De um lado, um grupo de bolsonaristas com camisetas verde e amarelo, em Salvador, na Bahia. A poucos metros, dezenas de pessoas pró-Lula usando vermelho e agitando bandeiras enquanto gritam palavras de ordem.
Minutos depois, os dois grupos se juntam numa dancinha apartidária, empolgada e embalada por um trio elétrico contratado pelo grupo pró-Lula, no dia 6 de setembro.
As imagens viralizaram nas redes sociais e chamou a atenção por conta da felicidade estampada nos rostos de pessoas que defendem lados antagônicos na polarizada corrida eleitoral. Apenas em uma publicação no Twitter, o vídeo registrou mais de 3,5 milhões de visualizações.
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Uma das protagonistas do vídeo, a consultora óptica Raquel Borges dos Santos Barbosa, de 31 anos, disse à BBC News Brasil que o ato foi espontâneo e está acima de qualquer ideologia.
"A gente precisa desmistificar o pensamento de ódio e levar a paz. Não adianta levar guerra para a política. Sou militante há mais de dez anos e trato todo mundo bem", afirmou Raquel.
O encontro dos grupos ocorreu, conta Raquel, logo após os candidatos ao governo baiano Jerônimo Rodrigues (PT) e João Roma (PL) entrarem na emissora TVE para participarem de um debate.
O clima entre "apoiadoras" dos candidatos de Lula e Bolsonaro durante o debate na Bahia. Hahaha %u2764%uFE0F pic.twitter.com/zS8SLMnl80
— Eric Luis Carvalho (@eluiscarvalho) September 7, 2022Raquel conta que os bolsonaristas contavam com apitos e uma fanfarra.
"A gente usou a batida da fanfarra deles para cantar as músicas do PT. A gente brinca muito. Temos que desmistificar o pensamento de ódio", conta a militante que viralizou nas redes.
Ela relata que a festa continuou até que um mini trio elétrico contratado pelo PT chegasse, 40 minutos após os candidatos entrarem para o debate. O barulho foi tão alto que a pessoa responsável pela campanha bolsonarista acionou a polícia. O som ficou dez minutos desligado, mas logo voltou a funcionar depois que o advogado petista convenceu os policiais de que a manifestação era válida.
Sem ódio
Minutos depois, o som recomeçou e Raquel conta que as mulheres da equipe de Bolsonaro começaram a dançar no ritmo da música petista.
"Eu respeito o seu pensamento, mas vamos sambar um pouquinho. Vamos brincar. O gingado é bom e não tem como se segurar mesmo. Então, eu entrei no meio delas e a gente continuou brincando. Eu não tinha visto que estavam registrando tudo. Até a loira que acabou com nosso som sambou comigo. Eu gritei 'Bora, loira'. E a gente começou a sambar juntas. Ela estava zangada, mas entendeu que não deveria agir daquela forma", conta aos risos.
Raquel diz que esses momentos de descontração e amizade entre as equipes de campanha são comuns enquanto os candidatos estão participando dos compromissos.
"Tem o momento sério e tem o da pausa, da festa, da descontração. Depois que nossos candidatos passaram e já estavam no momento deles, a gente aproveitou para descansar e se divertir um pouco", conta.
Apesar de dançarem juntas e se reunirem, as mulheres de ambas as equipes não se encontraram novamente depois do vídeo fazer sucesso. E, assim como Raquel, a reportagem da BBC News Brasil procurou as trabalhadoras bolsonaristas, mas não teve sucesso.
A militante petista lamenta não ter pedido o contato ou reencontrado as colegas.
"Gostaria de fazer amizade com todas. As meninas eram uma mais bonita que a outra, mas ainda não consegui encontrar nenhuma delas. Até pedi nas minhas redes que entrassem em contato comigo, mas pode ser que elas estejam evitando para não se prejudicar. Estamos vivendo um tempo caótico na política", afirmou.
Raquel diz que se emociona ao falar sobre a união dos brasileiros de maneira apartidária. Para ela, falar sobre política é importante, mas é necessário entender os limites e manter o respeito.
"A eleição define como será nosso Brasil. Mas você não tem como odiar o que você não conhece, o outro. Essa rivalidade, como entre as torcidas de Corinthians e Palmeiras, é ridícula porque, assim como os políticos, os próprios jogadores se cumprimentam antes de começar o jogo, enquanto o povo se mata. Eu sou de esquerda, mas respeito a outra parte", diz Raquel.
Ela diz que a polarização e escalada de violência política dos últimos anos a fez tomar algumas precauções. Hoje, ela sente medo de fazer ações simples de campanha, como abordar pessoas e entregar panfletos.
"Eu tenho medo de colar um adesivo na porta da pessoa e ela me dar um tiro. A democracia existe e está aqui para a gente dialogar respeitando os espaços. Se eu puder te convencer a mudar, eu vou te convencer. Mas só se a outra parte concordar em me ouvir. É essa educação que a gente deve levar para as urnas. O amor ao próximo, não julgar a pessoa pelo número que ela escolhe. Como odiarmos a nossa bandeira simplesmente porque um homem a usa para fazer campanha do partido dele?", questiona Raquel.
Raquel diz ter se sentido muito feliz com a repercussão do vídeo. Ela se diverte inclusive com o fato de ter recebido uma montagem das imagens com uma música da campanha de Jair Bolsonaro e diz que espera que ele seja usado de maneira positiva por quem o compartilha.
"A gente vive em um momento em que não precisamos de ódio. Precisamos ensinar nossos filhos que é com paz e alegria que se convive. Precisamos ser mais humanos e ter empatia com o próximo. A gente ouve que uma pessoa morreu por causa de um time de futebol. Preserve a paz. Faça jus à ordem e progresso da nossa bandeira", diz.
* Este texto teve a colaboração de Vitor Tavares
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62898414
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