Jornal Estado de Minas

ENTREVISTA

'O principal problema de Minas é o governo', diz Sara Azevedo, do Psol

Candidata do Psol ao Senado Federal, a professora Sara Azevedo crê que a gestão do governador Romeu Zema (Novo) é o "maior problema" de Minas Gerais. Ontem, ao participar do "EM Entrevista", podcast de Política do Estado de Minas, ela criticou a postura do Palácio Tiradentes ante diversos temas.



"Temos um governo que não consegue responder às principais necessidades urgentes. Tivemos Brumadinho e Mariana, exemplos de gestões desastrosas de meio ambiente", disse, citando também questões ligadas à educação e à infraestrutura.

Sara é defensora da manutenção, em 2023, dos pagamentos de R$ 600 às pessoas em situação de vulnerabilidade social. "A fome vai continuar. A crise continua - e não vai ser resolvida de uma hora para outra", afirmou.

Sob o lema de que a esquerda é a "saída para a crise", a pessolista propõe uma auditoria do bilionário débito de Minas com a União, em detrimento ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF) desejado por Zema. "Não temos como pagar uma dívida sem saber que débito é esse, no fim das contas. Ela só gera juros em cima de juros".



Feminista e lésbica, Sara se fia, ainda, no caráter representativo de sua candidatura e fala em "quebrar padrões". "A política nunca foi colocada para nós, mulheres e LGBTs - nem para a negritude. Desde os primórdios, esse lugar já era colocado para os homens brancos, héteros e cisgêneros", assinalou. Leia os principais trechos da entrevista:



A senhora é uma mulher feminista e lésbica. O Senado é uma Casa onde predominam os homens - boa parte deles, mais velhos. Como pretende atuar em um espaço com esse perfil?
Estar no Senado, por si só, é uma quebra desses padrões. Levar nossas pautas ao Senado é importante porque é uma Casa que, muitas vezes, regula o que passa pela Câmara. É importante que tenhamos localização à esquerda, no Senado, para pautas urgentes do feminismo, das mulheres, dos LGBTs, da educação e dos direitos sociais. A única saída para a crise econômica, social e política é pela esquerda.

Há histórico de agressões a mulheres nas Casas Legislativas. Como pensa em enfrentar possíveis ataques verbais caso seja eleita para o Senado?
A política nunca foi colocada para nós, mulheres e LGBTs - nem para a negritude. Desde os primórdios, esse lugar já era colocado para os homens brancos, héteros e cisgêneros. Neste momento, a violência se amplia. Foi uma sequência de violência nas Casas Legislativas quanto mais se aproximava o processo eleitoral. Na última semana, sofreram violências e ameaças físicas às famílias mulheres fortes como a deputada Sâmia Bomfim (Psol-SP), Duda Salabert (PDT), Manuela d'Ávila (PCdoB-RS) e a deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT-MG). É possível fazer política diferente; mas, se não for por outro caminho, vamos enfrentar. Só de estar lá, já é corajoso; continuar lá e manter firme as pautas requer ainda mais coragem, mas também mais segurança e firmeza.

O que a senhora pretende priorizar se eleita?
Falamos muito de um programa de emergência social. Temos 33 milhões de pessoas com fome. Em BH, segundo recente pesquisa, 239 mil pessoas estão vivendo com até R$ 105 por mês. Não dá para não fazer política sem pensar em quem tem fome. Para responder a uma crise dessa proporção, precisamos tomar as pautas econômicas como centrais. É importante discutir a taxação de grandes fortunas - e, ontem (terça-feira), Lula firmou isso como uma pauta. Alguém precisa pagar por essa crise, e não dá mais para retirar de quem tem menos. (É preciso) tirar a população da miséria para pensar em projetos de fundo.



Quero pensar em pautas para a educação, espaço importante de transformação da realidade. Todos os municípios de Minas têm escola. Bolsonaro é inimigo da educação. Precisamos responder a isso com urgência.

Reginaldo Lopes, do PT, liderava algumas pesquisas a respeito do Senado Federal, mas abriu mão da pré-candidatura para apoiar Alexandre Silveira, que é do PSD. A senhora crê ser possível capturar parte dos votos do eleitor ideológico à esquerda?
Temos apresentado nossa plataforma para o campo da esquerda. Sou militante do Psol há 15 anos, e a política que precisamos neste momento tem a ver com a derrubada do presidente. Por isso, assumimos a responsabilidade da campanha de Lula. Para conseguir garantir as maiores mudanças, (é preciso) construir uma plataforma à esquerda. As candidaturas que tergiversam e, por um momento, estão com a direita, mas em outro momento, por causa do processo eleitoral, vêm mais perto da esquerda, não são seguras o suficiente para este momento da disputa. Tive conversas com vários setores da esquerda, e a Rede está conosco a partir da federação com o Psol. Temos conversado com diversos partidos, movimentos e candidaturas.

O fato de o Psol ter candidatura própria ao governo, com Lorene Figueiredo, e não estar na aliança que une PSD e PT não enfraquece a estratégia do partido?
Temos diferenças e, isso, nunca deixamos de falar. Faz parte da democracia. É através das diferenças que avançamos. Temos um caminho a trilhar nacionalmente com a vitória de Lula, mas, no estado, as escolhas erradas fazem com que a gente esteja em lugares diferentes. Queremos apresentar, enquanto partido, que é necessário construir uma pauta à esquerda. Infelizmente, as escolhas de Lula e do PT em Minas não permitiram que o eleitorado tivesse uma propositura desse campo. Queremos apresentar isso.



A senhora considera uma 'escolha errada' o apoio do PT a Alexandre Kalil e Alexandre Silveira?
Sim. Foi uma escolha errada por causa do retrospecto de Kalil e Silveira. Não fazem parte do mesmo campo político que nós, de anos de costura, debate e construção política. É uma escolha que queremos corrigir apresentando nossa candidatura.

A senhora atuou em uma rede de cursinhos populares que auxiliava jovens com menos poder financeiro a entrar no Ensino Superior. O que é possível fazer, em termos de políticas públicas, para ampliar o acesso à universidade?
Ampliar as vagas e o financiamento das universidades. UEMG e Unimontes sofreram cortes draconianos. O aumento de 10,06% para os profissionais do ensino superior, que deveria ser concedido pelo estado, foi retirado da verba das universidades. Temos de inverter a lógica: universidade não é gasto, mas investimento em ciência e tecnologia e na construção de trabalhadores qualificados.

Zema conseguiu, por meio do Supremo Tribunal Federal, autorização para aderir ao Regime de Recuperação Fiscal, mas a oposição à esquerda defende uma saída política para a dívida do estado. Se eleita, o que pretende fazer a respeito do debate sobre a dívida de Minas com a União?
O que o regime está propondo é o esvaziamento dos bens públicos, pois coloca como garantia do pagamento da dívida a privatização de bens públicos. Em um primeiro momento, tentou-se a Cemig, a CPI feita pela Assembleia ajudou bastante (a impedir a venda), porque foi um processo de investigação importante.



Agora, tentam emplacar a privatização da Codemig. É uma empresa de pensar a estratégia do estado. Quando se está sendo gerido por uma empresa privada, a quem vai atender? Haverá, na verdade, um travamento dos serviços públicos e das questões sociais no estado.

É possível ter saídas políticas (para a dívida). Com um novo governo federal, é possível fazer uma nova negociação. Mas, em primeiro lugar, é preciso auditar a dívida. Podemos brigar (no Senado) por essa auditoria. Não temos como pagar uma dívida sem saber que débito é esse, no fim das contas. Ela só gera juros em cima de juros. A gente só paga juros, mas não resolve a dívida. Ela não será sanada com a Recuperação Fiscal.

Bolsonaro aumentou para R$ 600, e até dezembro, o Auxílio Brasil. Esse aumento pode influenciar o resultado da eleição?
Bastante. Não à toa, ele fez isso dois meses antes do processo eleitoral. Estamos falando de um projeto extremamente eleitoreiro. Queremos denunciar esse movimento. É o mesmo presidente que queria colocar R$ 200 de auxílio na pandemia, no momento de mais necessidade do país. É o mesmo presidente que ficou negando o auxílio durante muito tempo. E, agora, decide liberar dois meses antes da eleição? É uma história meio confusa.



A senhora é favorável à continuidade dos pagamentos de R$ 600 em 2023?
Sim, porque a fome vai continuar. A crise continua - e não vai ser resolvida de uma hora para outra. Não há condições de começarmos um novo ano com as pessoas em situação de fome e sem condições mínimas de procurar emprego. Os empregos estáveis foram deteriorados nos últimos anos.

(É preciso) reestruturar o programa. Com o Bolsa Família, havia o cuidado para que a renda fosse para os chefes de família, e temos uma maioria de mulheres na chefia das famílias do país. Havia o cuidado de fazer com que as crianças das famílias (beneficiadas) e, agora, não há mais esse cuidado, necessariamente. Tem de ter cuidado em relação à saúde, com a carteirinha em dia no posto de saúde.

Mas vai haver espaço fiscal para continuar pagando os R$ 600?
Há (espaço), mas tem de haver políticas que façam essa compensação, como a taxação de grandes fortunas. Elas precisam acontecer para que haja o reinvestimento no Estado.



Qual o principal problema de Minas? O que se compromete a fazer para ajudar a resolver?
O principal problema de Minas é o governo. Temos um governo que não consegue responder às principais necessidades urgentes. Tivemos Brumadinho e Mariana, exemplos de gestões desastrosas de meio ambiente. Falei da educação; há a questão do Rodoanel. Me comprometo a ser uma senadora que vai apresentar propostas relacionadas ao meio ambiente, à educação e à economia, tentando levá-las a Minas, para que possamos ter um estado que consiga responder às necessidades do povo.