Jornal Estado de Minas

SAÚDE

BH: vereadores querem que prefeito reveja indicação da secretária de Saúde

Os vereadores de BH enviaram, na quinta-feira (29/4), uma carta ao prefeito de Belo Horizonte, Fuad Noman (PSD), pedindo que ele reconsidere a nomeação da secretária de Saúde, Cláudia Navarro Carvalho Duarte Lemos. A indicação da médica tem gerado tensão e questionamentos.




 
No documento, as vereadoras Bella Gonçalves (PSOL), Iza Lourença (PSOL), Duda Salabert (PDT), Macaé Evaristo (PT) e o vereador Pedro Patrus (PT) posicionam-se a favor do Sistema Único de Saúde (SUS), das políticas públicas de saúde de Belo Horizonte e pedem a Fuad Noman que reconsidere a indicação da secretária de Saúde para o cargo por ser representante do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG).

Intitulada "CRM NO SUS-BH, NÃO!", a carta destaca um documento anterior, enviado ao prefeito em 28 de março, com a assinatura de 40 entidades, além de vereadores e coletivos, que questionavam a nomeação de alguém vinculado ao CRM-MG. 
 
Bella Gonçalves explica que outra carta foi necessária não só pela posição que a secretária ocupou no CRM "nas últimas décadas", mas há questões e preocupações sobre como ela tem atuado desde que foi nomeada ao cargo. "O CRM é uma entidade de classe que tem se orientado por uma lógica privatista da saúde, a secretaria fez defesas controversas da cloroquina e de outros métodos duvidosos durante a pandemia, além de ter processado a Prefeitura de Belo Horizonte pela atuação antimanicomial deste município nos Cersam's (Centro de Referência em Saúde Mental - CERSAM)".




 
Por isso, enfatiza Bella Gonçalves, "entendemos que um ator que se colocava antagonista do SUS e antagonista da rede de saúde mental de Belo Horizonte vir ocupar um espaço de secretaria pode simbolizar e levar a um desmonte do SUS, um desmnte da saúde da capital", disse. 
 
Ainda de acordo com ela, os vereadores foram procurados "por uma centena" de movimentos sociais e resolveram se posicionar diante do prefeito. "Sabemos que não temos o poder de decidir os secretários. Obviamente, é uma prerrogativa do prefeito, mas podemos, sim, nos posicionarmos politicamente e vamos fiscalizar a atuação da secretária para que, de fato, não haja nenhum retrocesso na defesa do SUS."
 
Para Bella Gonçalves, 'a saída do ex-secretário JacKson Machado e a entrada de Cláudia Navarro é uma contradição' (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press )
 
 
Para Bella Gonçalves, "a saída do ex-secretário JacKson Machado e a entrada de Cláudia Navarro é uma contradição, porque Belo Horizonte ficou conhecida como a cidade que melhor enfrentou a pandemia da COVID-19, com atuação exemplar em defesa da ciência e da vida, além de ter contado o empenho de todos os profissionais e do Comitê da COVID-19. E uma das primeiras ações da Cláudia Navarro foi a extinção do Comitê COVID-19 e a diminuição do envio de boletins diários para o acompanhamento da evolução ou não da pandemia na cidade, já mostrando a que veio e sua posição. Vamos seguir fiscalizando e dialogando com o prefeito em relação à condução da Secretaria de Saúde".



Duda Salabert alerta que uma preocupação é desmonte das políticas públicas que garantem espaços de atendimento humanizado (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


Duda Salabert pede mais diálogo e um canal de comunicação. "Junto de outras vereanças, recebi a demanda de organizações da saúde, demonstrando legítima preocupação com os posicionamentos da nova secretária de saúde. Estamos pedindo que seja reconsiderada a indicação da secretária e que sejam abertos canais de diálogo mais amplos e democráticos com organizações e coletivos com atuação em prol do progresso e aprimoramento da Saúde municipal."

Entre os vários sinais de incômodo com a nomeação, Duda Salabert ressalta um alerta específico. "Estamos motivados principalmente pelo risco de privatização de setores da Saúde municipal e desmonte das políticas públicas que garantem espaços de atendimento humanizado. Também reforçamos a necessidade de que a saúde esteja alinhada aos princípios do SUS, de universalidade, integralidade e equidade."
 
O vereador Pedro Patrus (PT) também teceu um parecer quanto à nomeação de Cláudia Navarro. "Nossa apreensão é a ligação da nova secretária com o Conselho Regional de Medicina. Sabemos e é notório que o CRM durante a pandemia sempre teve posições negacionistas em todos os cantos do nosso estado. Estamos muitos preocupados em defender o Sistema Únido de Saúde de Belo Horizonte."




 
Pedro Patrus chama a atenção para as decisões da secretária. "Assim que ela foi nomeada, o comitê de infectologistas, que atuou tão bem no combate à COVID-19, foi dissolvido e, agora, as máscaras já foram retiradas. Então, estamos mesmo muito preocupados da nova secretária ter e continuar sua relação com o Consellho Regional de Medicina e trazer toda a idelologia da entidade para dentro do SUS-BH. Essa é a grande questão. Temos pedido e tentado conversar e dialogar com o Poder Executivo a respeito deste grande perigo."
  
Em entrevista ao Estado de Minas em 30 de março, Cláudia Navarro Carvalho Duarte Lemos, informou oficialmente sua saída do cargo de conselheira do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG), por "não ser compatível" com o mais novo cargo. Além de conselheira, ela presidiu a entidade entre 2018 e 2020. Formada em medicina pela UFMG, fez residência médica em ginecologia e obstetrícia no Hospital das Clínicas. Trabalhou por 30 anos na rede SUS-BH, como médica na Atenção Primária e Secundária. É mestre e doutora na área de reprodução humana. 

Pedimos uma posição do prefeito Fuad Noman via assessoria de comunicação, mas até o momento não obtivemos retorno. 

A carta, na íntegra


Belo Horizonte, 29 de abril de 2022

Exmo. Sr. Fuad Norman

Prefeito de Belo Horizonte,

No dia 28/03/22, foi entregue ao senhor uma carta assinada por mais de 40 entidades, controle social, coletivos, movimentos, organizações e mandatos de parlamentares contrários à nomeação de representante do Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM-MG) para assumir a Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. De acordo com o controle social e os movimentos sociais, coletivos, organizações e entidades, a designação de uma representante do Conselho Regional de Medicina (CRM) para gestão  da Secretaria Municipal de Saúde aponta para o assolamento das diretrizes da saúde pública municipal e do SUS na cidade.





Presenciamos manifestações através da imprensa, matérias  sobre o Conselho Federal de Medicina (CFM) e a maioria dos Conselhos Regionais, inclusive  o de Minas Gerais (CRMMG), na pandemia de COVID-19. Essas entidades médicas, das quais se esperava que, em momento tão crítico para a Saúde Pública do país, cumprissem seu papel institucional de zelar pela ética e pelas boas práticas médicas, não hesitaram em manter uma cumplicidade com o negacionismo e a política genocida do Governo Federal. Durante toda a pandemia o CFM e suas afiliadas optaram por manter apoio político irrestrito ao governo federal, fazendo vistas grossas ao uso indiscriminado e à propaganda realizada por médicos de medicamentos e tratamentos sem nenhuma comprovação de efetividade e que, ao contrário, trouxeram sérios danos à saúde da população. Com esta posição, o CFM e os CRMs contribuíram com o número trágico de mortes e sequelas da COVID-19, já que ficou amplamente demonstrado que grande parte das mortes e adoecimentos poderiam ter sido evitados, se tivesse sido outra a política sanitária adotada no Brasil. A cumplicidade do CFM e dos CRMs com o governo federal valeu seu indiciamento pela CPI da COVID no Senado Federal e na Justiça

A despeito de todas as manifestações contrárias advindas da sociedade civil em relação à nomeação da sra. Cláudia Navarro como Secretária de Saúde, sabemos que não nos cabe, enquanto parlamentares da Câmara Municipal de Belo Horizonte, deferir ou indeferir sua decisão quanto à composição da equipe de governo. Entretanto, gostaríamos de manifestar que, diante de posições públicas da nova gestora da Secretaria de Saúde anterior e agora, na condição de secretária, discordamos da indicação. Estamos e estaremos atentos ao cumprimento das políticas municipais  de saúde que garantem o direito à saúde de acordo com as diretrizes do SUS e a Constituição Federal de 1988.

O Sistema Único de Saúde (SUS), ao longo de 32 anos de existência, foi palco de diversos avanços na perspectiva da universalização e qualidade  do atendimento oferecido à população. O princípio de universalidade que conduz o SUS possibilita um trabalho humanizado, pautado na ciência e no compromisso com a saúde pública, respeitando a dignidade humana independentemente da origem e condição social, econômica e política do paciente.

A Lei da Reforma Psiquiátrica, sancionada em 2011, também é um marco para os movimentos que defendem a saúde pública e de qualidade em nosso país. Há, ainda, tantos outras conquistas que concorreram para a consolidação de novos padrões de atendimento à saúde da população de acordo com as necessidades dos pacientes: o novo modelo de assistência obstétrica que deu origem às políticas de humanização do parto e nascimento e de saúde sexual e reprodutiva, a Estratégia de Saúde da Família e o Programa Nacional de DST/AIDS.





Diante disso, esperamos o total cumprimento das medidas já estabelecidas pela política de Estado no que concerne à saúde e a consolidação no SUS na cidade, com a garantia do pleno atendimento de todos os usuários, seja em tratamentos, consultas, acompanhamentos, diagnósticos, intervenções, distribuição de medicamentos e outros serviços. E que  tais medidas sejam cumpridas no bojo da perspectiva do respeito aos princípios e direitos constitucionais, sem nenhuma forma de discriminação, seleção, favorecimento ou qualquer critério diferente da impessoalidade, imparcialidade, moralidade e gratuidade. E exercendo o diálogo e  escuta  do  controle  social.

Nos, vereadoras e  vereadores  do PT, PSOL e  PDT,  do campo  progressista  da Câmara Municipal, manifestamos totalmente  contrários às politicas  que  ferem o  direito  da  população, como a privatização da saúde municipal, e os desmontes das políticas públicas que garantem espaços de atendimento humanizado, bem como reafirmamos que a postura da nova secretária deve estar alinhada aos princípios do SUS (universalidade, integralidade e equidade) independentemente de suas próprias convicções acerca da promoção da saúde em Belo Horizonte.

Solicitamos que o Poder Executivo Municipal reconsidere a indicação da secretária de saúde e dialogue com  o controle  social os movimentos, entidades, organizações e coletivos que atuam a favor do progresso e humanização da saúde pública municipal, garantindo a escuta e participação efetiva da população nas tomadas de decisões, pois sem participação popular e transparência não há democracia.

Respeitosamente,

Assinam,
 
Bella Gonçalves (PSOL-BH), 
Iza Lourença (PSOL-BH)
Duda Salabert (PDT-BH),
Macaé Evaristo (PT-BH)
Pedro Patrus (PT-BH)