Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília – Colaboradores do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), têm trabalhado para desenhar uma estrutura jurídica na qual o Ministério da Justiça passará suas atribuições a um novo Ministério da Segurança Pública, uma das promessas de campanha do petista. Pela proposta em discussão, a nova pasta assumiria o controle da Polícia Federal (PF), da Polícia Rodoviária Federal (PRF), da Guarda Nacional e dos presídios federais. A ideia, dizem, é mostrar que o novo governo não vai enxergar o tema da segurança pública apenas sob o ângulo dos direitos humanos. Nem apostará prioritariamente no sucesso das políticas sociais como ferramenta para combate à criminalidade.
Segundo esses aliados, essa mudança – que esvazia a pasta da Justiça e turbina o novo ministério –, serve também para mudar a imagem que o PT e partidos de esquerda têm na condução dos temas de segurança pública. Ainda de acordo com os colaboradores, a intenção é aliar medidas repressivas de grandes efeitos concretos à adoção de políticas públicas que envolvam outros setores, como educação, saúde, economia e defesa.
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Os defensores dessa manutenção também dizem que um Ministério da Segurança que inclua os policiais federais, PRF, Guarda Nacional e sistema prisional tende a se tornar palco de disputas corporativas que podem minar a atuação integrada desses segmentos. Afirmam também que no modelo com dois ministérios na área jurídica pode faltar articulação e velocidade em operações que tenham que envolver órgãos como a PF e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), órgão responsável pela defesa da livre concorrência, que ficariam em pastas diferentes. Para rebater o argumento de que o novo ministério fortalecido é uma promessa de campanha, os opositores à ideia lembram que na campanha de 2002 Lula também prometeu uma pasta para a Segurança Pública, mas desistiu após intervenção de Márcio Thomaz Bastos, que assumiu a Justiça.
Pelo formato em discussão, restaria ao Ministério da Justiça, principalmente, a articulação com os poderes Judiciário e Legislativo. A pasta da Justiça já deve perder a Fundação Nacional do Índio (Funai) para o também prometido Ministério dos Povos Originários, que abarcará todos os órgãos ligados à proteção dos indígenas. O Ministério da Justiça ainda continuaria com o Cade e o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI), que faz a ponte com o Judiciário de outros países e cuida da repatriação de valores resultantes de crimes.
Lula defendeu, publicamente, a criação do novo ministério em 30 de agosto, durante reunião com governadores e especialistas em segurança pública. Consultora sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a pesquisadora Isabel Figueiredo, que participou da reunião, se diz feliz com o que chamou de sinalização do presidente eleito. Segundo a especialista, há muita mudança na dinâmica criminal do país, sendo um exemplo disso a presença da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) na Amazônia. Na opinião da pesquisadora, o desmembramento facilitaria a gestão da pasta da Justiça.
Responsável pelo debate sobre segurança pública durante a elaboração do plano de governo de Lula, o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) afirma que a criação do ministério já é um compromisso do presidente eleito. Teixeira lembra que a proposta consta dos 13 pontos apresentados por Lula em 27 de outubro, no documento chamado de Carta para o Brasil do Amanhã.
Durante a campanha, Lula prometeu a criação do Ministério da Segurança Pública com foco no combate ao tráfico de drogas e controle de armas nas fronteiras brasileiras. A promessa se contrapõe à política armamentista de Bolsonaro.
A adoção de medidas mais rígidas para combate à criminalidade foi incorporada durante a elaboração do plano de governo de Lula. O texto original continha dois parágrafos, propondo "uma segurança pública cidadã para a proteção da vida". Os representantes do PSB, partido do vice da chapa, Geraldo Alckmin, apresentaram nova redação, na qual passaram a constar os termos repressão e combate. Uma emenda incorporada também propõe a valorização do profissional de segurança.
COTADOS Atualmente, o mais cotado para assumir o Ministério da Segurança é o ex-governador do Maranhão e senador eleito Flávio Dino (PSB-MA). Embora, por ser juiz, seu perfil seja mais adequado para a Justiça, Dino é apontado como um nome forte para a nova pasta. Para a Segurança, também são lembrados nos círculos petistas o sociólogo e ex-ouvidor da Polícia de São Paulo Benedito Mariano e o antropólogo e ex-secretário Nacional de Segurança Pública Luiz Eduardo Soares. Para a Justiça, os mais citados, além de Dino, são os advogados e professores universitários Pedro Serrano e Silvio Almeida, e a senadora e advogada Simone Tebet (MDB-MS).
Aliados de Lula dizem que ele tem grande estima pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski. Por isso, o nome do magistrado é citado por petistas como uma opção para pastas ligadas à Justiça. Lewandowski, porém, já indicou a interlocutores que não pretende participar do governo. (Folhapress)