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Estado de Minas ELEIÇÕES 2022

Institutos de pesquisa precisarão rever metodologias, diz professor da USP

Pablo Ortellado, professor de gestão de políticas públicas na USP e que estuda o eleitorado bolsonarista, afirma que será necessário entender por que a diferença entre o resultado eleitoral e as pesquisas foi tão significativa.


03/10/2022 00:17 - atualizado 03/10/2022 00:17

Homem olha painel com resultados parciais da eleição brasileira
Homem olha painel com resultados parciais da eleição brasileira (foto: Getty Images)
O desempenho do presidente e candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL), acima do projetado pelas pesquisas na votação do primeiro turno, além de uma série de resultados surpreendentes nos Estados nas corridas para governador e senador, aumentam a pressão sobre o trabalho dos institutos de opinião, diz o professor de gestão de políticas públicas na USP e pesquisador do eleitorado bolsonarista Pablo Ortellado.

Bolsonaro obteve 43% dos votos válidos na eleição presidencial enquanto a pesquisa do Datafolha divulgada na véspera da eleição, com 12.800 entrevistados em 310 municípios brasileiros, captava 36% — uma diferença fora da margem de erro de dois pontos percentuais. Pesquisa Genial/Quaest apontava o atual presidente com 38% dos votos válidos, disparidade também fora da margem de erro em relação ao resultado das urnas.

 

Em entrevista coletiva na noite de domingo (2/10), Bolsonaro disse que os resultados "desmoralizaram de vez os institutos de pesquisa", mas evitou questionar a credibilidade dos resultados pela urna eletrônica.

 

Ortellado diz que a "credibilidade dos institutos, que já era colocada em xeque pelos bolsonaristas, agora é colocada pelo resto da sociedade. Seguramente não é manipulação, mas é uma limitação [dos institutos] que a gente precisa entender".

 

Veja abaixo a entrevista:

 

BBC News Brasil - Qual é a sua avaliação sobre o descompasso das pesquisas e o desempenho de Bolsonaro nas urnas?

 

Pablo Ortellado - Olha, foi uma diferença muito grande, muito grande. Antes havia a discussão sobre as duas metodologias de pequisa, por telefone e presencial, e havia a ideia de que a presencial capturava melhor o fenômeno [de intenção de votos]. Mas, olhando para os estados e para a apuração dos votos presidenciais, as duas [metodologias] erraram feio.

 

A grande diferença do presencial em relação ao telefone é que a presencial chega aos mais pobres porque esses têm menos telefones e estão no trabalho, com menos disponibilidade para atender à ligação. E a presencial não entra nos condomínios. São essas as limitações das metodologias. Todo mundo sabe disso e tenta contornar essas limitações com métodos estatísticos, com atribução de pesos, mas não estamos falando de uma diferença de cinco pontos percentuais. Foi um erro gigantesco.

 

BBC News Brasil - Já é possível ter uma pista sobre os fatores que levaram a essa diferença que as pesquisas não captaram?

 

Ortellado - Tem muitas coisas que podem ter acontecido. Vai ser necessário olhar com calma para entender. Mas não houve nenhum fato novo [nos últimos dias de campanha] para explicar esse salto na diferença. Não acho que o eleitor tenha mudado o voto de última hora, porque tudo estava muito consolidado. Essa explicação não é suficiente.

 

Pode ser que um pedaço do voto indeciso tenha ido para o Bolsonaro, mas um pedaço que certamente não explica o que aconteceu. Pode ter sido o voto envergonhado. Pode ter havido boicote dos bolsonaristas na participação das pesquisas, havia uma campanha muito dura contra os institutos de opinião.

 

BBC News Brasil - E como essas diferenças não captadas pelas pesquisas vão se refletir no discurso de Bolsonaro, que costuma descredenciar o trabalho dos institutos? Vai reforçar o discurso do presidente de que 'o que vale é o Datapovo'?

 

Ortellado - Ele vai falar em "Datapovo", vai falar que os institutos forjaram os números e que ele na verdade ganhou porque a eleição foi fraudada. Por essa perspectiva, é um quadro muito ruim porque as pesquisas erraram muito.


O pesquisador e professor da USP Pablo Ortellado
Lista de erros nas pesquisas é 'enorme' e 'bem grave', diz Pablo Ortellado (foto: USP/Divulgação)

 

BBC News Brasil - E como esse quadro influencia o segundo turno entre Lula e Bolsonaro?

 

Ortellado - Vai ser um mês de disputa muito acirrada. O bolsonarismo não teve apenas um desempenho significativo nacionalmente. O bolsonarismo ganhou em vários estados. [Cláudio] Castro ganhou no primeiro turno no Rio e isso não foi captado pelas pesquisas. A mesma coisa na corrida para governador e senador em São Paulo. É uma lista enorme. É bem grave.

 

BBC News Brasil - Como essa lista de projeções que não se concretizaram vai ser absorvida pelos institutos de pesquisa? Qual é o futuro das pesquisas eleitorais no Brasil?

 

Ortellado - É o que aconteceu nos Estados Unidos em 2016 e depois em 2020. Vai precisar rever métodos, fazer discussões entre especialistas para ver o que aconteceu. Agora, com o mapa de votação, é preciso pegar os dados da pesquisa de sábado [o Datafolha com mais entrevistados, 12.800 pessoas] e fazer ajustes, correções, porque a diferença foi grande demais.

 

Alguma coisa aconteceu e é preciso descobrir. Uma pena não tenham feito pesquisa de boca de urna. Ninguém mais faz porque não vale mais a pena, o resultado sai muito rápido. A boca de urna seria melhor para comparar com os resultados.

 

É muito grave porque os institutos estão sob ataque e são ataques infundados. Porque tem muita gente séria nos institutos tentando fazer o melhor, mas eles erraram.

 

BBC News Brasil - Acredita que haja alguma mudança na dinâmica de voto em relação ao passado? Ele está mais volátil e os institutos não estão conseguindo captar?

 

Ortellado - Pode ser que sim. É comum que haja flutuações, mas para presidente não deveria ter nesse nível porque o voto parecia muito consolidado. Tem que pegar os dados e analisar. Só nos próximos dias a gente vai entender o que aconteceu.

 

Mas a credibilidade dos institutos, que já era colocada em xeque pelos bolsonaristas, agora é colocada pelo resto da sociedade. Seguramente não é manipulação, mas é uma limitação [dos institutos] que a gente precisa entender.

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