Nesta quinta-feira (7/10), a representante legal da Kroll no Brasil, Fernanda Barroso Carneiro, foi à Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) prestar depoimento à CPI. Em setembro, deputados tomaram conhecimento que, no fim do ano passado, investigadores da empresa de auditoria estiveram na sede da Cemig durante uma noite, para coletar dados de pessoas que davam expediente no setor jurídico.
A apuração no setor de compras começou após determinação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), que recebeu denúncias sobre supostas ilicitudes. Segundo Fernanda, investigações forenses precisam de informações que podem estar em posse de pessoas que não são investigadas - os chamados custodiantes. De acordo com ela, após a retirada dos dados das máquinas funcionais, foram vistoriados apenas arquivos referentes ao tema em análise.
"Não existe interesse de investigar informações pessoais de custodiantes e investigados, ou dados sensíveis, se não estão diretamente relacionados ao objeto de investigação", disse. A representante da Kroll afirmou que o Ministério Público enviou lista contendo "boa parte" dos custodiantes que deveriam ter suas estações de trabalho.
A resposta não satisfez a deputada Beatriz Cerqueira (PT). "De acordo com documentos enviados à CPI, nenhum trabalhador do jurídico estava nas denúncias do Ministério Público. Nem era investigado nem custodiante", indignou-se.
A busca por arquivos em estações de trabalho também despertou dúvidas de Professor Cleiton, do PSB, vice-presidente e sub-relator da CPI. "A empresa que estamos discutindo é pública. Quando o estado paga uma empresa para coletar dados, espionar, o estado está pagando para devassar a vida de agentes públicos", opinou ele.
O pessebista chegou a comparar a situação envolvendo Kroll e Cemig ao caso Watergate, escândalo ocorrido nos Estados Unidos nos anos 1970. À época, homens invadiram o escritório do Partido Democrata no Edifício Watergate, em Washington. A investigação motivou a renúncia do republicano Richard Nixon, presidente do país.
Ao tratar da cópia dos dados de estações de trabalho, o relator da CPI, Sávio Souza Cruz (MDB), utilizou o termo "interceptação". Em resposta, Fernanda defendeu a legalidade da ação e disse não se tratar do ato de interceptar informações.
"Pegou (dados), mas não é interceptação", protestou o emedebista, em tom irônico.
Mais interrogações
O escopo da apuração conduzida pela Kroll traz outras incertezas aos deputados. Para Beatriz Cerqueira, a Kroll está investigando situações que vão além da denúncia de supostas irregularidades no setor de compras. Ela se apoiou em documento enviado pela Cemig à CPI - segundo o texto, a empresa pode atuar na "identificação de outros procedimentos que sejam de interesse da companhia".
"Isso nos preocupa. A justificativa para a contratação da Kroll, o tempo inteiro, é a suposta prática de corrupção. Portanto, a importância da investigação independente, porque a Cemig presta contas a agentes internacionais. A Kroll está fazendo mais do que disse", falou a petista.
Um dos casos antigos citados diz respeito à Lista de Furnas, documento que apontou, em 2005, o nome de mais de uma centena de políticos beneficiados com desvios de recursos de Furnas. Fernanda Barroso negou que a Kroll esteja trabalhando em prol da Cemig no caso.
O governista Zé Guilherme (PP) lembrou que o Ministério Público chegou a ser procurado pelo Federal Bureau of Investigation (FBI), órgão policial estadunidense. Ele citou os antecedentes que motivaram a contratação da Kroll.
Em nota, a Cemig afirmou que a Kroll, por promover trabalho independente, "tem autorização para captar informações em equipamentos que pertencem à companhia", como computadores e celulares corporativos.
(Leia na íntegra o comunicado da estatal ao fim deste texto)
Inspeção antes de contrato assinado
O ex-gerente de direito administrativo da Cemig, Daniel Polignano, foi um dos que teve seu equipamento profissional examinado pela equipe da Kroll. O escrutínio, feito em dezembro do ano passado, ocorreu antes mesmo de o contrato entre a multinacional de investigação forense e a estatal energética ter sido assinado .
O trato foi oficializado em maio deste ano. Para isso, a Cemig recorreu à convalidação, instrumento que permite a assinatura de acordos retroativos. A denúncia do Ministério Público sobre possíveis ilicitudes no setor de compras da Cemig gerou o afastamento de algumas pessoas que batiam ponto na área.
A Kroll, por seu turno, já havia estado no centro da CPI em ocasiões anteriores. Em agosto, Professor Cleiton levantou suspeitas sobre suposta espionagem de deputados que compõem a CPI sobre a energética. Ele, que relatou ter tido o celular grampeado, chegou a solicitar exame do contrato entre a estatal e a Kroll, a fim de detectar possíveis conexões entre a auditora e a dita observação.
Nota da Cemig sobre a investigação conduzida pela Kroll
"A Cemig esclarece que a Kroll foi contratada após a Companhia ter sido comunicada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MPMG) de apurações sobre a conduta dos então gestores da área de compras em supostos casos de corrupção. Esses gestores foram afastados para apuração das denúncias. Como informado no depoimento desta quinta-feira (7/10), as investigações ocorrem exclusivamente a partir de ofícios do MPMG recebidos pela Cemig sobre corrupção na área de compras.
Como empresa de investigação forense independente, a Kroll tem autorização para captar informações em equipamentos que pertencem à Companhia. Isso foi feito em computadores e celulares corporativos utilizados por investigados e custodiantes. Custodiantes são aqueles que, em razão de sua atuação profissional, podem ter armazenadas informações de interesse das investigações.
Em razão da gravidade das denúncias e da urgência do início de uma investigação independente, foi solicitada à Kroll a apresentação de proposta, que depois de aceita pela Cemig permitiu à empresa de investigação o início da prestação dos serviços."