Em sua quarta -e anunciada por ele mesmo como última- candidatura à Presidência, Ciro Gomes (PDT) chega à reta final de campanha com os prós e contras de ser político há 40 anos, indo de deputado estadual a ministro.
Misturando um discurso técnico e raciocínios complexos sobre economia com linguajar popular e falas polêmicas, Ciro manteve um patamar estável de apoio nos pleitos anteriores: 11% dos votos válidos em 1998, 12% em 2002 e 12,4% em 2018.
Na pesquisa Datafolha de 22 de setembro, o pedetista apareceu com 7% das intenções de voto, estacionado em terceiro lugar e bem atrás de Lula (PT), com 47%, e Jair Bolsonaro (PL), com 33%.
Nesta semana, a Folha publica textos para explicar ao leitor um pouco mais sobre as trajetórias recentes de Ciro, Lula, Bolsonaro e Simone Tebet (MDB) --os quatro mais bem colocados nas pesquisas.
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CIRO E A BIOGRAFIA
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Em 1994, Ciro renunciou ao governo do Ceará, que havia assumido três anos antes, para se tornar ministro da Fazenda de Itamar Franco. Seu primeiro cargo federal, porém, durou menos de quatro meses, e o atual candidato deixou Brasília para fazer pós-graduação na Universidade Harvard, nos EUA.
Antes, ele havia sido eleito prefeito de Fortaleza, em 1989, cargo que deixou um ano depois para disputar o governo cearense.
Embora a passagem pelos dois postos executivos tenha sido breve e há mais de 30 anos, Ciro cita com frequência os feitos de sua gestão no estado e na capital cearense na atual campanha à Presidência.
Ao longo de sua trajetória, Ciro integrou sete partidos. Começou no PDS, antigo Arena, do qual seu pai, José Euclides Ferreira Gomes Filho, fazia parte quando foi eleito prefeito de Sobral (CE), em 1976.
O cargo também foi ocupado pelo bisavô e pelo avô de Ciro. O senador Cid Gomes (PDT), irmão do atual presidenciável, comandou a prefeitura da cidade por dois mandatos, entre 1997 e 2005, e outro irmão, Ivo Gomes (PDT), é o atual mandatário de Sobral. Apesar de ter feito carreira política no Ceará, o candidato ao Planalto nasceu em Pindamonhangaba (SP), de onde saiu aos 4 anos com a família, rumo a Sobral.
Ciro deixou o PDS para se filiar ao PMDB e voltou a trocar de sigla três anos depois, após romper com o então presidente da legenda, Orestes Quércia, que o chamou de "ladrão e filho de ladrão".
Integrou o PSDB e teve como padrinho político o senador tucano Tasso Jereissati, que assumiu o governo do Ceará após Ciro renunciar para ocupar a chefia do Ministério da Fazenda, em 1995.
Depois, foi do PPS -partido pelo qual disputou sua primeira eleição presidencial-, em 1998, do PSB e do Pros.
Desde 2015, ele é filiado ao PDT, sigla da qual também é vice-presidente. "Minha história com partidos é traumática", afirmou Ciro em uma sabatina durante a atual campanha.
CIRO E A CORRUPÇÃO
Sempre que toca no tema corrupção, Ciro afirma que nunca foi condenado por desvio de recursos públicos. Em dezembro de 2021, o atual candidato à Presidência e o senador Cid Gomes, irmão dele, foram alvo de operação da Polícia Federal que investigou suspeitas de corrupção na construção do estádio Castelão, em Fortaleza. Lúcio Gomes, outro irmão de Ciro e Cid, também foi objeto de busca e apreensão.
Os irmãos eram suspeitos de pagamento de propina a servidores públicos e agentes políticos do Governo do Ceará na gestão de Cid. A fraude teria ocorrido para que a Galvão Engenharia vencesse a licitação para realizar reformas no estádio. O valor da concorrência foi de R$ 518 milhões, oriundos do BNDES.
Ciro atribuiu a ação da PF a uma suposta tentativa de Bolsonaro de prejudicar sua então pré-candidatura à Presidência. Em fevereiro, a Justiça anulou a ação de busca e apreensão feita contra ele pela PF, por ver ausência de contemporaneidade no intervalo de dez anos entre as supostas fraudes e as buscas.
CIRO E AS PALAVRAS
O estilo verborrágico acompanha Ciro em sua trajetória e deixa um rastro volumoso de exemplos que são lembrados pelos adversários conforme a conveniência. Foi o que aconteceu no primeiro debate entre os presidenciáveis, em 28 de agosto: Bolsonaro, ao revidar crítica do pedetista por ofender mulheres, relembrou episódio da eleição de 2002 em que Ciro afirmou que sua então esposa, a atriz Patrícia Pillar, tinha "um dos papéis mais importantes" de sua campanha: "Dormir comigo".
A repercussão da fala à época ajudou a derrubar o desempenho de Ciro nas pesquisas. Neste ciclo, ele voltou a se desculpar pela declaração, e Patrícia já disse várias vezes que perdoou o ex-companheiro.
Bolsonaristas repercutiram o caso em redes sociais e lembraram episódios recentes em que Ciro se descontrolou ao ser confrontado por apoiadores do presidente, com palavrões e ofensas. Xingamentos contra rivais já renderam a Ciro processos na Justiça e desafetos em diversos partidos.
CIRO E OS NÚMEROS
Quase sempre nos primeiros minutos das sabatinas e entrevistas das quais tem participado nesta campanha eleitoral, Ciro gosta de avisar que, antes de ser político, é professor de direito. Outro adendo frequente às suas apresentações são as desculpas antecipadas por extrapolar o tempo de fala, o que ocorre quase sempre.
Os preâmbulos de seus discursos antecedem um acúmulo de dados e números sobre a realidade do país citados em ritmo frenético, habilidade adquirida ao longo dos anos como palestrante.
Nesta campanha, ele tem destacado algarismos e porcentagens sobre desindustrialização, queda do PIB, desequilíbrio das contas públicas e desigualdade social. Os argumentos antecedem suas propostas para lidar com os dois problemas, caso seja eleito. A obsessão por números é uma das marcas exploradas por críticos e imitadores, como fez o humorista Marcelo Adnet em 2018, com o bordão "isso dá trilhão".
CIRO E A ESQUERDA
Apesar de ter começado a carreira em um partido conservador, o PDS, Ciro sempre se alinhou à esquerda e, recentemente, declarou ser um político de centro-esquerda.
A atual oposição ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), após anos de apoio, durante os quais Ciro foi nomeado ministro da Integração Nacional no governo do petista, agravou-se em 2018. Ciro se recusou a apoiar publicamente Fernando Haddad (PT) no segundo turno contra Bolsonaro em retaliação à recusa do então candidato petista em formar uma chapa única da esquerda encabeçada por ele.
Duas semanas antes do segundo turno, o presidenciável do PDT viajou para Paris e não subiu no palanque de Haddad. Desde então, é criticado por integrantes do PT. O episódio foi rememorado por Lula no primeiro debate entre os presidenciáveis, no qual o ex-presidente disse esperar que Ciro "não vá a Paris" e lhe declare apoio em um eventual segundo turno contra o atual chefe do Planalto. Ciro rebateu e disse que Lula não pôde ir para Paris na mesma ocasião porque estava preso.
A cizânia com a esquerda atingiu o pico nos últimos dias, diante das reclamações do pedetista sobre a campanha patrocinada por setores do PT e da militância para que eleitores de Ciro o abandonem e adotem a tática do voto útil em Lula. A pressão, que já existia e chegou a ter apelos para que o ex-ministro desistisse da corrida, levou o presidenciável a apresentar uma carta-manifesto reafirmando sua candidatura.
Ciro também é fustigado por relativizar Bolsonaro com sua retórica que coloca o presidente no mesmo patamar do petista, ligando-os a corrupção e derrocada econômica. Apoiadores do ex-presidente dizem que a campanha do PDT erra ao praticar a chamada falsa simetria e cogitam que Ciro esteja traçando uma tática com vistas à eleição de 2026, mirando a eventual sucessão de Lula.