A campanha de Jair Bolsonaro (PL) pretende usar um relatório com diversas fragilidades sobre suposta supressão de inserções do presidente em rádios do Norte e Nordeste como uma forma de estender um debate jurídico sobre a legitimidade das eleições em caso de derrota no próximo domingo (30).
Em segundo lugar nas principais pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro reforçou a ofensiva de ataques ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e insistiu na acusação de boicote de algumas emissoras de rádio na veiculação da propaganda eleitoral.
O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, rejeitou nesta quarta-feira (26) a ação apresentada pela campanha, destacou a ausência de provas e disse que ela se baseava em levantamento de empresa "não especializada em auditoria".
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"Com toda a certeza, nosso jurídico deve entrar com recurso, já que foi para o Supremo Tribunal Federal. Da nossa parte, iremos às últimas consequências, dentro das quatro linhas da Constituição, para fazer valer aquilo que as nossas auditorias constataram, que há realmente um enorme desequilíbrio no tocante às inserções. Isso obviamente interfere na quantidade de votos no final da linha", afirmou Bolsonaro.
Ele mudou sua agenda ao longo do dia e convocou ministros e os três comandantes de Forças Armadas para uma reunião no Palácio da Alvorada antes de se pronunciar. Saiu sem responder a perguntas de jornalistas.
O presidente criticou Moraes dizendo que ele "matou no peito" ao tomar a decisão contrária à ação e afirmou que uma equipe de sua campanha havia virado a noite (incluindo ele, que afirmou ter dado umas "cochiladas") para levantar os elementos pedidos pelo presidente do TSE.
À noite, Bolsonaro recebeu o chefe da missão de observação da OEA (Organização dos Estados Americanos) junto ao TSE, que também se reunirá com Lula.
A ideia da campanha do presidente é, nos próximos dias, explorar o episódio das inserções em rádios para reforçar a tese de que o presidente foi prejudicado e não enfrentou um pleito equilibrado contra o petista.
A contestação sobre a propaganda eleitoral foi apresentada pela equipe do presidente no começo da noite de segunda-feira (24), 25 horas depois da prisão do aliado Roberto Jefferson, que resistiu à prisão, jogou granadas e deu mais de 50 tiros em policiais federais, num episódio de violência que gerou desgaste na campanha de Bolsonaro.
O levantamento feito pela coligação de Bolsonaro sobre as inserções não comprova a alegação de boicote das rádios e tem fragilidades. As emissoras já começaram a contestar os dados da auditoria. Uma das rádios afirma que o PL deixou de entregar as inserções durante um período -e por isso elas não foram veiculadas.
A campanha de Bolsonaro avalia que o episódio permite que o presidente volte a se apresentar como candidato anti-sistema e perseguido pelo Judiciário.
Moraes encaminhou a decisão de rejeitar a ação da campanha à Procuradoria-Geral Eleitoral e ao corregedor-geral do TSE. "Para instauração de procedimento administrativo e apuração de responsabilidade, em eventual desvio de finalidade na utilização de recursos do fundo partidário dos autores", disse.
Em comícios em Minas Gerais nesta quarta, Bolsonaro falou em "manipulação dos resultados" com "o dedo" do PT e voltou a insinuar que poderá não aceitar o resultado do próximo domingo.
"Mais uma do TSE. Vocês estão acompanhando. As inserções do nosso partido que não foram passadas em dezenas de milhares de rádios pelo Brasil. Sou vítima, mais uma vez. Onde poderiam chegar as nossas propostas nada chegou", afirmou durante discurso em Teófilo Otoni, no interior de Minas.
A campanha de Bolsonaro ainda deve apresentar ao TSE uma Aije (Ação de Investigação Judicial Eleitoral) sobre o caso das rádios. Esse tipo de procedimento pede para a corte abrir uma apuração sobre suposto abuso de poder e tem poder de cassar a chapa adversária.
A tramitação de uma ação desse tipo, porém, é lenta. Para punir a chapa de Lula seria preciso provar que houve uma ação orquestrada da campanha petista para promover a suposta fraude nas rádios.
Ainda assim, apresentar a Aije seria a forma de a campanha de Bolsonaro manter vivo o questionamento sobre o equilíbrio das eleições mesmo depois do segundo turno.
Coordenador da campanha e filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) já afirmou que o caso deveria levar à cassação da chapa do petista.
"O roubo das inserções de rádio é batom na cueca do PT: abuso de poder econômico clássico! Registro da chapa do PT tem que ser cassado", escreveu o parlamentar nas redes sociais.
Uma medida ainda mais drástica, defendida por apoiadores mais radicais nas redes sociais, seria pedir o adiamento das eleições para que fosse possível repor o tempo perdido por Bolsonaro nas rádios.
Aliados não descartam a possibilidade de Bolsonaro embarcar nesse movimento a fim de tensionar ainda mais a relação com a Justiça Eleitoral e criar um argumento contra a corte em caso de derrota.
De qualquer forma, integrantes da campanha do presidente admitem a interlocutores que um pedido nesse sentido não teria chances de prosperar no Judiciário.
Parte do núcleo político da campanha de Bolsonaro avalia, porém, que é um equívoco apostar todas as fichas na tese do boicote. Para eles, é um erro usar o caso como a grande estratégia da reta final da eleição para reverter a derrota para Lula sofrida no primeiro turno.
Há uma avaliação de que o tema das inserções e as queixas contra o TSE passam ao eleitor o sentimento de derrota e desânimo à militância nesta reta final.
A análise é que um discurso voltado para a economia e para promessas de melhoria da vida da população mais pobre teria mais efeito do que reforçar o enfrentamento com o TSE.
O confronto com a corte vem sendo feito por Bolsonaro desde antes do período eleitoral e já envolveu também a defesa de voto impresso e questionamentos à confiabilidade das urnas eletrônicas.
Auxiliares na campanha disseram à Folha que receberam relatos de supostos problemas nas inserções nas rádios ao longo do primeiro turno. Mas foi apenas nas duas primeiras semanas do segundo que a tese bolsonarista foi estruturada.
O núcleo da campanha passou a ter uma disputa mais acirrada pela comunicação no segundo turno. Por um lado, os filhos do presidente e o publicitário Sergio Lima. De outro, integrantes da ala política e Fábio Wajngarten, ex-secretário de Comunicação da Presidência.
A empreitada das inserções, contudo, contou com o apoio de integrantes das duas alas. Ela foi tocada pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, e por Wajngarten.
Levar adiante acusações sobre o suposto boicote das rádios ainda contou com o apoio do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente.
Em outra frente, parlamentares bolsonaristas estão recolhendo assinaturas para uma CPI que busca investigar as denúncias da campanha do presidente. A liderança do PP, partido do presidente da Câmara, Arthur Lira, enviou mensagem a deputados da bancada pedindo apoio ao requerimento.