A oposição quer barrar o decreto do presidente Jair Bolsonaro (PL), que concedeu graça (indulto) ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado a 8 anos e 9 meses de prisão em regime fechado por estimular atos antidemocráticos e incitar ataques a integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF), recorrendo à Justiça e com projetos no Congresso para anular os efeitos do perdão presidencial ao bolsonarista. A Rede, o PDT, o Cidadania e o senador Renan Calheiros (MDB-AL) entraram com ações, na manhã de ontem, no STF para questionar o perdão presidencial concedido por Bolsonaro a Daniel Silveira. Em um dos processos, o partido diz que aceitar o indulto seria um incentivo ao “atentado institucional” e um “prêmio de impunidade”. A ministra Rosa Weber foi escolhida como relatora da ação.
O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), líder da oposição no Senado, anunciou o recurso à Suprema Corte. “Crimes contra a ordem constitucional não podem ser passíveis desse benefício e iremos ao STF para derrubar esse desmando por meio uma ADPF (Ação por Descumprimento de Preceito Fundamental)”, afirmou o senador. Segundo Randolfe, “concessão de graça” não altera a inelegibilidade da Ficha Limpa. “Daniel Silveira seguirá banido da vida pública caso se livre da cadeia”, disse.
“O presidente da República, com a edição do decreto, transmite uma mensagem absolutamente temerária à população brasileira: trata-se de um verdadeiro e puro incentivo ao crime. Uma carta branca. Um salvo-conduto apriorístico. Uma garantia de impunidade. A certeza de que, do ponto de vista sistêmico, decisões judiciais que afetarem os seus círculos próximos não subsistirão”, diz o texto da ação.
O PDT, por sua vez, também entrou com uma ADPF, com pedido de liminar, e argumentou que, caso não fosse esse o instrumento jurídico adequado, que ela seja convertida em uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI). O PDT acredita que há uma hipótese clara de “desvio de finalidade” do indulto do presidente. “Não é constitucionalmente sustentável utilizar-se de 'indulto individual' para conceder verdadeiro 'salvo-conduto' a condutas penalmente reprováveis, incontestavelmente praticadas por agente político no exercício de função relevante”.
Renan Calheiros criticou a decisão do presidente. Renan classificou o decreto do chefe do Executivo federal de “ilegal, imoral e inconstitucional”. “Derrotar o fascismo envolve duas frentes: jurídica e política. Além da ação judicial ao STF, apresento hoje (ontem) decreto legislativo sustando o indulto presidencial. O Senado não pode faltar à democracia”, escreveu o senador nas redes sociais. A ação de Renan Calheiros é uma reclamação constitucional à corte e pede a suspensão do decreto de Bolsonaro. Além disso, conforme explica o processo, a reclamação constitucional é distribuída ao relator da ação original – isto é, da condenação de Daniel Silveira. Neste caso, a ação movida pelo senador ficará com o ministro Alexandre de Moraes.
No Congresso
Na esteira das ações contra a graça constitucional concedida por Bolsonaro, o senador Fabiano Contarato (PT-ES) apresentou ontem projeto de decreto legislativo (PDL) para sustar o decreto. Contarato escreveu em nota: “Ao conceder graça a uma pessoa condenada no dia anterior pela Suprema Corte do país, o presidente da República afronta diretamente esse princípio basilar, que sustenta, ao lado de outros princípios constitucionais, a democracia brasileira”.
“Portanto, tem-se como cláusula implícita, na Constituição Federal, que esses crimes também sejam insuscetíveis de graça ou anistia, visando, assim, à proteção do sistema constitucional e ao fortalecimento da base da nossa democracia. Além disso, o decreto configura desvio de finalidade do ato e de ilegalidade”, finalizou o senador da República.
No documento apresentado, Contarato afirmou que há desvio de finalidade do ato e que Bolsonaro também já proferiu ofensas verbais ao STF. “Declarando que a Corte ‘atrapalha’ o país, sugerindo que seus membros ‘calassem a boca’, tendo criticado publicamente diversas vezes o ministro Alexandre de Moraes.” Moraes é o relator do inquérito que investiga os atos antidemocráticos na Suprema Corte, o mesmo que condenou Silveira.
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou, em nota, que o perdão da pena concedido pelo presidente Bolsonaro (PL) a Daniel Silveira deve ser cumprido. De acordo com Pacheco, “a possível motivação político-pessoal” não invalida o ato, embora possa “fragilizar a Justiça penal”.
“Há uma prerrogativa do presidente da República prevista na Constituição Federal de conceder graça e indulto a quem seja condenado por crime. Certo ou errado, expressão de impunidade ou não, é esse o comando constitucional que deve ser observado e cumprido”, disse Pacheco em nota. Segundo Pacheco, apesar de não ter poder para reverter o perdão, o Congresso poderá votar uma mudança na lei para impedir que decisão semelhante possa ser tomada pela Presidência da República no futuro.