca. As informações do Pandora Papers são oriundas de 14 fontes diferentes.
Empresas offshore são um mecanismo antigo usado por pessoas físicas ou jurídicas do mundo inteiro. Elas podem ser utilizadas para os mais diversos fins: investimentos, compra de bens, entre outros. Especialistas em finanças, porém, alertam que esse tipo de empresa também é usada para ocultar recursos de origem ilícita como tráfico de drogas e corrupção, ou simplesmente evitar a cobrança de impostos nos países onde os seus beneficiários efetivamente atuam.
Como a maior parte delas é aberta em países conhecidos como "paraísos fiscais", o monitoramento desses ativos é considerado fraco. Informações sobre quem são os donos e os valores mantidos nesse tipo de empresa, quase sempre, só vêm à tona por meio de vazamentos como o que deu origem a outros projetos como o Panamá Papers e o Paradise Papers, também conduzidos pelo ICIJ.
O que o Brasil tem a ver com isso?
Segundo reportagem do portal Metrópoles, que integra do ICIJ, o Brasil é o quinto país com o maior número de pessoas citadas no Pandora Papers. Entre eles estão sócios ou donos de de algumas das maiores empresas do Brasil. Na lista também há políticos como ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Também foram identificados empresários investigados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em inquéritos que apuram a disseminação de notícias falsas.
No Brasil, ter uma empresa offshore não é crime, desde que seu saldo seja declarado à Receita Federal. Entretanto, de acordo com o Código de Conduta da Alta Administração Federal, funcionários públicos do alto escalão não podem manter investimentos no Brasil ou no exterior que possam ser afetados por decisões que eles venham a tomar em seus cargos. A vedação é para evitar conflitos de interesse.
Guedes e Campos Neto fazem parte do Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão responsável por emitir resoluções sobre temas relacionados a ativos mantidos no exterior. Além disso, os dois têm acesso a informações sensíveis relacionadas a flutuações nas taxas de câmbio e variação nas taxas de juros.
De acordo com reportagens do consórcio, Paulo Guedes aparece como dono de uma empresa offshore nas Ilhas Virgens Britânicas, um conhecido paraíso fiscal. Segundo uma reportagem publicada pela revista Piauí (que também integra o grupo), em 2014, a empresa de Paulo Guedes tinha um saldo de US$ 8 milhões. Em janeiro de 2019, quando ele assumiu o cargo de ministro da Economia, a empresa tinha um saldo de US$ 9,5 milhões.
Em nota enviada à BBC News Brasil, a assessoria de Paulo Guedes afirma que as atividades privadas dele anteriores à sua posse como ministro foram informadas aos órgãos competentes.
"Toda a atuação privada do ministro Paulo Guedes, anterior à investidura no cargo de ministro, foi devidamente declarada à Receita Federal, Comissão de Ética Pública e aos demais órgãos competentes, o que inclui a sua participação societária na empresa mencionada", diz trecho da nota enviada.
A nota disse ainda que a atuação de Guedes "sempre respeitou a legislação aplicável e se pautou pela ética e pela responsabilidade".
Já o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, é, segundo a mesma reportagem, é dono de quatro empresas offshore em paraísos fiscais como o Panamá e as Ilhas Virgens Britânicas. Uma delas chegou a ser fechada em 2020, quando ele já estava no comando do órgão.
A assessoria de imprensa de Campos Neto enviou nota à BBC News Brasil afirmando que todo o seu patrimônio, no país e no exterior, foi declarado à Comissão de Ética Pública da Presidência da República, Receita Federal e ao Banco Central.
A nota diz ainda que Campos Neto não fez nenhuma remessa de recursos ao exterior depois de assumir o Banco Central e que, desde então, não faz parte da gestão das suas empresas.
Pandora Papers no exterior
Não foi apenas no Brasil que o Pandora Papers identificou políticos como proprietários ou beneficiários de empresas offshore. De acordo com o consórcio, ao todo, 35 líderes o ex-líderes de países em todo o mundo e outros 300 agentes públicos aparecem nos documentos vazados .
Entre as outras revelações feitas pelo consórcio estão informações sobre o uso de empresas offshore pelo ex-primeiro ministro britânico Tony Blair para a compra de um escritório em Londres e a fortuna avaliada em US$ 94 milhões do rei Abdullah Il bin Al-Hussein, da Jordânia, em propriedades nos Estados Unidos e no Reino Unido.
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