O ex-governador do Rio Sergio Cabral vai cumprir prisão domiciliar em um apartamento da família em Copacabana, na Zona Sul do Rio de Janeiro. A expectativa, porém, é de que ele só deixe o presídio a partir de amanhã. Preso preventivamente há seis anos em razão das investigações da Operação Lava-Jato, Cabral será solto por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que considerou em votação na sexta-feira haver excesso de prazo na prisão preventiva do ex-governador.
Responsável pela defesa do ex-governador, o advogado Daniel Bialski, diz, porém, que trâmites burocráticos devem retardar a soltura do seu cliente. O STF precisa emitir ofício para a Justiça do Paraná, que depois pedirá a liberação à Justiça do Rio. Bialski disse que Cabral ficará no apartamento da família, em Copacabana, como determina a prisão domiciliar – que só permite saídas para tratamento médico, mas mesmo assim com autorização da Justiça.
Ele afirmou que não há restrições sobre visitas ou contatos telefônicos, mas que vai recomendar ao ex-governador que não interaja com outros investigados da Operação Lava-Jato, para evitar reversão da prisão domiciliar. “O que ele mais quer é permanecer em casa, longe do constrangimento de ter que ficar no presídio, e matar a saudade da família. Isso é o mais importante”, afirmou.
Os magistrados do STF decidiram derrubar mandado de prisão expedido pelo ex-juiz Sergio Moro em novembro de 2016, quando Cabral foi preso na Operação Calicute. Este era o último ainda em vigor dos cinco que já pesaram contra o ex-governador ao longo desses seis anos. “Em um Estado democrático de direito, nenhum cidadão brasileiro, por mais graves que sejam as acusações que pesam em seu desfavor, pode permanecer indefinidamente submetido a medidas processuais penais extremas, como a prisão cautelar”, escreveu em seu voto o ministro Gilmar Mendes.
Nesses seis anos de prisão, Cabral chegou a acumular cinco mandados de prisão, 37 ações penais (sendo duas sem relação com a Lava-Jato) e 24 condenações a penas que, somadas, ultrapassaram 400 anos de prisão.
Pela lei, uma pessoa só pode ficar até 30 anos presa, mas o somatório das penas impacta no cálculo para mudança de regime fechado para semiaberto ou aberto durante o cumprimento das sentenças.
Sentença
A Segunda Turma do STF decidiu revogar o último mandado de prisão em vigor contra o ex-governador do Rio de Janeiro. Por 3 votos a 2, os ministros consideraram haver excesso de prazo na prisão preventiva de Cabral, levando à soltura do único acusado ainda em regime fechado em decorrência das apurações da Lava-Jato. O voto de desempate foi proferido na sexta-feira pelo ministro Gilmar Mendes. Cabral terá agora que permanecer em prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica em razão de decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) tomada em dezembro de 2021.
Gilmar Mendes acompanhou os votos dos ministros Ricardo Lewandowski e André Mendonça. Mendonça havia apresentado seu voto na madrugada de sexta-feira, após pedir vista no julgamento, iniciado em outubro. Para ele, o ex-governador não tem mais a mesma influência política do período em que foi preso. O ministro descreveu a manutenção da medida cautelar como um ilegal “cumprimento antecipado de pena”. “O que há, a essa altura, é a presunção de que o agravante seguirá a cometer crimes, o que não é admitido pela jurisprudência desta corte como fundamento para a decretação da custódia cautelar”, acrescentou Mendonça. O relator do processo, ministro Edson Fachin, já havia votado em junho pela manutenção da medida cautelar. Ele afirmou considerar que Cabral ainda tem influência política, apontando como indício supostas regalias obtidas pelo ex-governador na prisão. “O exercício de papel de liderança em organização criminosa que teria funcionado durante anos, a concreta capacidade de influência nos poderes públicos, que embora diminuída pelo tempo de segregação ainda persiste. (...) Essa conclusão é corroborada, ainda, por recentes episódios envolvendo supostas ilegalidades e benefícios indevidos que o agravante estaria recebendo no estabelecimento prisional em que se encontrava custodiado.”
O magistrado citou ainda a possibilidade de Cabral manter dinheiro de propina escondido. “Considerando a expressiva quantidade de valores que ainda não foi recuperada, o risco de cometimento de possíveis atos de lavagem de dinheiro é concreto e justifica a atualidade da prisão preventiva”, afirma Fachin.
Decisão de Moro
O mandado de prisão revogado foi expedido pelo ex-juiz Sergio Moro no âmbito da investigação sobre suposto pagamento de R$ 2,7 milhões de propina por executivos da Andrade Gutierrez ao ex-governador pelas obras do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj). Cabral foi condenado a 14 anos e 2 meses de prisão no caso. Em outro processo movido por Cabral também julgado nesta sessão virtual, os ministros da Segunda Turma decidiram considerar válidos os atos de Moro no processo, negando o pedido de declaração de incompetência da Justiça Federal de Curitiba para atuar no caso.
Neste habeas corpus, Mendonça acompanhou o entendimento de Fachin para negar o pedido. O ministro escreveu em seu voto que “os contornos fáticos indicam que, no contexto das obras de responsabilidade do consórcio Comperj, de fato a Petrobras suportou financeiramente o pagamento da propina relacionada ao contrato vinculado à Diretoria de Abastecimento da companhia”. Em junho, Fachin já havia votado pela competência da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba. Para ele, o caso se refere a “condutas voltadas diretamente ao dilapidamento do patrimônio da Petrobras”, tema sob responsabilidade daquele tribunal.