Jornal Estado de Minas

MINISTÉRIO PÚBLICO

Maurício Souza: advogado que foi ao STF contra homofobia pede ação penal


O advogado Paulo Iotti, autor da ação que criminalizou a homofobia, acionou o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) pedindo que Maurício Souza seja alvo de processo por crime de racismo homofóbico. O jogador de vôlei foi demitido do Minas Tênis Clube por causa de postagens discriminatórias.



A peça de Iotti foi enviada ao MPMG nesta sexta-feira (29/10). Ontem, 20 parlamentares LGBTQIA%2b já haviam procurado o órgão para entregar uma representação contra o atleta.

A ação assinada por Paulo Iotti pede que Maurício seja punido por praticar, induzir e incitar a discriminação. A solicitação vai de encontro a um dos artigos da lei que trata da homofobia, do racismo e da transfobia. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) equiparou os dois crimes.

Conhecido por posições que incentivam segregações, Maurício se indignou por causa da bissexualidade do filho do "Super-Homem", herói dos quadrinhos da DC Comics. No Instagram, o central, que atuou pela Seleção Brasileira na Olimpíada de Tóquio, insinuou que o bejio do personagem em outro homem poderia ser uma espécie de exemplo negativo.



"A fala dele é criminosa porque incita o preconceito contra homossexuais e bissexuais. Ele dá a entender que o simples fato de uma história em quadrinhos representar uma relação homoafetiva seria prejudicial às crianças e à sociedade", diz Iotti, ao Estado de Minas.

"Homofobia não é só agressão física ou xingamentos chulos diretos. Qualquer preconceito ou discriminação contra homossexuais ou bissexuais é homofobia", completa.

O advogado vai procurar a Justiça para outras providências. A ideia é ajuizar uma ação civil por danos morais e coletivos. O pedido encaminhado nesta sexta à ouvidoria do MPMG é referendado pela Associação Nacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais e Intersexo (ABGLT). A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA) e a Associação Mães pela Diversidade também assinam.

Contra o discurso de ódio, a ação

A outra representação, protocolada ontem, é subscrita por deputados federais, estaduais, vereadores e um senador de sete partidos distintos. A ação foi articulada pelo mandato de Érika Hilton (Psol), integrante da Câmara Municipal de São Paulo. Fabiano Contarato (Rede/ES), componente do Senado Federal, é signatário.



Em Minas Gerais, o documento tem as assinaturas de Duda Salabert (PDT) e Bella Gonçalves (PSOL), vereadoras de Belo Horizonte. O grupo notificou o Instagram, palco das postagens de Maurício, solicitando a remoção de conteúdos LGBTfóbicos. A ideia é agendar audiência com a empresa para debater as políticas da rede social no combate à homofobia e ao discurso de ódio.

"É importante que o Ministério Público investigue e indicie Maurício Souza. Para que outras pessoas, inclusive, não se sintam à vontade de atentar contra a vida e a dignidade dos outros pela orientação sexual ou identidade de gênero", reivindica Bella Gonçalves.

'Ele nunca se desculpou de verdade'

A pressão sobre Maurício Souza se intensificou no fim da semana passada, quando a Torcida Independente, que reúne fãs da equipe de voleibol do Minas, decidiu ignorá-lo nas partidas. Na terça-feira (26), o clube resolveu afastá-lo por tempo indeterminado das atividades. O jogador foi ao Twitter, onde tinha menos de 100 seguidores, para publicar uma retratação dirigida, segundo ele, "a todos que desrespeitei ou ofendi".



Um dia depois, porém, a rescisão do contrato foi anunciada. Antes, no Instagram, Maurício havia alterado o teor do "pedido de desculpas", e afirmou que opinião não significa homofobia.

"É uma tática muito comum daquele que faz manifestações preconceituosas e discursos de ódio em geral, de falar 'desculpe se alguém se ofendeu'. Isso não é pedir desculpas. Pedir desculpas é falar que o que você disse está errado e que vai reconsiderar. Não é isso o que Maurício fez em nenhum momento", rebate Iotti.

Bella lembra que pensamentos como os encampados por Maurício podem trazer consequências físicas. "O discurso de ódio, além de ser violento e produzir múltiplos danos, legitima formas muito extremas de violência. Apenas na última semana, cinco travestis foram assassinadas (no Brasil). É preciso que a gente ataque de maneira firme a LGBTfobia".

"O ponto é: ele nunca se desculpou de verdade. Ele reafirmou que, para ele, ter uma história em quadrinhos com um personagem bissexual ou beijando outro homem, em uma relação homoafetiva, seria contra a família, traria problemas à sociedade e contra o que é correto. Isso é homofobia", completa o advogado.



'Estrelato' se torna desdobramento do caso

Sem clube e aos 33 anos de idade, Maurício Souza também teve as portas fechadas por Renan Dal Zotto, técnico da Seleção Brasileira. A "O Globo", o comandante garantiu que "não há espaço para profissionais homofóbicos" em seu time.

Nas redes sociais, porém, tem sido alçado ao posto de "mártir". No Instagram, por exemplo, já ultrapassa 1,5 milhão de seguidores.

"Existem pessoas que se identificam com falas homofóbicas. Todo mundo adora negar e falar que não foi homofobia, mas opinião. A opinião foi homofóbica. Me sinto ofendido enquanto homem gay", protesta Paulo Iotti.

A reportagem procurou o Ministério Público mineiro para saber os procedimentos seguintes à entrega das ações. Se houver resposta, este texto será atualizado.