Jornal Estado de Minas

MÉRITO INDIGENISTA

Ex-presidente da Funai devolve medalha após condecoração de Bolsonaro

Com forma de protesto, o sertanista Sydney Possuelo, ex-presidente da Funai, devolve, nesta quinta-feira (17/3), no Ministério da Justiça, a medalha de mérito indigenista que recebeu há 35 anos. O etnógrafo, que tem atuação reconhecida no Brasil e no exterior pela atuação com povos indígenas isolados, disse ter se sentido ofendido com a condecoração do presidente Jair Bolsonaro (PL).






“Fiquei pensando, se eu me senti ofendido, o que dirá os povos indígenas e aqueles que dedicam a vida nessa defesa eterna da causa?”, questionou. O indigenista anunciou a devolução da comenda e a entrega de uma carta endereçada ao ministro Anderson Torres. Sem mencionar o teor do documento, ele afirmou que a carta é “de fórum íntimo e expressa a sensação de alguém que se sentiu ofendido”.

A intenção de Possuelo é também de chamar atenção para a política anti-indigenista do governo. “A Constituição, no artigo 231, determina e dá um prazo para as demarcações, ele , em sua campanha, diz que não vai demarcar. É uma ação contra os povos indígenas. Por isso, julguei que essa política é a pior de todas. Dos que aceitaram e foram alardeados todos concordam com essa política que o governo vem adotando. Tenho a medalha há 35 anos com orgulho e, de repente, vejo que ela está desmanchando. Eu não vejo de forma nenhuma ele tendo esse cuidado com esses povos”, explicou.


De acordo com o sertanista, entidades indigenistas, como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), estão se movimentando para que a Justiça se manifeste em relação à condecoração direcionada ao presidente da República. A homenagem foi duramente criticada no Congresso e nas redes sociais. 





Vida dedicada à causa indígena
O defensor indigenista recebeu sua comenda em 1987. A medalha de mérito indigenista foi uma homenagem criada em 1972 para condecorar aqueles que dedicam a vida — ou parte dela — à causa.

Possuelo, em sua gestão à frente da Fundação Nacional do Índio (Funai), na década de 1990, participou da demarcação das terras Yanomami e de mais 166 novas demarcações de outros povos indígenas — a quantidade duplicou sob sua gestão. Houve, também, um maior cuidado com os índios isolados, com ações voltadas à proteção de comunidades ameaças por madeireiras e garimpo ilegal na Amazônia.

“Foram 48 anos de indigenismo e sou muito grato à vida por ter dado a oportunidade de trabalhar com índios. A convivência com eles abre a cabeça e o coração para sentimentos perdidos na sociedade. Esse prestígio cair na mão de pessoas erradas é desonroso”, considerou.