Assim como no cenário nacional, a eleição para governador de Minas caminha para também ser uma disputa entre dois candidatos – o governador Romeu Zema (Novo) e o ex-prefeito de Belo Horizonte Alexandre Kalil (PSD), com poucas chances para um terceiro nome na disputa. Esta é a avaliação de Felipe Nunes, CEO da Quaest e coordenador da pesquisa de intenção de voto Quaest/Genial em Minas, divulgada neste mês em primeira mão pelo Estado de Minas.
“Dificilmente, Minas terá uma terceira via nesta eleição. Primeiro, porque os dois principais candidatos, Zema e Kalil, têm baixa rejeição. Segundo, porque o candidato à reeleição aparece desde já muito forte. O cenário mais provável é a polarização nacional se repetir em Minas também”, afirma Nunes em entrevista ao Estado de Minas.
O cientista político avalia ainda o cenário nacional, com a polarização entre o presidente Jair Bolsonaro (PL), que lança hoje sua candidatura à reeleição, e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), considerando as vantagens e desafios de cada um deles diante do eleitorado.
Nunes é Ph.D. em ciência política pela Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA) e professor de comunicação política e métodos quantitativos na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Fundador da Quaest, em 2016, Nunes já coordenou pesquisas para vários partidos, governos e empresas do país.
O cientista político também é o inventor e detentor da patente do Índice de Popularidade Digital (IPD) e recebeu prêmios da American Political Science Association (APSA), do Clube de Associados em Marketing Político (Camp), do Cepesp-FGV e da divisão de doutores da UCLA.
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Já na disputa nacional, os residentes de Minas ouvidos pelo levantamento deram a Lula 46%, ante 21% de Bolsonaro. O cenário é semelhante ao respondido pelos brasileiros na pesquisa nacional, em que os candidatos obtiveram 45% e 25%, respectivamente. Leia abaixo a íntegra da entrevista.
Nas eleições em Minas há espaço para outros candidatos ao governo além de Romeu Zema e Alexandre Kalil?
Dificilmente Minas terá uma terceira via nesta eleição. Primeiro, porque os dois principais candidatos, Zema e Kalil, têm baixa rejeição. Segundo, porque o candidato à reeleição aparece desde já muito forte. O cenário mais provável é a polarização nacional se repetir em Minas também.
A eleição para o governo de Minas Gerais pode ser definida no primeiro turno?
A eleição em Minas tem grandes chances de ser definida no primeiro turno se Zema e Kalil polarizarem demais a disputa. Outros nomes podem desistir, ou mesmo serem candidatos deles mesmos, sem apoio, sem força política.
Zema vai tentar se desvincular de Bolsonaro ao invés de retribuir a ajuda de 2018?
A pesquisa Quaest/Genial sugere que Zema tenha que se desvincular de Bolsonaro para ser competitivo, mas esse é um fator que ele não controla. As campanhas adversárias farão de tudo para colar Zema na rejeição de Bolsonaro. Por outro lado, a aliança com Lula parece muito importante para Kalil e vice-versa.
Ao deixar a prefeitura, Kalil disse que vai andar pelo estado. Qual a importância disso?
A diferença em intenções de voto entre Zema e Kalil pode ser explicada em grande medida pelo grau de desconhecimento que Kalil tem fora da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH). Ser conhecido é a primeira tarefa de quem quer se candidatar ao governo. As viagens e reuniões no interior vão servir para isso, principalmente no Triângulo e no Sul de Minas, onde Zema tem grande vantagem hoje.
Quais os principais pontos que devemos considerar no cenário eleitoral nacional?
Para analisar política é fundamental entender o pano de fundo econômico e como as narrativas encontram aderência na sociedade. A percepção sobre a economia continua sendo muito importante, mas o confronto de narrativas pode fazer com que, mesmo em cenários econômicos negativos, o presidente encontre uma forma de terceirizar a responsabilidade dos problemas e se livre da culpa política. O melhor exemplo disso é o aumento dos combustíveis neste momento em que Bolsonaro está tentando dizer, de todas as maneiras, “isso não é culpa minha, isso é culpa da guerra e da Petrobras”. Ambos vencem e perdem parte da narrativa. Aquele que conseguir mobilizar melhor seus eleitores em torno do que é vantagem pra ele e desvantagem pro outro deve ganhar a eleição.
Até que ponto esta questão econômica influencia na disputa entre Bolsonaro e Lula?
É comum dizer que presidentes que buscam a reeleição em momentos econômicos favoráveis tendem a ganhar, e em momentos de baixa econômica tendem a perder. Este cenário estrutural é fundamental para entender por que Lula está tão na frente de Bolsonaro. Porque ele é visto pela população como o principal nome capaz de resolver os problemas econômicos. Na pesquisa nacional, a gente perguntou qual a principal razão para se votar em um candidato. A primeira, para 43%, é a “situação econômica no país”; e a segunda, para 17%, uma “boa gestão no passado”.
Quais os principais aspectos que favorecem e atrapalham Bolsonaro?
Bolsonaro tem hoje a seu favor que os brasileiros concordam que a pandemia foi grande demais e que qualquer um teria dificuldade de lidar com isso, além de ter conseguido vencer a batalha em torno da ideia de que o isolamento foi exagerado e atrapalhou demais a economia. Por outro lado, pesa contra o presidente que para um pedaço enorme da sociedade o Brasil poderia ter enfrentado melhor a pandemia se ele não tivesse feito campanha contra a vacina. As pessoas também concordam que Bolsonaro exagerou quando disse que a COVID era simplesmente uma gripezinha.
Quais os principais aspectos que favorecem e atrapalham Lula?
A vantagem que o ex-presidente Lula tem é de que para 60% dos eleitores o seu governo de 2003 a 2010 foi classificado como ótimo ou bom. Isso é muito positivo para ele. Por outro lado, metade do eleitorado acredita que ele foi condenado de maneira correta, sinalizando que ele pode ter desgaste nesta pauta.
Como Bolsonaro pode reduzir o índice de rejeição?
Bolsonaro tem 63% de rejeição, e seu governo 49%. Ou seja, na visão dos eleitores, o governo é melhor que o próprio presidente. Além da crise econômica e da pandemia, muito dessa rejeição tem a ver com a postura, que no senso comum chamam de “Bolsonaro fala bobagem demais”. A moderação desse discurso vai ser fundamental para que o presidente consiga melhorar a sua imagem.
Como Lula pode reduzir o índice de rejeição?
Lula tem 42% de rejeição. É mais baixo porque ele tem um contingente de militantes muito expressivo no país. Na pesquisa, 38% disseram que votam com certeza e outros 18% não veem problemas em votar nele. Esse baixo índice está associado, na minha visão, ao fato de que aos poucos foi se constituindo na sociedade brasileira a ideia de que Lula foi injustiçado. Não de que ele seja inocente, mas prevalece a ideia de que ele foi perseguido.
Será uma eleição polarizada entre Lula e Bolsonaro?
Por um lado, a pesquisa mostra que aproximadamente 50% dos eleitores ainda não escolheram seu candidato. Por outro, o levantamento mostra que aqueles que se decidiram estão com Lula ou Bolsonaro. Ou seja, são indicadores muito favoráveis à polarização. Difícil imaginar que a gente vai escapar dessa dualidade entre os dois. Até porque, a terceira via virou uma grande frustração para o eleitorado. Mesmo com 25% querendo uma opção diferente, eles não encontram em nenhum dos outros pré-candidatos uma posição competitiva.
Qual a consequência dessa polarização nacional? Isso também afeta os estados?
Há uma grande chance de que Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro reproduzam o cenário nacional. Caso esse quadro se mantenha, a politização vai forçar um embate no eleitorado que pode ter duas consequências: aumentar o nível de politização da sociedade ou provocar um desgaste social tão grande que todos vão se individualizar, o que seria muito ruim, porque depois da eleição alguém vai governar para todo mundo.