Jornal Estado de Minas

CEMIG

CPI da Cemig apura se há interferência externa na companhia elétrica

O secretário de Assuntos Institucionais do partido Novo em Minas Gerais, Evandro Veiga Negrão de Lima Júnior, é sócio do marido da gerente de Compras de Materiais e Serviços da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig), Ivna de Sá Machado de Araújo. Eles têm, juntos, participações em uma usina de energia fotovoltaica. Evandro era esperado para depor ontem na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura possíveis irregularidades na gestão da estatal. Por estar em viagem, no entanto, ele não compareceu. Evandro afirmou ao EM que estará à disposição da CPI a partir da próxima segunda-feira. "Essa viagem já estava pré-agendada. Eu havia avisado antes", salientou.





Segundo o sub-relator da CPI, Professor Cleiton (PSB), não houve espanto pela ausência de Evandro. "É a segunda reunião que os advogados aparecem justificando que ele está viajando. A CPI aguarda que ele apresente uma data , já que, se não o fizer por iniciativa própria, automaticamente entrará no relatório como indiciado”. Ele diz que Evandro terá condições de mostrar aos deputados que não tenta interferir na gestão da estatal.

Deputados suspeitam que Evandro tenha interferido nos rumos da companhia. Evandro foi quem recebeu a primeira proposta financeira da Exec, empresa contratada em 2019 pela Cemig para conduzir a escolha do novo presidente da companhia. À época, Reynaldo Passanezi foi selecionado para o posto. O Novo é a legenda que abriga o governador Romeu Zema.

Em depoimento, Ivna Araújo negou conhecer Evandro, que, ao lado do marido, é sócio-administrador de um empreendimento nomeado TRZS Energia Participações, cujo capital social apresentado à Receita Federal é de R$ 840 mil. Segundo ela, o setor de compliance da Cemig, responsável por zelar pelo cumprimento de boas práticas administrativas, não viu problemas na continuidade dela na empresa, mesmo ante a relação entre ele e seu marido, Carlos Alberto Campos.





No ano passado, investigação no setor de compras e suprimentos da estatal gerou o afastamento de funcionários do departamento. A CPI buscará saber se ela recebeu algum tipo de proteção ou se há conflito de interesses no caso. A Cemig afirma que não houve irregularidade porque "não há relação comercial" entre a companhia e a usina.

"Tudo o que está na oitiva será encaminhado às autoridades competentes e constará no relatório da CPI. Fica, mais uma vez, muito clara a influência de Evandro Negrão em tudo o que se faz no interior da Cemig, escolhendo cargos, o próprio presidente, e determinando empresas contratadas, como ouvimos em outros depoimentos", disse ao Estado de Minas o Professor Cleiton (PSB).

Ivna garantiu ter contado à Cemig sobre a relação entre Evandro e o companheiro tão logo a descobriu. "Da mesma forma que meu marido não conhece todas as pessoas com quem me relaciono profissionalmente, não conheço todas as pessoas com quem ele se relaciona profissionalmente", assegurou. Em contato com a reportagem, o dirigente do Novo afirmou não conhecer a esposa de seu sócio. "A TRZS Energia é uma usina fotovoltaica como outras centenas no estado. Nem eu nem o Carlos e muito menos a Ivna (que eu nunca vi e nunca conversei na vida) atuamos diretamente nela."





Evandro explicou ser investidor da usina, que, de acordo com ele, está sem funcionar por atraso da Cemig na aprovação da cabine de medição da estrutura. "Minha empresa e a empresa do Carlos já possuíam sociedades anteriores em outros empreendimentos imobiliários e fomos convidados a participar dela por outras pessoas que já atuavam na área", disse. Para Professor Cleiton, as informações dadas por Ivna tornam a oitiva do dirigente do Novo ainda mais importante. "É alguém que tem muito a nos responder”, disse.

O nome de Evandro passou a ser tópico constante durante as sessões da CPI da Cemig pelo fato de ter sido ele o responsável a receber a primeira proposta da Exec, que cobrou R$ 170 mil para buscar, no mercado de executivos, o novo presidente para a Cemig. A empresa foi a mesma que auxiliou no preenchimento de secretarias do atual governo estadual. Aos deputados estaduais, em outubro, o ex-presidente da estatal Cledorvino Belini disse que só soube do contrato com a Exec para escolher seu sucessor quando Evandro Negrão enviou a ele a fatura dos R$ 170 mil acordados. "É um agente partidário, do Novo, que no entendimento de alguns deputados é quem administra a companhia", assinalou Professor Cleiton.

DISCORDÂNCIA NA COMISSÃO 

O governista Zé Guilherme (PP) discorda da percepção do colega. "Em toda a história de Minas Gerais, quem indica o presidente da companhia é o governador do estado. Zema foi eleito por 70% dos mineiros. E, ao contrário dos outros, não fez uma escolha política, mas procurou alguém do mercado, porque a Cemig estava um caos."





O contrato entre a Cemig e a Exec só foi oficializado em janeiro de 2020, sete dias após Passanezi assumir a presidência. O documento que sugere a contratação tem, inclusive, a assinatural do próprio Passanezi. Não houve licitação. O aval retroativo do acordo é chamado de convalidação. Zé Guilherme defende a prática. "Uma empresa do porte da Cemig, que tem ações nas bolsas de Nova York e de São Paulo, não pode anunciar que vai trocar o presidente".

Em oportunidades anteriores, a Cemig explicou que a contratação dispensada de licitação é permitida pela Lei das Estatais, desde que haja a comprovação de notória especialização da firma escolhida. A companhia garante, ainda, que o contrato só foi oficializado após a escolha de um novo executivo por causa do "sigilo".