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Estado de Minas NOS TEMPOS DO VOTO EM PAPEL

Urnas eletrônicas garantem eleições limpas há mais de 20 anos

Para o cientista político Carlos Ranulfo e o coordenador do MP Eleitoral de Minas, Edson de Resende, a desconfiança em relação à votação atual não faz sentido


30/08/2022 04:00 - atualizado 29/08/2022 22:40

URNA ELETRÔNICA
Uma nova era começa em 1996: técnicos do TRE-MG ensinam moradores de vilas de BH como votar para prefeito e vereador na urna eletrônica (foto: JORGE GONTIJO/EM/D.A PRESS - 27/6/96)


Implantadas no Brasil na segunda metade da década de 1990, as urnas eletrônicas têm sido alvo de críticas do presidente Jair Bolsonaro e de parte de seus apoiadores nos últimos anos. No encerramento da série de reportagens sobre o voto em papel, o Estado de Minas discute o cenário em que os ataques ao atual sistema eleitoral se proliferaram.
 
Para Carlos Ranulfo, professor titular apo- sentado do Departamento de Ciência Política da UFMG e membro do Observatório das Eleições, a falta de provas sobre possíveis fraudes na urna eletrônica torna a discussão sobre a segurança do sistema eleitoral brasileiro um tema infrutífero.

“Só teria sentido você mudar o sistema se houvesse uma evidência de que ele tem problema. Não havendo evidência, não existe razão para discussão. Porque não há nenhuma evidência de fraude. Essa é a famosa discussão sobre o sexo dos anjos. É uma coisa que um setor bem reacionário da política brasileira colocou na pauta e isso aí fica rendendo”, aponta Ranulfo.
 
Para o doutor em Ciência Política, a incer- teza sobre as urnas, partida em grande parte por questionamentos feitos pelo presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), encontra eco em parte da população por uma característica de desconfiança arraigada nos brasileiros.

Ver galeria . 15 Fotos Apuração manual de votos da eleição de 1990 em Belo HorizonteCristina Horta/Arquivo EM - 4/10/1990
Apuração manual de votos da eleição de 1990 em Belo Horizonte (foto: Cristina Horta/Arquivo EM - 4/10/1990 )


“O brasileiro tem uma desconfiança sistemática das instituições. Ainda mais se são instituições políticas. Então, quase que por natureza, quando se pergunta ‘você confia em tal instituição?’, é quase que automático que a resposta seja ‘não’, mesmo que não se saiba explicar. Então, a instituição do voto acaba entrando nessa maré, nessa desconfiança meio atávica que uma parte do eleitorado brasileiro tem. Desconfia-se de qualquer coisa, principalmente quando se refere à política. Mas é importante também dizer que a desconfiança cresce porque existe uma forte propaganda por parte do governo e do meio bolsonarista. Também com uma forte intencionalidade. A intenção é a seguinte: tumultuar a eleição, descredenciar a eleição. Simplesmente isso”, avalia.
Como apresentado nesta série de reportagens, cerca de um terço do atual eleitorado brasileiro, mais de 50 milhões de pessoas, só participou de eleições integralmente realizadas em urnas eletrônicas. O número cresce para 54% dos eleitores quando se avalia quem votou a partir de 1996, quando aconteceu a primeira experiência com o equipamento no Brasil, em cidades com mais de 200 mil votantes.

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Para Ranulfo, essa distância histórica também ajuda a explicar o sucesso de pautas que sugerem um retorno às técnicas usadas há quase 30 anos. “Boa parte das pessoas hoje não conhece o que era o voto impresso, né? Então, acha que o mundo começou no voto eletrônico, e não sabe como era complicado. É que nem esquecer o que foi a ditadura militar.”

Auditoria

Propostas recentes incluem o retorno do papel como forma de auditoria das eleições. A Proposta de Emenda à Constituição 135/19, conhecida como PEC do Voto Impresso, rejeitada pela Câmara dos Deputados no ano passado, previa que as urnas eletrônicas imprimissem um comprovante do voto, que seria depositado em uma urna. Caso algum candidato suspeitasse do resultado das eleições, seria possível fazer a contagem dos papéis.
 
Para Edson Resende de Castro, membro auxiliar da Procuradoria-Geral Eleitoral e coordenador eleitoral do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), a medida é um retrocesso aos problemas causados pela contagem manual de votos.


A partir deste domingo (28/8), o Estado de Minas recorda aqueles tempos em série de reportagens com personagens que atuaram nos pleitos da segunda metade do século 20, especialmente os dos anos 1980 e 1990, que precederam as urnas eletrônicas.

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“Imagine que teve a votação eletrônica e o resultado foi X. Um partido não se conforma e quer conferir. Quando vai conferir, a gente tem a volta ao passado, que é jogar aqueles votos todos em cima da mesa e sair contando um por um, naquela mesma problemática. Seria trazer do passado esse cenário e colocar de volta, com toda aquela possibilidade de erros e de fraudes. Alguém vai dizer ‘é uma forma de conferir’, mas nós criaríamos uma forma de conferir que já se mostrou ineficiente, problemática, fraudulenta, sujeita a erros. Outra questão seria: qual contagem vai prevalecer? A primeira, eletrônica, ou a segunda, manual?”, questiona o promotor.
 
Quem trabalhou na coordenação das eleições manuais e nas eletrônicas também tem dificuldade em entender as propostas que pedem o retorno do papel aos pleitos brasileiros. As servidoras aposentadas do TRE-MG e ex-chefes de cartório eleitoral Raquel Lott e Adriana Fulgêncio contam, com bom humor, como reagem quando o tema vem à tona.
 
“O que eu falo para a pessoa é que, na hora em que tiver que ligar para alguém em 2022, você procure uma fichinha, ache um orelhão, vai lá e liga. É isso. Não tem cabimento voltar para a votação manual, não tem cabimento”, afirma Raquel Lott. “Eu fico brava quando alguém fala contra a urna, mas eu fico muito brava mesmo. É como se falassem de um filho meu”, complementa Adriana Fulgêncio.
 

NOVO MODELO DE EQUIPAMENTO

Um novo modelo de urna eletrônica será inaugurado nas eleições de 2022. De acordo com o TSE, o novo equipamento tem um processador 18 vezes mais rápido do que o modelo anterior e o teclado terá uma tecnologia que acusa possíveis erros de mau contato ou curto-circuito. Além disso, foram implantadas tecnologias para a acessibilidade, como a possibilidade de cadastro de um nome fonético e a apresentação de um intérprete de Libras na tela da urna.
 
O TSE ressalta que as urnas permanecem sem qualquer dispositivo que permita acesso à internet ou bluetooth e o código-fonte segue sendo disponibilizado e inspecionado por entidades públicas, universidades, partidos e pela sociedade em geral.
 
Desde que foram criadas, em 1996, a Justiça Eleitoral adquiriu novas urnas em 1998, 2000, 2002, 2004, 2006, 2008, 2009, 2010, 2011, 2013, 2015 e 2020, sempre seguindo rigorosos padrões.


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