Jornal Estado de Minas

SUCESSÃO

Forças Armadas sinalizam neutralidade nas eleições

Na corrida ao pleito eleitoral de 2022, o presidente Jair Bolsonaro (PL) procura manter o apoio da ala militar em busca da reeleição. As Forças Armadas, como instituição, no entanto, têm procurado se descolar de vínculos políticos e deixar claro que quem quer que ocupe a cadeira palaciana terá sua fidelidade.



Na semana passada, o comandante da Força Aérea Brasileira (FAB), Carlos de Almeida Baptista Junior, disse que, caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que aparece na liderança das pesquisas de intenção de voto, saia vitorioso das eleições, também a ele será prestada continência como comandante supremo das Forças Armadas.

A declaração foi vista como “infeliz” por Bolsonaro por ser lida como uma sinalização à sigla da oposição, apesar de não ter sido essa a intenção.

Mesmo com o descontentamento por parte de integrantes das Forças com o líder do Executivo, Lula segue sendo malvisto pela maioria dos militares pela imagem de corrupção deixada pelos tempos da Lava-Jato. O general Paulo Chagas, militar reformado, se mostra contrário à politização da caserna, tal como Bolsonaro insinuou frequentemente no ano passado.

“O atual comandante da Aeronáutica soube, com precisão, deixar claro que as instituições são órgãos de Estado, e não de governo, o que significa dizer que, seja quem for o presidente eleito, terá a lealdade constitucional das Forças.  Os militares, como cidadãos, em sua maioria votaram em Bolsonaro em 2018, mas nunca estiveram 'fechados' com ele, como não estiveram 'fechados' com nenhum outro presidente”, destaca.





Chagas relata um “número significativo” de militares decepcionados com Bolsonaro que não confiarão a ele o voto no primeiro turno, onde parte deve migrar para o ex-juiz Sergio Moro (Podemos). Porém, reconhece que caso a disputa do segundo turno fique entre o atual presidente e Lula, não há chances de escolherem o petista.

“Essa atitude é de foro íntimo de cada um e não pode ser interpretada como coletiva. Hoje, baseado na minha percepção pessoal e na de outros militares com quem mantenho contato, vejo que há um número significativo de militares que não votarão mais em Bolsonaro no 1º turno, mas, ao mesmo tempo, desconheço quem pense em votar em Lula da Silva tanto no 1º como no 2º turnos. Atrevo-me a dizer que a quase totalidade enxerga Lula e sua turma como os promotores dos maiores malefícios já feitos ao Brasil.”

O general ainda cita o despreparo do chefe do Executivo e sua inabilidade política para o cargo como alguns dos motivos da perda de apoios da ala militar. Antes apoiador, ele também revela decepção com o presidente.



“Quanto à decepção com Bolsonaro, falo por mim, certo de que não estou sozinho. Julgo que o despreparo do presidente para o cargo, a sua inabilidade política e o não cumprimento de parte significativa do plano de governo foram os principais responsáveis pela perda de apoio de parte dos que votaram nele em 2018 e pela adesão à ilusão lulista de boa parte dos que, naquela eleição, não quiseram votar nem em Bolsonaro nem em Haddad.”

Um oficial disse que, individualmente, é perceptível que os militares têm mais afinidade com Bolsonaro. “Em geral, os militares têm os ideais mais conservadores, têm toda a relação com o patriotismo, valores familiares e isso atrapalha uma afinidade com ideais mais progressistas”, explicou. Outro oficial disse acreditar que o antipetismo entre os militares ainda é muito presente. “O que houve na Comissão da Verdade, por exemplo, reabriu uma ferida dos tempos da ditadura militar. Não foi bem digerido pelos militares”, disse.

Apoio 


O deputado federal Capitão Augusto (PL) diz que, no primeiro turno, Bolsonaro pode até perder alguns votos da ala militar, mas no segundo, se o oponente for Lula, não há a menor possibilidade de isso ocorrer. "O PT sempre foi inimigo das polícias.  Não há a menor possibilidade de votarem no Lula. Vão estar 100% com Bolsonaro”, afirma.



O general da reserva Carlos Alberto dos Santos Cruz (Podemos), ex- ministro da Secretaria-Geral do governo, observa que “não é por ter um número expressivo de militares da reserva e muito poucos da ativa integrando o governo em algumas funções que se pode considerar os militares como um todo e institucionalmente comprometidos ou ‘fechados’  com um governante, seja ele quem for”.

“As instituições que compõem as Forças Armadas têm a cultura de cumprir a Constituição e não existe possibilidade de  preferência institucional por qualquer candidato. Individualmente, cada um vota em quem quiser. Não existe essa ‘continuação’ com Bolsonaro e nem aproximação com o outro candidato, o ex-presidente Lula. Isso é exclusivamente individual. Inclusive, normalmente não se fala em política dentro de quartéis”, conclui.

A constitucionalista Vera Chemim, mestre em direito público pela Fundação Getulio Vargas (FGV), reforça que Bolsonaro já não conta com o apoio incondicional dos militares das Forças Armadas como antes, tendo em vista ainda reações recentes da cúpula militar quanto à conduta a ser tomada em relação à vacina. Raquel Borsoi, analista de risco político da Dharma Politics, observa movimentos recentes das Forças Armadas que também interpreta como sinais de distanciamento das lideranças militares do governo Bolsonaro. Já o cientista político Antônio Flávio Testa afirma que não vê abandono de militares de alto escalão ao governo.