Lisboa, Portugal - Em tom irônico, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), disse que não há como ter fraudes nas urnas eletrônicas do Brasil, principalmente quando se vê que foram eleitas pessoas como os deputados Hélio Negão e Bia Kicis, na esteira da vitória do presidente Jair Bolsonaro em 2018. Segundo o ministro, para rebater o discurso de que o sistema eleitoral brasileiro é suscetível a irregularidades, ele disse, em tom de brincadeira, a Bolsonaro, que, nos casos dos deputados e "de outras coisas" que foram eleitas, até gostaria que se encontrassem inconsistências no processo de votação.
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O ministro acrescentou que a percepção dele, estando fora do país neste momento, é que tudo o que se tem falado sobre as urnas eletrônicas, a tentativa de apresentar o sistema como falho, tem fortalecido a visão de que o sistema é bom, sólido e funciona bem. "E essa é a nossa segurança", frisou. Ele lembrou que passou duas vezes pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por isso, está absolutamente seguro de que o modelo de votação no Brasil vem sendo aperfeiçoado ao longo dos anos. "Demos o passo da biometria, do teste de integridade, então, não temos nenhuma dúvida sobre a consolidação desse sistema", emendou.
No entender de Gilmar Mendes, é preciso destacar que, a despeito de todo o apoio que o Palácio do Planalto tem hoje no Congresso, sob a liderança do presidente da Câmara, Arthur Lira, o Legislativo enterrou, inclusive com o suporte de maioria governista, a emenda constitucional que propunha a volta do voto impresso. "O Congresso aprovou medidas muito importantes e tem se pronunciado sobre a temática (das urnas eletrônicas), repudiando, inclusive, a emenda do voto impresso, de maneira muito clara. Então, o Congresso pacificou esse tema", afirmou.
Para o ministro, diante de todo o barulho que vem sendo feito por Bolsonaro e por aliados, inclusive com o apoio das Forças Armadas, no sentido de desacreditar as urnas eletrônicas, é fundamental "colocar um pouco de ordem nessa confusão e voltar para os aspectos que são importantes". E enfatizou: "O menor problema que temos agora é a urna eletrônica. Nós precisamos voltar a nossa atenção para questões reais, como a pobreza que acometeu as pessoas, agravada pela pandemia, a busca pelo crescimento econômico e pelo emprego. É nisso que temos que prestar atenção".
Risco de golpe
Sobre a possibilidade de o presidente Jair Bolsonaro dar um golpe caso seja derrotado nas urnas em outubro próximo, Mendes disse que preferia não especular. "Não acredito que haja clima para isso no Brasil, uma democracia grande, uma das maiores do mundo, consolidada. Pode ter técnica nesse modo de ver o mundo, de manter os grupamentos unidos, que querem acreditar em teorias conspiratórias. Mas nós sabemos que todos eles, as pessoas que estão aí, vieram desse processo pelas urnas eletrônicas", destacou, admitindo, contudo, que o momento é difícil.
Outro ponto a ser ressaltado, disse o decano do STF, é a participação das Forças Armadas no processo eleitoral, que deve se restringir a temas como as questões logísticas. Recentemente, o ministro da Defesa, general Paulo Sérgio de Oliveira, esteve no Congresso e defendeu o voto impresso e uma apuração paralela à feita pelo TSE. "As Forças Armadas sempre participaram desse processo, inclusive da votação eletrônica. Se olharmos na origem daqueles que são chamados de ninjas, que implantaram a urna eletrônica, vamos encontrar técnicos do IME (Instituto Militar de Engenharia) e do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica). Então, eles sempre participaram da logística das eleições, de modo que, a rigor, parece que devem continuar cooperando nesse sentido", afirmou.
Na opinião de Mendes, debater o aprimoramento do sistema eleitoral está contemplado no regime democrático, mas isso não passa, em nenhum momento, por desacreditar o meio eletrônico de votação. "O aprimoramento do sistema sempre foi um objetivo da Justiça Eleitoral. Não se tinha a biometria e veio a biometria, o teste de integridade, o teste aleatório das urnas no dia das eleições. Tudo isso foi sendo aprimorado e ampliado. Ninguém deve repudiar o aprimoramento do sistema. E o TSE sempre trabalhou nesse sentido. Há um ritual quanto a isso. E me parece que esse trabalho tem que continuar", concluiu.