Um protesto contra a homofobia, misoginia e racismo foi realizado, na noite desta quarta-feira (29/6), após declarações feitas pelo vereador de Pedra do Indaiá, no Centro-Oeste de Minas, Reveter Rainer (PSL). O parlamentar atacou a comunidade LGBTQIA+ e ofendeu mulheres depois de uma postagem feita pela prefeitura em apoio ao Dia Internacional do Orgulho.
A postagem feita no Instagram oficial da prefeitura, nessa terça-feira (28/6), carrega as cores da bandeira LGBTQIA+ com os dizeres: “o amor sempre vence”.
Na legenda consta: “Pedra de todas as cores, todas as formas, todas as lutas”.
O post foi altamente criticado pelo vereador em uma transmissão ao vivo feita na noite de ontem.
“Essa conversinha, ladainha do “carai”, pensa para ver, prefeitura posta lá, dia internacional do orgulho sei lá do carai, caxxx... todo dia eles inventam um nome, e a gente que se vira para acompanhar essa palhaçada”, atacou.
Na contra mão das declarações, o vereador se disse livre de preconceitos.
“Ninguém nunca me viu com preconceito ou racismo, nada. Você nunca viu e nem vai ver. Trato qualquer um, homossexual, lésbica, seja o que for, exatamente da mesma forma que trato qualquer pessoa”, afirmou, se contradizendo na sequência.
“Se isso não for suficiente vai para o meio do inferno”, atacou.
Reveter Rainer não parou por aí.
“A gente tem que concordar com isso toda hora. Tem que andar abraçado, bater palminha, postar. É brincadeira. Todo mundo é livre. Orgulho é o “carai””, falou, seguindo com o discurso da “família tradicional”.
“E o pai de família que dá um duro danado para ser um pai de respeito? E a mãe de família? Cadê o dia internacional da família brasileira, dia da mãe de respeito que não trai seu marido? Dia internacional do marido que não trai sua esposa, que não sai por aí tocando bicho?”.
O parlamentar ainda se disse “estressado” com o que chamou de “situação”.
Na mesma linha, ofendeu mulheres e, ao mesmo tempo, afirmou que a comunidade LGBTQIA+ “quer dominar o mundo”.
“Primeiro vem esse feminismo, a gente fica meio imparcial, deixando de boa. Presta atenção que vou te falar, mulher não conquistou nada, não, foi dado. Vocês não querem só respeito, vocês querem dominar os homens, dominar o mundo. Vocês querem essa briga mesmo?”, afirmou em tom de revolta.
“Quanto tempo vocês acham que vocês duram? Porque nós, como homens, respeitamos vocês muito. Sempre respeitamos. Mas para vocês não é suficiente. Vocês querem que a gente seja capacho. Mulher detesta capacho. Na hora que a gente virar capacho vai meter um chifre na nossa cabeça”, disparou.
E continuou:
“O que vocês querem? Que merda é essa? Até quando vamos ter que engolir isso? Todo dia essa palhaçada afrontando a família. Vi crente curtindo isso. Que vergonha. Vai ler sua bíblia”, afirmou, classificando como “pouca vergonha”.
“Prefeitura apoia essa pouca vergonha”.
Reveter ainda acusou a comunidade de querer corromper.
“Vão corromper seus filhos na escola, vão corromper seus filhos na rua, corromper seus filhos nas redes sociais. Não vai brigar com ninguém, não, mas defenda seus princípios, defenda seus direitos, defenda aquilo que você acredita, defenda a bíblia, defenda a vontade de Deus, ou eles vão te atropelar que nem um rolo compressor. Já chega. Até quando vamos viver nessa idiotice aqui?”.
Entrando no tema de racismo disparou:
“Não pode ter uma propaganda se não tiver um negro. Não pode ter um filme se não tiver um negro. Quer um racismo maior que isso? Ter um negro lá obrigado por lei. Isso é humilhante”.
O vídeo foi apagado nesta quarta-feira (29/6) do perfil no vereador. A reportagem tentou contato com ele, porém, não foi encontrado até o fechamento desta matéria.
Protesto
As declarações geraram revolta nos moradores que foram às ruas do município de aproximadamente 4 mil habitantes. Uma carreata foi realizada e uma comissão formada para exigir um pedido público de desculpas, além da cassação do mandato do vereador.
Servidor público, Aroldo Moraes se sentiu ofendido.
“Trabalho na prefeitura, sou gay, me senti lesado pelo vídeo, pelas lives dele. Me senti ultrajado, porque tenho irmã, mãe e ele ofendeu todas. Estamos cansados deste tipo de gente, opinião, expressão. Todo mundo pode se expressar, mas com respeito, no mínimo”, lamentou.
Uma nota de repúdio apresentada pelos próprios vereadores contra o parlamentar foi aprovada na reunião ordinária desta quarta-feira (29/6).
Prefeitura
Em nota, a prefeitura de Pedra do Indaiá afirmou que “acredita que é dever do poder público, bem como de qualquer cidadão, respeitar todos os segmentos da sociedade e suas orientações (seja religiosa, cultural, ou quaisquer outras afins).”
“A publicação feita pelo perfil da administração no dia 28/06/2022, em comemoração ao Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+ tem a conotação de cumprimentos e apoio à comunidade que merece todo nosso respeito”, afirmou.
Dizendo que “apesar de ser terrivelmente contrária ao posicionamento expresso pelo vereador”, e a administração municipal não fará pronunciamento quanto às declarações do parlamentar em questão.
*Amanda Quintiliano especial para o EM
O que é homofobia?
A palavra “homo” vem do gregro antigo %u1F41μ%u03CCς (homos), que significa igual, e “fobia”, que significa medo ou aversão. Em definição, a homofobia é uma “aversão irreprimível, repugnância, medo, ódio e preconceito” contra casais do mesmo sexo, no caso, homossexuais.
Entretanto, a comunidade LGBTQIA+ engloba mais sexualidades e identidades de gênero. Assim, o termo LGBTQIA fobia é definida como “medo, fobia, aversão irreprimível, repugnância e preconceito” contra lésbicas, gays, bissexuais, transsexuais, não-bináres, queers (que é toda pessoa que não se encaixa no padrão cis-hetero normativo), itersexo, assexual, entre outras siglas.
A LGBTQIA fobia e a homofobia resultam em agressões físicas, morais e psicológicas contra pessoas LGBTQIA .
Homossexualidade não é doença
Desde 17 de maio de 1990, a a Organização Mundial da Saúde (OMS) excluiu homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID). Antes desta data, o amor entre pessoas do mesmos sexo era chamado de "homossexualismo”, com o sufixo “ismo”, e era considerado um “transtorno mental”.
O que diz a legislação?
Atos LGBTQIA fobicos são considerados crime no Brasil. Entretanto, não há uma lei exclusiva para crimes homofóbicos.
Em 2019, após uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que os crimes LGBTQIA devem ser "equiparados ao racismo". Assim, os crimes LGBTQIA fobicos são julgados pela Lei do Racismo (Lei 7.716, de 1989) e podem ter pena de até 5 anos de prisão.
O que decidiu o STF sobre casos de LGBTQIA+fobia
- "Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito" em razão da orientação sexual da pessoa poderá ser considerado crime
- A pena será de um a três anos, além de multa
- Se houver divulgação ampla de ato homofóbico em meios de comunicação, como publicação em rede social, a pena será de dois a cinco anos, além de multa
Criminalização no Brasil
Há um Projeto de Lei (PL) que visa criminalizar o preconceito contra pessoas LGBTQIA no Brasil. Mas, em 2015, o Projeto de Lei 122, de 2006, PLC 122/2006 ou PL 122, foi arquivado e ainda não tem previsão de ser reaberto no Congresso.
Desde 2011, o casamento homossexual é legalizado no Brasil. Além disso, dois anos mais tarde, em 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou e regulamentou o casamento civil LGBTQIA no Brasil.
Direitos reconhecidos
Assim, os casais homossexuais têm os mesmos “direitos e deveres que um casal heterossexual no país, podendo se casar em qualquer cartório brasileiro, mudar o sobrenome, adotar filhos e ter participação na herança do cônjuge”. Além disso, os casais LGBTQIA podem mudar o status civil para ‘casado’ ou ‘casada’.
Caso um cartório recuse realizar casamentos entre pessoas LGBTQIA , os responsáveis podem ser punidos.
Leia mais: Mesmo com decisão do STF, barreiras impedem a criminalização da LGBTQIA fobia
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Como denunciar casos de LGBTQIA+fobia?
As denúncias de LGBTQIA fobia podem ser feitas pelo número 190 (Polícia Militar) e pelo Disque 100 (Departamento de Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos).
O aplicativo Oi Advogado, que ajuda a conectar pessoas a advogados, criou uma ferramenta que localiza profissionais especializados em denunciar crimes de homofobia.
Para casos de LGBTQIA fobia online, seja em páginas na internet ou redes sociais, você pode denunciar no portal da Safernet.
Além disso, também é possível denunciar o crime por meio do aplicativo e do site Todxs, que conscientiza sobre os direitos e apoia pessoas da comunidade LGBTQIA .