Os deputados estaduais que compõem a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) aprovaram, nesta quarta-feira (13/10), a intimação do presidente da estatal, Reynaldo Passanezi Filho. Ele, que assumiu o comando da companhia em janeiro do ano passado, prestará depoimento na condição de investigado.
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Os elementos colhidos pela CPI mostram que o primeiro contato entre a Exec e a Cemig foi intermediado por Evandro Negrão de Lima Júnior, dirigente do diretório do Novo em Minas Gerais. O partido abriga o governador Romeu Zema. Ele recebeu a primeira proposta da empresa sobre o serviço de recrutamento que a energética desejava.
Quem esteve presente no interrogatório de Ciríaco foi Professor Cleiton (PSB), vice-presidente e sub-relator da comissão. De acordo com ele, o delegado contou aos parlamentares que, em seu depoimento à Polícia Civil, Belini relatou descontentamento com o desenrolar do processo de sucessão
"(Segundo o delegado), Belini se mostrou muito insatisfeito com o que estava acontecendo. Inclusive, ele não participa em nenhum momento da contratação da Exec para que fosse contratado o Reynaldo", disse o deputado, ao contar o que ouviu do policial.
Ciríaco apontou aos deputados que, segundo a narrativa de Belini, as contratações da Exec e de Reynaldo Passanezi ocorreram após solicitação de Cássio Azevedo, ex-componente do secretariado de Zema, que morreu neste ano de um câncer. Segundo contou o delegado, o ex-presidente relatou que Azevedo foi o responsável por entrar em contato com Evandro Negrão, do Novo.
O depoimento de hoje, na visão de Professor Cleiton, fez ganhar corpo a tese de que o processo de escolha de Passanezi foi permeado por "conflito de interesses" e "usurpação da função pública".
Cledorvino Belini também terá que prestar depoimento à CPI, mas sob a condição de testemunha. Eduardo Soares, diretor jurídico, é outro nome adicionado à lista de depoentes.
Por causa da quebra do sigilo das informações concedidas por Gabriel Ciríaco, a reportagem pediu à Assembleia Legislativa acesso à transcrição dos diálogos ocorridos durante o interrogatório. O Parlamento, no entanto, informou que a íntegra das conversas só estará disponível em alguns dias. Ao contrário do que é praxe, não houve gravação do encontro – em virtude, justamente, do segredo prévio imposto ao depoimento.
Na visão do governista Roberto Andrade (Avante), o delegado levou à CPI "fragmentos" de sua investigação e, também, opiniões pessoais. "São fragmentos do inquérito policial que ele estava fazendo. Se você pegar parte do inquérito policial e parte do depoimento, fica muito difícil ter qualquer conclusão. Temos que ter todo esse inquérito para fazer uma avaliação", opinou.
O depoimento de hoje era tido por integrantes da CPI como essencial para avançar na busca por informações sobre o inquérito conduzido por Ciríaco. Os deputados chegaram a enviar, à Polícia Civil, requerimento pedindo acesso ao conteúdo da apuração. Em resposta, a corporação afirmou que os elementos já haviam sido repassados à Justiça.
Ofício mostra que delegado pediu transferência após 'informações' de que seria removido
O inquérito de Ciríaco trata de pontos que também estão na mira da CPI, como a venda da participação da companhia de luz na Renova, empresa de energias renováveis. Os valores da transação são considerados baixos por alguns deputados, o que levantou suspeitas.
Um ofício obtido pelo EM mostra que, em junho deste ano, ao pedir para ser realocado em Venda Nova, Ciríaco pede aos seus superiores que considerem, como ponto a seu favor, o fato de que seria "removido" da Delegacia de Combate à Corrupção.
Segundo Professor Cleiton, o delegado confirmou à CPI ter recebido um requerimento com o aviso da "remoção".
"Ele falou que recebeu o comunicado de que seria removido. Não houve justificativa. A narrativa do governo é que toda vez que se muda o delegado-geral, tem mudanças estruturais. Da vontade dele, ele permaneceria na Deccor fazendo as investigações".
As dúvidas em torno da saída de Gabriel Ciríaco motivaram a convocação de Joaquim Francisco Neto Silva, chefe da Polícia Civil. "O que temos que apurar é se a transferência foi em função do trabalho dele na investigação ou se foi uma coisa natural. Ele chamou de 'efeito-dominó': quando se troca o chefe da Polícia Civil, os que estão subordinados são substituídos", pontuou Roberto Andrade.
Empresa de ex-secretário citado foi sublocada por dona de contrato bilionário
Cássio Azevedo, citado neste texto, era dono da AeC, empresa de call center que presta serviços para Cemig. A empresa está na mira da CPI por causa do contrato de R$ 1,1 bilhão que a estatal fechou com a IBM, multinacional de tecnologia. O pacto trata de serviços como o controle do call center que presta suporte aos consumidores.
O acordo, porém, foi oficializado pouco tempo após a estatal romper acordo com a Audac, que havia vencido concorrência para controlar o atendimento telefônico. A IBM repassou essa tarefa à AeC, que havia participado – e perdido – do pregão vencido pela Audac.
O que dizem os envolvidos
A Polícia Civil foi questionada sobre a transferência de Ciríaco e a informação, obtida por ele, de que seria "removido" do setor anticorrupção. "A remoção do referido delegado se deveu à reorganização administrativa do departamento, tendo sido concretizada a pedido dele próprio. A chefia da PCMG registra que não coaduna com qualquer interferência em investigações criminais, exigindo dos servidores da Instituição isenção, imparcialidade, discrição e efetividade nos trabalhos", lê-se em trecho de nota da corporação.
Por causa do suposto conflito de interesses na seleção de Passanezi, a reportagem fez contato com a AeC. A empresa afirmou se nortear "pela ética e pelo conjunto das melhores práticas de integridade e compliance". (Leia a nota completa ao fim deste texto).
Evandro Negrão, do diretório do Novo, disse que não vai comentar o depoimento desta quarta.
A Cemig afirmou que, por ora, não pretende comentar a convocação de Passanezi. A estatal defendeu os acordos com Exec e IBM. (Leia ainda neste texto todo o posicionamento) Na segunda, a energética sinalizou que, a priori, não trataria publicamente das investigações da Polícia Civil.
Nota da AeC, empresa de Cássio Azevedo, ex-secretário de Zema
"A AeC atua há quase 30 anos no mercado, tendo prestado serviços para centenas de empresas, e esclarece que todos os contratos e serviços prestados ao longo de mais de uma década para a Cemig foram pautados pela legalidade, idoneidade e pela absoluta transparência, gerando emprego e renda para o município de Belo Horizonte.
A empresa reafirma seu compromisso em colaborar com toda e qualquer apuração que demande sua participação e reitera que todas as suas relações institucionais e comerciais sempre se nortearam pela ética e pelo conjunto das melhores práticas de integridade e compliance".
Nota da Cemig sobre as contratações de Exec e IBM
Sobre a contratação da empresa Exec, responsável pelo recrutamento e seleção do diretor-presidente da Companhia, a Cemig reafirma que ela foi feita com a observância das normas legais e internas da empresa.
A Cemig esclarece ainda que, em 2020, decidiu implantar o Projeto Cliente %2b, que vai oferecer um atendimento de excelência aos 8,7 milhões de clientes da Cemig, por meio de uma parceria estratégica com a IBM que consiste na integração dos canais de atendimento. Anteriormente, a Cemig tinha 14 fornecedores que cuidavam de diferentes canais e eram remunerados por tempo de atendimento, não por resolução de problemas. Além da melhoria de qualidade, o Cliente %2b representa economia superior a R$ 400 milhões para a Cemig em dez anos de contrato.