A PEC dos Precatórios, aprovada pela Câmara dos Deputados, deve enfrentar resistência no Senado. A rejeição não é apenas nos partidos de oposição ao governo, mas entre siglas antes alinhadas ao Executivo, como MDB, Pros, PSDB e PSD, ao qual o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (MG), se filiou recentemente.
O senador Fabiano Contarato (Rede-ES) definiu a matéria como um calote bilionário nos cofres públicos e afirmou que não apoiará a proposta. "Sob o falso pretexto de garantir assistência aos mais pobres, empurrando a dívida para as futuras gerações, quando, na verdade, encherá os bolsos de parlamentares fiéis a Bolsonaro (presidente Jair Bolsonaro) em ano eleitoral", criticou.
A senadora Leila Barros (Cidadania-DF) também se mostrou contrária à PEC. "Sou a favor da ajuda aos mais necessitados, mas totalmente contrária à proposta de subtrair direito adquirido para custear o programa e ampliar o recurso que existe no orçamento secreto", comentou. "Existem alternativas mais justas e eficientes no orçamento, como o fim das emendas do relator."
O senador José Aníbal (PSDB-SP) apresentou outra PEC que prevê R$ 50 bilhões para o Auxílio Brasil e outros R$ 26 bilhões para que o governo possa empregar em eventuais rombos orçamentários. "Pode ser alternativa à do governo, que é péssima, estoura o teto de gastos, é uma irresponsabilidade total e dá calote nos precatórios", disparou. "O Brasil está seguro com uma âncora, que é o teto de gasto que votamos em 2016. Sem essa âncora, vai bater nas pedras. Por outro lado, ainda dá calote nos precatórios. Eu recolhi mais de 30 assinaturas, já é um sinal de apoio."
Trabalho
O senador ainda comentou que, na última terça-feira, recebeu em seu gabinete o líder do governo no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), com os senadores Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Alessandro Vieira (Cidadania-SE), para tratar da matéria. O parlamentar já trabalha nos bastidores para que a proposta dele — ou alguma semelhante — prevaleça em relação à que passou na Câmara.
Na Casa há, porém, quem enxergue o objetivo da PEC de forma diferente. O senador Otto Alencar (PSD-BA), por exemplo, ainda que seja resistente, não é completamente contra o texto. Ele argumentou ser urgente uma medida para acabar com a miséria no país, e a proposta aprovada pela Câmara serviria de alívio aos mais necessitados. Contudo, para que vote a favor, disse ser necessária a exclusão de uma determinação específica do texto. "Eu sou municipalista. Quero aprovar (a PEC) porque os municípios estão em uma situação ruim, e a barriga do povo brasileiro, seca", afirmou. "O Auxílio Brasil veio tarde, mas eu conversei com o Fernando Bezerra e coloquei a condição de retirar essa gordura de R$ 20 bilhões. Esse espaço de R$ 15 bilhões a R$ 20 bilhões, querem usar para o botar na reeleição do Bolsonaro, o que é tarefa impossível, na minha opinião, já que Bolsonaro é um presidente despreparado", enfatizou.
Na avaliação de André César, cientista político e sócio da Hold Assessoria, o Senado tem suas próprias propostas para alimentar o Auxílio Brasil. Além disso, um dos principais freios pode ser Rodrigo Pacheco, que praticamente se tornou adversário de Bolsonaro na corrida pelo Planalto — ele ainda não formalizou a pré-candidatura. "Não é fácil passar. É um tema complexo e que foi aprovado com dificuldades na Câmara", frisou.
Segundo o especialista, os artifícios utilizados para a aprovação na Câmara, como as emendas de relator (RP9), não serão os mesmos usados no Senado, pois Pacheco não tem interesse em avalizar propostas do chefe do Executivo. "Vai demorar a votar. Segura na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), cria alguns instrumentos para paralisar. Enfim, não é tão simples para o Senado trabalhar a pauta", destacou. "O problema do governo no Senado chama-se Rodrigo Pacheco, que pode, inclusive, ser vice na chapa do Lula."