Uma das principais bases de apoio do presidente Jair Bolsonaro (PL), os policiais federais estão insatisfeitos com a sinalização de que o chefe do Executivo não cumprirá a promessa de reestruturação da corporação e de que incluirá a categoria no reajuste linear do funcionalismo, de 5%, considerado insuficiente por eles. Na semana passada, houve manifestações em vários estados para pressionar o Planalto.
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Guedes sobre servidores: 'Qual o sentido de pedir reajuste agora?'Bolsonaro volta a prometer reajuste para servidores, mas sem recompor inflaçãoPromessa de reajuste gera ceticismo entre servidores e ruído no congressoFux defende que judiciário tenha reestruturação de carreira próprioBarroso: 'Na democracia, a verdade não tem dono, e a mentira tem'Bolsonaro: 'Lula acabaria com a guerra na Ucrânia tomando cerveja'Na última sexta-feira, a Federação Nacional dos Policiais Federais (Fenapfe), avisou, em nota, que os agentes "não receberão esse duro golpe calados". "Em diferentes governos, a Polícia Federal conquistou avanços institucionais importantes. O atual governo, no entanto, se posiciona como exceção, fragilizando a instituição", diz o comunicado da entidade, que reúne delegados federais, policiais e peritos criminais. De acordo com a Fenapfe, um eventual cancelamento da reestruturação para a categoria seria "grave e inadmissível".
Vice-líder do governo na Câmara, Aluisio Mendes (PSC-MA) afirmou que, assim como outros integrantes da PF no Congresso, travou uma "dura batalha" para manter os R$ 1,7 bilhão no Orçamento. "Fomos surpreendidos com essa decisão. Conversei com o presidente, e ele disse que ainda não tinha tomado decisão de aumento linear, mas estamos preocupados com isso. Se acontecer, vai ser, sem dúvida, uma quebra de compromisso do presidente com a base oficial, com os policiais federais que compõem uma forte base de apoio, que foi muito importante há quatro anos", ressaltou, em referência às eleições de 2018.
Mendes disse que se reunirá, amanhã, com o ministro da Justiça, Anderson Torres, para "negociar que o compromisso do presidente seja cumprido". "Ele fez esse compromisso com todos os deputados que representam as polícias federais no Congresso desde a reforma da Previdência. Fez esse compromisso conosco. Esperamos que seja assegurado pelo governo. Se não acontecer, prevejo problemas do governo com as carreiras de policiais federais", destacou. "Há um clima de insatisfação muito grande, um clima muito ruim, mas eu sou otimista. Há tempo e espaço para negociar", acrescentou.
Desgaste
O professor de estudos brasileiros da Universidade de Oklahoma (EUA) Fabio de Sá e Silva apontou desgaste da classe nos últimos anos. "Talvez seja uma boa hora de a PF se dar conta de que tem sido manipulada e desvalorizada pelo governo Bolsonaro, que demitiu delegados que investigavam o governo e transformou uma parte da corporação em polícia política", declarou.
Já o cientista político Leonardo Queiroz Leite — doutor em administração pública e governo pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo (FGV-SP) — não acredita que o descumprimento de promessas será suficiente para que a categoria deixe de respaldar o presidente. "Os Bolsonaros têm uma identificação forte com a Polícia Federal. O corpo da polícia tem uma mentalidade muito próxima daquilo que prega e defende o presidente. As grandes linhas da sua política, da ideologia, estão muito próximas daquilo que eles defendem. Então, não me parece que eles estejam próximos de romper com Bolsonaro", avaliou.
Segundo Leite, a probabilidade é que haja uma divisão na corporação a respeito do tema. "Os servidores públicos federais são muito articulados, com uma capacidade de pressão muito considerável. Pode haver um racha ou outro dentro da instituição, mas é uma pressão muito corporativa da carreira. Do ponto de vista político, não", destaca.
Outra expectativa da Polícia Federal para o governo Bolsonaro era a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 412/2009, que versa sobre autonomia funcional, administrativa, financeira e orçamentária da corporação. No entanto, até o momento, o projeto está parado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados.