Jornal Estado de Minas

DIREITA RADICAL

Jair Bolsonaro chega à Hungria para encontro com Viktor Orbán

Brasília – O presidente Jair Bolsonaro (PL) chega a Budapeste, na Hungria, hoje, para uma visita de cortesia ao primeiro-ministro Viktor Orbán e ao presidente Janos Ader, após agenda oficial na Rússia, com o presidente Vladimir Putin. Na agenda oficial, o líder brasileiro deverá buscar ampliar a relação comercial com o país europeu, mas analistas especulam que a comitiva governista tenha muito interesse no crescente know-how tecnológico instalado na região e ampliar alinhamento ideológico com o líder europeu.





Embora a viagem oficial tenha sido para a Rússia, Bolsonaro deverá ficar mais tempo na Hungria. O presidente desembarcou na terça-feira em Moscou, fez reuniões e um pronunciamento ontem, e seguiu com a comitiva presidencial para Budapeste, onde devem permanecer até o dia 19. A Hungria foi apenas o 108º colocado no ranking de exportação e o 54º na importação brasileira em 2021. No continente europeu, próximo à Rússia, Holanda, Itália e Espanha, por exemplo, são grandes parceiros comerciais do Brasil, mas Bolsonaro priorizou encontro ideológico com Orbán. Segundo especialistas, é uma estratégia para mostrar que o Brasil não está isolado no exterior e uma busca de apoio internacional para as eleições de outubro

A comitiva presidencial também não foi totalmente revelada. Na terça-feira, o filho do presidente e vereador pelo Rio de Janeiro, Carlos Bolsonaro, foi visto saindo de um dos carros da comitiva na chegada ao hotel em que o presidente está hospedado. Os ministros Carlos França (Relações Exteriores), Braga Netto (Defesa), Luiz Eduardo Ramos (Secretaria-Geral), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Bento Albuquerque (Minas e Energia) também acompanharam Bolsonaro na Rússia.

Negociada em novembro do ano passado pelo ministro Carlos França, a viagem de Bolsonaro à Hungria foi recebida com naturalidade por analistas. Embora tenha ocorrido em meio a um conflito bélico, parece compreensível que Bolsonaro busque os líderes do Leste europeu para reconstruir a sua agenda política internacional. Também segundo os analistas, o mandatário tenta mostrar para a sua base que o Brasil tem abertura internacional – mesmo que esses países tenham sérios problemas com a democracia.

Por isso, a visita a Orbán, o primeiro-ministro húngaro de extrema-direita, mais parece aproximação com esse grupo político global do que interesse econômico. O presidente húngaro, aliás, vai disputar pela quarta vez consecutiva as eleições do país, marcadas para abril. Especialista em relações internacionais, Pedro Feliú Ribeiro, professor e pesquisador do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), analisa que os efeitos da visita presidencial são percebidos com bons olhos pelos eleitores conservadores de Bolsonaro, porque Orbán é um dos principais líderes do conservadorismo internacional.





“A viagem é permeada por uma aliança ideológica com valores muito associados à extrema-direita, movimento internacional capitaneado por alguns milionários e que tem a liderança do americano Steve Banon, que já é aliado reconhecido da família Bolsonaro”, analisa. Não é difícil compreender certos interesses de membros da comitiva em conhecimento e negócios na área de tecnologia da informação. “Sem dúvida, essa pauta conservadora traz a certeza de como essa aliança pode auxiliar nas eleições. Eles estão fortalecendo uma rede que financia, produz, tem contatos para fazer disparos em redes sociais de uma maneira sigilosa para barrar efeitos de regulamentações”, explica Ribeiro.

Para David Magalhães, coordenador do Observatório da Extrema-Direita e professor de relações internacionais da PUC-SP, a Hungria de Orbán é o exemplo melhor sucedido da ascensão da chamada “direita radical populista” no mundo. O primeiro-ministro húngaro conseguiu mudar todo o Judiciário por meio de aposentadoria compulsória dos que lá estavam, controlou a imprensa local e promoveu o que o próprio chamou de “democracia iliberal húngara”, onde as minorias deveriam se submeter às vontades da maioria.

“DIREITA RADICAL”

“Orbán construiu uma direita radical populista muito bem-sucedida no projeto de destruir a democracia liberal húngara. Ele conseguiu fazer uma terraplanagem nas instituições e em direitos de minorias para consolidar o que ele chama de ‘democracia iliberal húngara’. É democrático no sentido de ter a maioria, mas é iliberal no sentido de que as minorias se submetam, percam direitos e não tenham voz”.





Magalhães diz ainda que “Orbán é o que Bolsonaro queria ser” e detalha algumas semelhanças entre os dois líderes. “Bolsonaro não conseguiu ter força política para fazer o que o Viktor Orbán fez na Hungria, que é passar o trator nas outras instituições e poderes. Ele também fez discurso de que as minorias devem se adequar às maiorias. Ambos são ultraconservadores e o nacionalismo religioso-cristão do Orbán guarda muita semelhança ao tradicionalismo religioso do bolsonarismo, além de ambos serem governos anticomunistas”, compara.