Na reta final do segundo turno das eleições presidenciais, o comando da campanha à reeleição do presidente Jair Bolsonaro (PL) recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) alegando que a sua chapa teria sido alvo de "fraude eleitoral".
A suposta fraude teria ocorrido porque rádios das regiões Norte e Nordeste teriam deixado de veicular milhares de inserções (pequenas peças publicitárias) da campanha do presidente, prejudicando o candidato à reeleição.
A Justiça Eleitoral, no entanto, negou o pedido de investigação feito pela campanha. Em decisão divulgada na noite desta quarta-feira, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, afirmou que as supostas irregularidades "são inconsistentes" e carecem de "base documental crível."
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Quaest em Minas: Lula tem 45% dos votos totais, e Bolsonaro, 40%Alexandre de Moraes: o presidente do TSE acusado de 'ditador' por Bolsonaro que já foi alvo do PTDatafolha divulga hoje (27/10) nova pesquisa sobre 2º turnoApós a decisão, Bolsonaro convocou a imprensa e, em um pronunciamento em Brasília, afirmou que vai recorrer no Supremo Tribunal Federal (STF).
"Nós iremos às últimas consequências dentro das quatro linhas da Constituição para fazer valer aquilo que as nossas auditorias constataram", afirmou.
Nas redes sociais, o ministro das Comunicações, Fábio Farias, falou sobre a suposta fraude.
"Essa é uma grave violação do sistema eleitoral! Estamos indignados e estamos tomando as medidas cabíveis junto ao TSE. Nós, que preservamos a democracia e direito de igualdade, queremos uma campanha limpa e justa", disse.
Desde então, a militância bolsonarista vem se referindo ao caso como uma evidência de que a campanha do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) teria sido privilegiada. O petista lidera as principais pesquisas de intenção de voto.
Confira abaixo seis perguntas sobre as acusações feitas pela campanha do presidente.
O que diz a campanha de Bolsonaro?
A ação movida pelos advogados da coligação de Bolsonaro diz que empresas de auditoria contratadas constataram que rádios da região Norte e Nordeste deixaram de veicular inserções de 30 segundos da campanha à reeleição do presidente.
A legislação prevê que emissoras de rádio devem dividir por igual o tempo destinado às inserções de candidatos que disputam o segundo turno. A tese da defesa de Bolsonaro é de que, na medida em que inserções de sua candidatura não teriam sido veiculadas, sua campanha foi prejudicada.
Segundo a ação, na região Nordeste, na semana entre os dias 7 e 14 de outubro, 12.084 inserções da campanha de Bolsonaro não teriam sido veiculadas. Isso totalizaria, ainda de acordo com a ação, 100 horas de conteúdo nas rádios de toda a região.
No Norte, segundo os advogados do presidente, 1.807 inserções de 30 segundos de Bolsonaro teriam deixado de ser veiculadas, totalizando aproximadamente 15 horas de conteúdo.
Para os advogados do presidente, a suposta desproporção no volume de inserções detectada pelas empresas de auditoria contratadas seria um "fato gravíssimo capaz de assentar (comprometer) a legitimidade do pleito, se não corrigido imediatamente".
Em seu pronunciamento, Bolsonaro afirmou que sua campanha foi prejudicada e que vai recorrer ao STF.
"Houve um enorme desequilíbrio no tocante às inserções e isso obviamente interfere na quantidade de votos no final", disse.
O presidente acrescentou que pretende contratar uma terceira auditoria para verificar as inserções.
O que são 'inserções'?
Inserções são peças publicitárias que podem ter 30 ou 60 segundos, de acordo com a legislação eleitoral. Também são chamadas de "pílulas" porque são menores do que os blocos mais longos do horário eleitoral gratuito.
Pela legislação, as campanhas devem enviar essas inserções a um pool (grupo) de emissoras de rádio e TV. As emissoras de rádio de todo o país devem procurar esse pool para ter acesso ao material e veicular as inserções de acordo com as normas eleitorais.
O que o TSE disse inicialmente?
No dia seguinte ao início da ação, o TSE divulgou uma nota afirmando que não cabe ao órgão fazer a distribuição do material de campanha das candidaturas às emissoras de rádio do país.
"É importante lembrar que não é função do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) distribuir o material a ser veiculado no horário gratuito. São as emissoras de rádio e de televisão que devem se planejar para ter acesso às mídias e divulgá-las seguindo as regras estabelecidas", disse a nota.
O TSE disse ainda que não cabe é responsabilidade do órgão fazer a fiscalização ostensiva da veiculação da propaganda eleitoral gratuita. Segundo o tribunal, essa fiscalização cabe aos partidos, coligações e candidatos que, caso se sintam prejudicados, devem procurar a Justiça Eleitoral.
"Em caso de a propaganda não ser transmitida pelas emissoras, a Justiça Eleitoral, a requerimento dos partidos políticos, das coligações, das federações, das candidatas, dos candidatos ou do Ministério Público, poderá determinar a intimação da emissora para que obedeçam, imediatamente, às disposições legais vigentes e transmitam a propaganda eleitoral gratuita", disse outro trecho da nota.
O que disse o presidente do TSE, Alexandre de Moraes?
Na noite desta quarta, o presidente do TSE, Alexandre de Moraes, negou o pedido de investigação feito pela campanha de Bolsonaro, afirmando que não há indícios de que as denúncias sejam verdadeiras.
"Não restam dúvidas de que os autores — que deveriam ter realizado sua atribuição de fiscalizar as inserções de rádio e televisão de sua campanha — apontaram uma suposta fraude eleitoral às vésperas do segundo turno do pleito sem base documental crível, ausente, portanto, qualquer indício mínimo de prova", escreveu o ministro.
"Assim, o que se tem é uma petição inicial manifestamente inepta, pois nem sequer identifica dias, horários e canais de rádio em que se teria descumprindo a norma eleitoral — com a não veiculação da publicidade eleitoral", continuou Moraes, na decisão.
Além de pedir que os autores da auditoria sejam investigados por desvio de finalidade do fundo eleitoral, Moraes também determinou que caso seja investigado no âmbito do inquérito das fake news que corre no STF — ele apura a atuação de milícias digitais que agem contra a democracia.
Na segunda-feira, Moraes já tinha criticado a ação movida pela campanha de Bolsonaro. Ele disse que a defesa da coligação do presidente não apresentou documentos que pudessem fundamentar a acusação de fraude.
Segundo ele, a defesa utilizou apresentou um relatório apócrifo (sem identificação) para embasar as acusações e disse que não houve indicação precisa sobre quais as rádios, horários e dias em que as inserções teriam deixado de ser veiculadas.
O ministro tinha dado 24 horas para que a defesa de Bolsonaro apresentasse os dados alegando que apresentar acusações sem provas era um fato "grave" e que poderia ser interpretado como crime eleitoral.
"Tal fato é extremamente grave, pois a coligação requerente aponta suposta fraude eleitoral sem base documental alguma, o que, em tese, poderá caracterizar crime eleitoral dos autores, se constatada a motivação de tumultuar o pleito eleitoral em sua última semana", disse o presidente do TSE.
Como a defesa de Bolsonaro detalhou o pedido?
Na terça-feira (25/10), a defesa da coligação enviou uma nota petição ao TSE informando que, ao contrário do que Alexandre de Moraes havia dito, o relatório que embasava a ação não era apócrifo e teria sido produzido por uma empresa de auditoria de mídia chamada "Audiency Brasil Tecnologia LTDA", sediada em Santa Catarina.
A defesa também repassou um link em um serviço de computação em nuvem onde estariam armazenados os dados produzidos pela auditoria.
A campanha anexou, ainda, documentos com detalhes sobre a metodologia usada pela empresa de auditoria e pediu que o TSE suspendesse a veiculação das inserções da campanha de Lula em todo o Brasil.
O que a demissão de um funcionário do TSE tem a ver com esse caso?
Na quarta-feira, o jornal "Folha de S. Paulo" publicou uma reportagem sobre a demissão de um funcionário do TSE que teria sido exonerado por estar supostamente atrapalhando o trabalho do órgão para responder a ação movida pela campanha de Bolsonaro.
Ainda de acordo com a reportagem, o funcionário se chama Alexandre Gomes Machado e, segundo a publicação, teria procurado a Polícia Federal onde prestou depoimento informando que, desde 2018, ele teria informado o TSE sobre falhas na fiscalização da veiculação de propaganda eleitoral. Segundo o jornal, Machado disse que teria procurado a PF por temer represálias após sua exoneração.
A BBC News Brasil tentou, mas não conseguiu localizar Machado.
No início da tarde de quarta-feira, o TSE divulgou uma nota informando que a exoneração de Machado se deu pela suposta prática de "assédio moral, inclusive por motivação política" e que as alegações feitas por ele à PF seriam "falsas e criminosas".
Ainda segundo a nota, o TSE disse que a reação de Machado teria sido uma tentativa de evitar sua futura responsabilização sobre o caso.
"Ao contrário do informado em depoimento, a chefia imediata do servidor esclarece que nunca houve nenhuma informação por parte do servidor de que desde o ano 2018 tenha informado reiteradamente ao TSE de que existam falhas de fiscalização e acompanhamento na veiculação de inserções de propaganda eleitoral gratuita", disse o TSE.
- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/geral-63408154