Uma denúncia de extração ilegal de argila, areia e madeira em uma terra indígena, em Caucaia, no Ceará, levou à descoberta de que Fundação Nacional do Índio (Funai) encolheu em cerca de cem hectares a reserva dos tapebas. Ela abriga 7 mil integrantes da etnia e fica na Grande Fortaleza, perto das praias de Icaraí e do Pacheco.
A denúncia sobre o crime ambiental chegou ao Instituto do Meio Ambiente de Caucaia (Imac) em 29 de outubro. No dia seguinte, uma equipe do Imac foi à área, acompanhada pela Guarda Civil e pela Polícia Militar, e constatou a "extração de minérios sem licenciamento". Segundo a prefeitura de Caucaia, a fiscalização notificou os responsáveis e interrompeu a lavra. Quando verificavam se a atividade estava na terra indígena, os fiscais descobriram que o mapa da área à disposição da coordenação regional da Funai era diferente do apresentado pelo Agência Nacional de Mineração. Este último encolhia a reserva tapeba.
A redução do território aconteceu após o coordenador-geral de geoprocessamento da Funai, de Brasília, Evandro Marcos Biesdorf, chefiar no começo do ano nova medição da reserva, alegando que as anteriores, de 1996 e de 2013, valeram-se de aparelho comum de GPS e não de equipamento mais preciso, o GPS geodésico. A ação da equipe de Biesdorf era desconhecida dos índios e da coordenação regional da Funai.
"Só descobrimos que a área havia sido retirada quando houve o processo de licenciamento ambiental da lavra de argila, na área contígua à reserva. A coordenação regional da Funai dizia que a área era indígena. Foi então que a mineradora mostrou os novos mapas feitos pela Funai em Brasília", disse o advogado Weibe Tapeba, líder tapeba e assessor da Federação dos Povos Indígenas do Ceará. O Imac informou ao Estadão que pediu esclarecimentos à Funai.
A reserva tem uma área de 5,2 mil hectares, disputada há 40 anos por indígenas e proprietários rurais. "Fizeram isso porque tem gente interessada em explorar empreendimento em nossas terras", contou Raimundo Nonato do Nascimento, o Raimundo Tapeba, da comunidade de Campo Grande (Caucaia), liderada pelo cacique Francisco Alves Teixeira.
Ali há áreas loteadas e até uma usina de asfalto. Parte das terras que desapareceram do mapa da Funai é próxima do Rio Ceará. "O limite ficava antes do rio e agora está na margem", disse Raimundo Tapeba. Ele confirmou que a comunidade foi pega de surpresa. O povo tapeba é o maior dos 15 que habitam o Ceará, onde 40 mil indígenas vivem em 22 áreas de 20 municípios. Até hoje, só uma área indígena no Estado, no município de Itarema, foi totalmente demarcada. As demais são alvo de disputas judiciais.
No caso da área tapeba, por duas vezes o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou processos de demarcação da Funai: em 1997 e em 2006. Em 2013, após acordo na 3.ª Vara Federal Cível de Fortaleza, chegou-se à exclusão de metade de uma fazenda e de duas áreas próximas do núcleo urbano de Caucaia. Após quase dez anos, porém, os indígenas, segundo Weibe Tapeba, só estão de posse de 50% da área. "Com o governo Bolsonaro, todo o processo parou."
Em janeiro, a Funai enviou de Brasília a equipe para nova delimitação da área. "O GPS convencional dá uma diferença de cinco, seis metros no máximo em relação ao aparelho moderno. Não há como justificar diferença tão grande em área valorizadas do ponto de visto imobiliário, como a Lagoa dos Porcos e Campo Grande. Usaram uma artimanha para excluir as áreas", disse Weibe.
Segundo ele, políticos bolsonarismo da região têm interesses em empreendimentos na área da reserva. "A exclusão tem relação com políticos." O Estadão procurou a Funai na terça-feira passada e encaminhou perguntas sobre o caso. Até este sábado, 13, nenhuma resposta havia sido enviada pelo órgão.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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