A poucos dias das eleições — marcadas pela polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (PL) —, mais um caso de violência política aumenta a tensão para o pleito de outubro. Desta vez, o assassinato a facadas de um apoiador do petista no Mato Grosso, cometido por um simpatizante do atual chefe do Executivo. Em contato com o Correio, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) informou que o Grupo de Trabalho contra a violência política nas eleições 2022 está acompanhando o caso.
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Presidenciáveis
O caso ganhou repercussão nacional, com reações de autoridades, presidenciáveis e outros políticos. Lula destacou a gravidade da violência política no país. "É com muita tristeza que soube da notícia do assassinato de Benedito Cardoso dos Santos, na zona rural de Confresa. A intolerância tirou mais uma vida. O Brasil não merece o ódio que se instaurou neste país", repudiou.
Ciro Gomes, candidato à Presidência pelo PDT, disse que Benedito é "mais uma vítima da guerra fratricida, semeada por uma polarização irracional e odienta, que pode inundar de sangue o nosso solo". "Abaixo a violência política. O Brasil quer paz", afirmou.
A candidata do MDB, Simone Tebet, cobrou posicionamento de Bolsonaro, apontando que ele deveria "clamar por paz e união". A senador disse que o crime é "incitação ao ódio". Já Soraya Thronicke, presidenciável pelo União Brasil, destacou: "Envergonham o país com corrupção, nos distraem com a polarização e, além disso, derramam sangue alheio".
Bolsonaro não se pronunciou sobre o homicídio, mas voltou ao discurso do "bem contra o mal". Em ato de campanha em Araguatins (TO), ele chamou o PT de praga e diz que pretende varrer o partido para o "lixo da história".
Candidato do Novo, Felipe D'Ávila lamentou o crime. "Numa democracia real, divergências políticas são resolvidas com diálogo e respeito. Não é o que temos visto no Brasil, infelizmente. E quando a política é tomada pela violência, significa que caminhamos rumo à barbárie", destacou. "Lamento o crime brutal ocorrido em Mato Grosso. Aproveito para prestar minha solidariedade à família da vítima. Precisamos, urgentemente, pacificar o Brasil. Chega do nosso país e da nossa gente dividida."
O crime em Mato Grosso aconteceu menos de dois meses após o assassinato do guarda municipal Marcelo Aloizio Arruda, tesoureiro do PT em Foz do Iguaçu (PR), pelo policial penal bolsonarista Jorge Guaranho.
Ontem, um apoiador de Bolsonaro foi agredido por petistas em São Gonçalo (RJ). Rodrigo Duarte passava devagar na frente do Clube dos Tamoios, onde Lula participaria de um evento. Ele estava em um carro com adesivos que mostravam o ex-presidente vestido de presidiário. Simpatizantes do ex-presidente bateram no veículo, e Duarte desceu filmando os militantes.
O homem teve o celular retirado de sua mão e foi agredido. Um dos golpes causou um sangramento na cabeça. Ele deixou o local com a ajuda de agentes da Polícia Federal.
Combate
A Justiça Eleitoral está em sinal de alerta diante do cenário polarizado do país e da escalada da violência durante o período eleitoral. Após o assassinato de Arruda, líderes partidários e entidades foram ao TSE cobrar a elaboração de um plano para garantir a segurança. Pressionada, a Corte criou um grupo de trabalho para enfrentar a violência política durante o pleito deste ano.
A força-tarefa é coordenada pelo corregedor da Justiça Eleitoral e conta com colaboração de outros servidores, como representantes da vice-presidência do tribunal, da diretoria-geral e da Secretaria de Polícia Judicial. O presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes, também se reuniu com 23 comandantes-gerais da Polícia Militar dos estados para debater a segurança no pleito.
Para o advogado Belisário dos Santos Júnior, ex-secretário de Justiça de São Paulo, o crime é resultado da postura adotada por Bolsonaro. "Difícil não associar esse crime com o discurso de ódio do presidente, a necessidade de 'exterminar os membros do PT', repetida de várias formas e em vários momentos. Não se trata de responsabilidade penal, mas responsabilidade política", sustentou.
Na avaliação do cientista político Igor Novaes Lins, pesquisador no Instituto Igarapé, a violência política pode se tornar ainda maior com a proximidade do dia da votação, marcado para 2 de outubro. "É um cenário muito perigoso. Um barril de pólvora, e temos uma conjuntura de aproximação das eleições, em que há animosidade. Do outro lado, estamos vendo o número de pessoas armadas por uma série de flexibilizações do governo federal", observou.
*Estagiária sob a supervisão de Cida Barbosa