A Justiça Federal do Rio de Janeiro acatou, neste sábado (18/12), liminar que pedia o afastamento de Larissa Peixoto Dutra da presidência do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A medida cautelar foi acatada dias após o presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmar que trocou a presidência da entidade por causa da interdição da obra de uma loja da Havan, controlada pelo empresário bolsonarista Luciano Hang.
Na quarta-feira (15/12), Bolsonaro disse a participantes de um evento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) que "ripou" o comando da autarquia após a obra ser embargada em virtude da descoberta de um "azulejo".
O presidente já havia falado sobre interferir na autarquia durante a reunião ministerial de 22 de abril de 2020, divulgada posteriormente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Na ocasião, o presidente afirmou ter recebido a queixa de Hang em relação ao embargo de uma obra no Rio Grande do Sul. A gravação também é mencionada na decisão da Justiça fluminense, assinada pela magistrada Mariana Cunha. A sentença atende a desejo do Ministério Público Federal (MPF).
"Há pouco tempo tomei conhecimento de uma obra de uma pessoa conhecida, o Luciano Hang, que estava fazendo mais uma obra e apareceu um 'pedaço de azulejo' durante as escavações. Chegou o Iphan e interditou a obra", falou Bolsonaro, nesta semana.
"Liguei pro ministro da pasta (responsável pelo Iphan), e perguntei 'que trem é esse?' Porque eu não sou tão inteligente como meus ministros. 'O que é Iphan, com PH?' Explicaram para mim, tomei conhecimento, 'ripei' todo mundo do Iphan. Botei outro cara lá, o Iphan não dá mais dor de cabeça pra gente", emendou ele.
Histórico
A construção foi paralisada em agosto de 2019, após uma empresa contratada pela Havan comunicar ao Iphan ter identificado cerâmicas e vestígios arqueológicos de civilizações passadas no local da obra."O Iphan, não é? Tá lá vinculado à Cultura. Eu fiz a cagada em escolher... não escolher uma, uma pessoa que tivesse um outro perfil. É uma excelente pessoa que tá lá, tá? Mas tinha que ter um outro perfil também. O Iphan para qualquer obra do Brasil, como para a do Luciano Hang. Enquanto tá lá um cocô petrificado de índio, para a obra, pô! Para a obra. O que tem que fazer? Alguém do Iphan que resolva o assunto, né? E assim nós temos que proceder", contou o presidente na reunião interministerial.
Após a paralisação do empreendimento, Hang gravou e divulgou um vídeo nas redes sociais reclamando que a obra estava paralisada porque o Iphan encontrou "fragmentos de pratos".
Demitida denunciou pressão
Uma das "ripadas" do Iphan é a ex-presidente da autarquia Kátia Bogéo, demitida em dezembro de 2019, quatro meses após a obra ser paralisada. Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, em maio de 2020, Kátia denunciou ter sido demitida por pressão de Hang e do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ)"O vídeo feito por Hang foi mentiroso, ele vendeu essa mentira para o presidente e o presidente comprou essa mentira dele. Aí, a imagem que o presidente formou na cabeça dele do que seria o Iphan seria de um órgão que estava ali para paralisar obras, impedir o desenvolvimento", disse ao jornal.
Randolfe acionou STF
Após Bolsonaro reconhecer as "ripadas" na autarquia cultural, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) acionou o Supremo Tribunal Federal (STF) com notícia-crime sobre o tema. A peça pede que o presidente seja investigado pelos crimes de prevaricação e advocacia administrativa para privilegiar apoiadores.Para Randolfe, a atitude condiz com a advocacia administrativa "ao patrocinar interesse ilegítimo (liberação de obra irregular), valendo-se da sua qualidade de mandatário máximo da República".
"Há uma série de irregularidades aparentes no bojo desse cenário da troca no comando do Iphan, praticadas sobretudo pelo mandatário máximo da República, que não pode ficar impune''.