A ampliação e a criação de benefícios sociais incluídos na Proposta de Emenda à Constituição (PEC) apelidada de "PEC das Bondades" ou "PEC Kamikaze", aprovada pelo Congresso a menos de três meses da eleição, vão chegar a uma fatia do eleitorado em que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) atualmente sustenta uma significativa vantagem sobre o presidente Jair Bolsonaro (PL).
Segundo o Datafolha, o petista tem 56% das intenções de voto entre pessoas com renda até dois salários mínimos enquanto Bolsonaro fica com 20% dessa faixa. A situação se inverte quando se observam os índices dos eleitores mais ricos.
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Para Esther Solano, professora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e pesquisadora do conservadorismo brasileiro, é esperada a subida dos índices do atual presidente quando os benefícios previstos na PEC começarem a ser distribuídos.
"Se antes Bolsonaro só tinha questões morais/ideológicas para apresentar ao grande público, agora vai ter também um 'sucesso econômico' para apresentar. Não imagino um impacto muito grande porque a inflação ainda é brutal, mas será suficiente para afastar cada vez mais uma vitória de Lula em um primeiro turno", diz Solano.
O cientista político da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) Marco Antonio Teixeira considera a PEC Kamikaze como uma última cartada para alavancar o desempenho de Bolsonaro nas pesquisas.
"Se o auxílio não surtir efeito nas pesquisas, sobrará pouca margem para o governo estabelecer uma nova estratégia para conquistar votos", diz.
Teixeira afirma, no entanto, que ainda é cedo para ter uma ideia dos efeitos da PEC das Eleições, mas com o pagamento do novo valor do Auxílio Brasil (antigo Bolsa Família) em agosto será possível mensurar o impacto do pacote de ajudas.
'Cristalização dos votos'
Para o professor de ciência política da FGV Cláudio Couto, a PEC aprovada deverá representar ganhos nas intenções de voto para Bolsonaro, "mas resta saber se em cima do próprio Lula ou entre os indecisos, brancos e nulos e até mesmo sobre candidaturas da terceira via".
Couto, no entanto, concorda com a visão de impacto eleitoral limitado porque "as decisões já estão muito consolidadas".
"A gente tem uma eleição cuja disputa começou muito mais cedo do que o habitual. A primeira declaração pública de Bolsonaro como presidente eleito mencionou que ele já era candidato à sua própria reeleição. Nenhum presidente fez isso tão abertamente", afirma.
"E Lula, quando é reabilitado politicamente, causa um terremoto na disputa eleitoral porque muitos eleitores que não levavam a sério a possibilidade de votar nele, por achar que ele estava fora do jogo, mudam de opinião naquele momento. E isso leva muita gente a antecipar a sua preferência."
Mas ele prevê uma disputa sobre o tema quando começar a campanha no rádio e na TV, que atingem mais os beneficiários desses programas.
"Claro que o Bolsonaro vai falar que é o 'pai da criança', mas o PT vai evidentemente dizer 'olha, na verdade aumentamos muitos esses benefícios do nosso governo, esse aí é um aumento oportunista'."
Em evento no último sábado na Grande São Paulo, o candidato petista afirmou que "se o dinheiro cair na conta de vocês, peguem e compre o que comer. Na hora de votar, dê uma banana neles ".
Rosemary Segurado, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), também vê uma "cristalização" das intenções de voto.
"Aqueles que já decidiram seu voto e não pretendem mudar sua escolha chegam a 70% dos entrevistados. E o número de indecisos não é tão grande. O que a gente conclui é que produzirá um efeito, mas não capaz de reverter a tendência que está colocada para este momento."
Segurado atribui isso a uma consolidação da divisão de projetos de sociedade desde os tempos em que as disputas políticas principais no país eram entre PT e PSDB.
"Não vejo espaço para uma alteração significativa desse quadro, a menos que obviamente surja algum outro fator muito contundente nesse período."
- Este texto foi originalmente publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62158926
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