O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e seu vice, Geraldo Alckmin (PSB), prepararam um plano para começarem a governar antes mesmo da posse em 1º de janeiro.
Na primeira semana da transição, o petista e seu companheiro de chapa fizeram um périplo pelo Judiciário e pelo Legislativo. O objetivo foi pregar a institucionalidade e fazer as tratativas para abrir o espaço fiscal que pode garantir à dupla o cumprimento de promessas eleitorais no primeiro ano do governo.
Lula e Alckmin conseguiram avançar no diálogo com o STF (Supremo Tribunal Federal) e na governabilidade, mas o poder de barganha do governo eleito é limitado. Por um lado, o poder e benefícios a serem oferecidos por alianças com o Executivo atraem antigos desafetos, como o MDB --além do diálogo aberto com PSD e União Brasil.
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A ideia de Lula e Alckmin é deixar claro que o petista venceu a eleição e que há um processo de troca de governo em curso. A estratégia visa abafar as manifestações antidemocráticas que ainda ocorrem em alguns locais do país por parte de bolsonaristas que não reconhecem a derrota do atual presidente e pregam um golpe militar.
Na estratégia de preencher o espaço deixado por Bolsonaro, a dupla entrou de vez na articulação política e no diálogo direto com a cúpula dos Poderes.
Alckmin chegou a Brasília na terça-feira (8), quando procurou integrantes do Legislativo para avançar numa solução para o Orçamento.
Lula desembarcou na capital federal na noite do mesmo dia. Na quarta (9), visitou Lira e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), além de ministros do STF e do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O petista ainda reuniu parlamentares da base recém-eleitos. Deu declarações em que reforçou a linha adotada na campanha -"por que as pessoas são levadas a sofrer para garantir a tal estabilidade fiscal nesse país?"- e acabou provocando forte reação do mercado.
Enquanto Alckmin retornará a Brasília na próxima semana para tocar a transição, o presidente eleito segue para o Egito para participar da COP27, a reunião global do clima da ONU. O objetivo é ocupar outro vácuo deixado por Bolsonaro: as relações exteriores.
Por ora, o maior entrave para o petista é a construção de uma base política sólida no Congresso para conseguir aprovar, ainda neste ano, uma solução para permitir a ampliação de gastos.
Nesta semana, a equipe do governo eleito teve que adiar, dia após dia, a data para oficializar a PEC (proposta de emenda à Constituição) da Transição, que tem objetivo de abrir espaço no Orçamento para, entre outros pontos, a manutenção do valor mínimo de R$ 600 para o Auxílio Brasil (que deve voltar a se chamar Bolsa Família).
Há resistência de aliados de Lira para que essa PEC possa resolver os problemas orçamentários de Lula pelos próximos quatro anos. Isso reduziria o poder de negociação do centrão durante o novo governo do petista, avaliam líderes partidários.
O PT foi avisado da resistência ao projeto que libera bilhões de reais para Lula por todo o mandato. Mas a ordem da equipe de transição é tentar negociar esse aval pelos próximos quatro anos.
Como a fatura é alta, o governo eleito tem sido cauteloso em outras articulações, entre elas o futuro das emendas de relator e as alianças de blocos no Congresso de olho na eleição dos comandos da Câmara e do Senado.
Diante disso, Lira tem avançado nas negociações com partidos visados por Lula, como PSD e União Brasil.
Uma ala da cúpula petista já traça o cenário em que não haverá concorrência para Lira. A dúvida, nesse caso, é se o partido de Lula irá se alinhar ao grupo de Lira na disputa para conseguir cargos mais relevantes na cúpula da Câmara.
Lula mudou o tom contra Lira logo que foi proclamado o resultado da corrida presidencial.
Na campanha, o candidato Lula disse que Lira agia como "imperador do Japão" em razão da operação das emendas de relator, usadas como moeda de troca em negociações políticas entre o governo Bolsonaro e o Congresso.
Lula, como presidente, deu uma guinada no discurso.
Em sua primeira agenda em Brasília após a vitória eleitoral, ele defendeu diálogo com o centrão e prometeu não interferir nos processos de escolha dos novos presidentes da Câmara e do Senado.
Um percalço de Lula na semana foi a reação do mercado ao discurso dele sobre o controle dos gastos públicos.
De um modo geral, pessoas do entorno do presidente consideram que ele apenas repetiu o tom usado durante a campanha. Por isso, houve espanto com a resposta de agentes financeiros.
Mas há a avaliação de que Lula agora é presidente eleito, e não mais candidato. Daí a necessidade de calibrar as declarações sensíveis sobre economia.
Em outra agenda em Brasília, Lula foi ao STF, onde se reuniu com 10 dos 11 ministros. O único ausente foi Luís Roberto Barroso, que participa da COP27 no Egito.
Além desse encontro, o petista escalou quatro aliados para liderarem a interlocução com o Supremo. São eles: o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), o senador eleito e ex-governador do Maranhão Flávio Dino (PSB), o procurador da Fazenda Nacional Jorge Rodrigo Araújo Messias, e o deputado Paulo Teixeira (PT-SP).
A ideia é conversar com cada um dos 11 ministros, inclusive com os indicados por Bolsonaro -Kassio Nunes Marques e André Mendonça.
Até agora, já houve encontro do grupo com Barroso, Luiz Fux e Alexandre de Moraes.
"Queremos passar a mensagem de que o novo governo quer estabelecer um clima de pacificação. Houve uma desarrumação do arranjo institucional promovida pelo Bolsonaro, com processo continuado de conflitos", afirmou Randolfe.
O objetivo, segundo aliados de Lula, é deixar o caminho aberto para solucionar questões de interesse do Executivo por meio de acordos e conciliações. Há, por exemplo, ações relacionadas ao meio ambiente e à economia, como a disputa em torno da compensação da redução do ICMS aos estados.