Desde 2009, partidos políticos brasileiros são obrigados a lançar ao menos 30% de candidaturas femininas para os cargos eletivos. No entanto, os repasses proporcionais de recursos ao percentual de candidaturas começou a ser obrigatório apenas em 2018. Foi essa mudança que fez com que o Congresso Nacional conseguisse eleger 84 mulheres – 77 na Câmara e 7 no Senado – naquele ano, o que representou um aumento de 52,6% da presença feminina nas Casas Legislativas Federais, comparado a 2014.
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Até mesmo nas eleições para a presidência da República esse espaço é suprimido. Prova disso é que, nos últimos 20 anos, apenas três mulheres se candidataram ao cargo. Desta vez, a única participação é da senadora Simone Tebet (MDB-MS). “Espero ver aprovado no Senado o meu projeto que garante 30% de mulheres nos diretórios partidários. Com mulheres nos comandos dos partidos, candidaturas-laranja serão combatidas e serão escolhidas candidatas com real potencial para vencer as eleições", afirmou a parlamentar.
De acordo com a coordenadora da bancada feminina na Câmara Federal, Celina Leão (PP-DF), é preciso criar consciência nos partidos e que as mulheres possam votar em mulheres. “É um esforço coletivo. Os próprios partidos precisam investir e acreditar, além de colocar mulheres candidatas de verdade. As mulheres também precisam votar em mulheres. A questão do fundo eleitoral dobrou o nosso número no parlamento e agora, com mais maturidade, os partidos precisam entender que não existe espaço para retrocesso. A justiça eleitoral tem sido muito rígida, inclusive caçando chapas. É preciso tratar esse tema com seriedade e a mulher ter consciência, encontrar mulheres que se identificam e que possam confiar o voto delas. É assim que vai diminuir essa discrepância na vida pública”, afirmou.
Na avaliação de Andrea Costa, especialista em direito da mulher e direito eleitoral, sócia do Loureiro, Costa e Sousa Advogados, a violência política contra as mulheres é muito grave e afasta a participação delas nesse meio. Segundo ela, essa violência começa dentro dos próprios partidos, ao afastarem as mulheres do cotidiano partidário e das suas manifestações e decisões diárias.
“É preciso assegurar a punição daqueles que de alguma forma procurarem desenvolver propaganda eleitoral difamatória, pois irá coibir maior crime praticado contra as candidatas. Estamos longe do mundo ideal, mas o TSE tem sido um forte parceiro da democracia, assegurando com inúmeros programas e resoluções incentivando a participação das mulheres na política e o cumprimento da legislação pelos partidos”, disse.
Vale lembrar também que, nas eleições de 2022, serão aplicadas duas novas regras: a lei 14.192/21, que tipifica como crime eleitoral as práticas de assediar, constranger, humilhar, perseguir ou ameaçar, por qualquer meio, candidata a cargo eletivo ou detentora de mandato; e a contagem em dobro dos votos recebidos por candidatas para o cálculo destinado à repartição dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC).
Congressistas reivindicam espaço
As mudanças legislativas permitiram garantir um mínimo de mulheres num pleito eleitoral e obrigaram partidos a bancar as campanhas igualitariamente. Afinal, não basta incluir um percentual feminino e não viabilizar financeiramente as campanhas. Aliado a isso, como forma de elevar a participação delas nas legendas, a justiça eleitoral também impôs aos partidos políticos a criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres, com aplicação de multa em caso de descumprimento.
Para a senadora Leila Barros (Cidadania-DF), as mulheres são essenciais no avanço de pautas, mas devem se esforçar para fazer parte da política ativamente. “A conquista do voto feminino assegurou a cidadania política às mulheres brasileiras e criou a perspectiva de uma democracia com a verdadeira participação de todos. Porém, passados 90 anos deste feito, e mesmo que a gente represente mais de 50% do eleitorado nacional, as mulheres ainda não têm a devida representatividade na política. Está mais do que provado que ter mulheres na política traz grandes conquistas. É o caso, por exemplo, da aprovação de matérias importantes, como a Lei Maria da Penha e a Lei que criminaliza o Stalking. A participação feminina nos espaços de poder vem aumentando, mas ainda precisamos avançar muito mais”, afirmou.
Concomitante com este pensamento, a deputada federal Vivi Reis (Psol-PA) destaca que as decisões sobre o rumo de um país devem ser tomadas por pessoas que sentem diariamente a realidade de desigualdades e opressões. “Por isso, é fundamental que tenhamos mulheres na política e que as mulheres possam, através do seu voto, decidir não apenas quem serão seus representantes, mas também serem eleitas para ocupar os espaços da política institucional, principalmente em regiões como a Amazônia e o Norte que já são normalmente sub representadas e invisibilizadas no debate nacional”, disse.
Outro ponto que as separa dos espaços públicos está relacionado ao atentado à honra das candidatas. Em todas as eleições, as mulheres que se candidataram precisavam se preparar emocionalmente para ataques à sua honra e à sua integridade moral. Inclusive, falsas acusações de traição, de vida desregrada, com vídeos falsos de conteúdo sexual, entre outras barbaridades, foram ventiladas para manchar a imagem delas.
"O próprio ambiente político é muito machista. Se uma mulher se posiciona de forma firme dentro do Congresso Nacional, ela é chamada histérica, de maluca. Se o homem se posiciona de forma firme, ele é chamado de corajoso. A gente tem muito que avançar ainda, a sociedade ainda esconde parte desse machismo, debaixo do pano, como se ele não existisse. As mulheres percebem isso todos os dias em casa, no ambiente de trabalho e principalmente no ambiente da política que sem dúvida posso afirmar, é o ambiente mais machista que existe”, pontuou Joice Hasselmann.
A procuradora da Mulher na Câmara, deputada Tereza Nelma (PSDB-AL), também frisa que é preciso credibilizar mais as mulheres. “Nós temos ainda que fazer o exercício de acreditar mais na mulher. Temos que acabar com essas mentiras que inventaram – que mulher não vota em mulher. Isso não existe. Nós gostamos, sim, de participar da política. É só ver o resultado dos partidos, das filiações. 45% das filiações dos partidos são de mulheres. Então por que dizer que mulher não gosta da política? A mulher gosta de política, sim. E só se faz grandes mudanças na política com a participação feminina”, disse.
Maria Stela Grossi, professora aposentada do Departamento de Sociologia da UnB, ainda reforça que os estigmas de que as mulheres não entendem de política são latentes e devem ser rechaçados. “Acho que a única maneira que as mulheres têm de conquistar seu espaço é se mostrarem ativas, participando politicamente. É na participação política que as mulheres mostram o quanto elas estão conscientes”, afirmou.
A especialista também frisa que, ainda que a igualdade esteja sendo conquistada, ainda não pode ser considerada como regra. “Quando as mulheres entram nas competições eleitorais, elas têm que disputar em igualdade de condições. A gente vive um momento em que os preconceitos estão sendo mais denunciados, mas não deixaram de existir, não deixaram de acontecer. O Dia Internacional da Mulher acaba sendo um dia propício para apontar essa maior visibilidade da contribuição feminina para a conquista da democracia”, finalizou.