Jornal Estado de Minas

SENADO

CPI da COVID: Até hoje as pessoas aguardam o efeito prático da investigação


Durante mais de seis meses, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da COVID-19 dominou as atenções e os debates no país. No relatório final das investigações, entre outras denúncias, houve um pedido de indiciamento de 80 pessoas por suspeita de irregularidades relacionadas ao enfrentamento da pandemia do novo coronavírus. O primeiro da lista é o presidente Jair Bolsonaro (PL), ao qual foram imputados nove crimes. Ao fim dos trabalhos, ocorrido no dia 25 de outubro, denúncias e propostas aguardam prosseguimento na Procuradoria-Geral da República (PGR), no Congresso e no Ministério Público Federal.





A lista de indiciados no relatório da Comissão inclui também, entre outros, o ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, o atual titular da pasta, Marcelo Queiroga, e os filhos do chefe do Executivo, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), o deputado federal, Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e o vereador, Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ). Os três são acusados de incitação ao crime. Mas passados três meses da aprovação do relatório final, quase nada de prático foi encaminhado até agora.

No começo do mês, o Ministério Público Federal no Distrito Federal abriu 12 investigações preliminares para aprofundar os fatos listados pela CPI no relatório final, que não envolvem autoridades com foro privilegiado. Os casos tramitarão na primeira instância e investigam, entre outros, ações e omissões do Ministério da Saúde na gestão do ex-ministro Eduardo Pazuello, o caso Prevent Senior, o caso da compra da vacina indiana Covaxin, o caso da empresa VTCLog, o caso da Davati Medical Supply, fake news e incitação ao crime, responsabilidade civil por dano moral coletivo, a atuação do Conitec na análise de medicamentos comprovadamente ineficazes contra a Covid-19 e a atuação de planos de saúde e hospitais.

No Senado, das 17 propostas sugeridas pela CPI, apenas três foram aprovadas: a que institui um memorial em homenagem às vítimas brasileiras da COVID-19 e ainda aguarda a autorização do presidente da Casa para ser construída; a proposta de criação de um Dia Nacional de Homenagem às Vítimas da COVID-19, previsto anualmente em 12 de março, quando foi registrada a primeira morte pela doença no Brasil. A proposta aguarda análise da Câmara dos Deputados.





Além desses, foi aprovada e criada a Frente Parlamentar Observatório da Pandemia. No entanto, ainda não ocorreram reuniões no âmbito. Outros projetos ainda aguardam designação de relatoria, como é o caso do projeto que institui pensão especial para crianças e adolescentes órfãos de vítimas da pandemia da COVID-19. Um outro tema inspirado pela CPI que chegou a ser pautado no último dia 16 mas teve análise adiada, foi o PL 3826/2021 que estabelece prazos para a realização de diligências complementares ou para o oferecimento de denúncia, após o envio ao Ministério Público do relatório das conclusões de uma CPI. O novo texto determina que o MP solicite diretamente à autoridade policial documentos complementares e atenda ao prazo determinado pelo juiz. Na prática, evita que representantes da Justiça “sentem” nos processos, promovendo celeridade.

Em dezembro, um grupo de juristas protocolou um novo pedido de impeachment contra Bolsonaro com base no relatório da Comissão. O documento foi assinado por 17 juristas e um médico. Já são quase 150 pedidos de impeachment contra Bolsonaro e até hoje, o presidente da Câmara, Arthur Lira, que é aliado do governo, não deu prosseguimento a nenhum deles.

Na PGR, foram instauradas seis investigações preliminares para apurar a conduta de Bolsonaro. Em discurso realizado na sessão de encerramento do ano no Supremo Tribunal Federal (STF) em dezembro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, que vem recebendo críticas pela condução dos procedimentos, disse que é preciso separar trabalho político do processo judicial “com limites, balizas e prazos legais”.





“Enviamos para o acompanhamento de aval do STF todas as providências decorrentes do relatório da CPI da COVID-19. Diante de um tema tão importante, é compreensível que haja um anseio social por respostas céleres. No entanto, precisamos separar o trabalho realizado por uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que tem características próprias do âmbito político, daquilo que é o processo judicial com limites, balizas e prazos legais", alegou na data.

Resposta 


Sob acusação de “sentado em cima” dos pedidos de investigação da CPI da COVI-19, a Procuradoria Geral da Republica divulgou nota na noite de ontem afirmando que “nenhum dos casos submetidos à apreciação do procurador-geral da República, Augusto Aras, esta parado”. A PGR informa ainda na nota que “menos de 30 dias após o recebimento simbólico do relatório, a Procuradoria-Geral da República encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) manifestações referentes a todos os indiciados que têm prerrogativa de foro no referido tribunal. Isso significa que os casos foram judicializados e atualmente tramitam por meio de PETs, estando submetidas cada uma ao respectivo relator, que é o juiz natural do feito”.

A procuradoria destaca ainda que “é um equívoco afirmar que o instrumento utilizado pela PGR para levar os fatos ao conhecimento da Suprema Corte são procedimentos preliminares. Trata-se na verdade de apurações em andamento e que – como em qualquer caso judicializado – terão o desfecho condizente com o produto da investigação. (Com Bernardo Lima e João Vítor Tavares)


Senadores querem nova investigação


No dia 11, o senador Randolfe Rodrigues (Sustentabilidade-AP) anunciou ter aberto um requerimento pedindo a instalação de uma nova investigação em 2022. O motivo da nova investigação seria a demora para dar início à vacinação das crianças, bem como apurar os ataques feitos pelo presidente Jair Bolsonaro à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), além do apagão de dados do Ministério da Saúde, entre outros. Diante da possibilidade de uma nova CPI, Bolsonaro fez críticas ao senador Randolfe, alegando que o parlamentar “vive de Carnaval".





Relator da comissão, Renan Calheiros (MDB-AL) informou em nota que uma nova investigação dos últimos dois meses se faz urgente. “Desde o fim de outubro, Bolsonaro perdeu o medo de atacar a vacina, sentiu-se livre e voltou a delinquir. Ele só entende uma linguagem: CPI. É hora de agir”, argumentou. O senador Humberto Costa (PT-PE) destaca que entre as conquistas da CPI está a aceleração da vacinação no país. “Houve muitos frutos, especialmente no processo da vacinação. Se não fosse a CPI e a pressão da sociedade, estaríamos ainda atrasados se dependêssemos única e exclusivamente do presidente”, aponta.

“Ficou claro para a população de quem é a responsabilidade por toda a situação que vivenciamos, de um governo omisso, negacionista que tentou praticar atos de corrupção em meio a pedidos por vacinação. Isso foi uma coisa importante. Impedimos o fechamento de contratos fraudulentos. Foi um saldo positivo”, completa. Costa relata que os parlamentares pretendem também enviar o relatório para o Tribunal de Haia. “Nós cumprimos a nossa parte e encaminhamos para os órgão que tem a obrigação de complementar ou abrir processos. Ainda temos alguns lugares para onde queremos mandar o relatório para a ONU, o Tribunal de Haia. Vamos fazer. De modo geral, é um resultado positivo. Esses órgãos todos que receberam esse documento robusto, não é possível que nenhum deles avance”, salienta.

Como principais prioridades para 2022 está o Observatório da Pandemia e a pensão para órfãos da COVID, aponta. “Inclusive, o próprio Observatório pode fazer uma comissão para a reavaliação dos projetos mais urgentes. Com o retorno ao expediente isso poderá ser discutido”. Ele é um dos que assinou o requerimento para a instalação de uma nova CPI neste ano, mas destaca que é necessário que os objetivos estejam bem estabelecidos. “Assinei a formação, mas precisamos fazer uma avaliação. Tenho alguns receios porque vamos entrar em ano eleitoral. O objeto da comissão precisa estar bem estabelecido. Há uma preocupação de todo mundo de que a CPI seja mais relevante do que a outra. Não pode ser menos importante que a anterior”, defende.





Para o senador Luís Carlos Heinze (PP-RS), a agilidade da vacinação não ocorreu por pressão da CPI, mas por esforço próprio do governo. “A comissão foi construída em narrativas. Não vejo resultado prático. Tentaram ver corrupção em vacina que não foi comprada. Foram seis meses de narrativa e discurso. Não teve resultado prático, mas sim um ato político. Se tivesse corrupção, o governo teria caído”, justifica. O deputado Bohn Gass (PT-RS), líder do PT na Câmara, ressalta que a CPI terminou o trabalho formal, cabendo aos órgãos competentes a investigação das apurações e à sociedade cobrar o andamento das investigações.